quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Ainda sobre as novas regras do mandado de segurança

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 21.09.09 - E2

Complicações para o mandado de segurança

Mateus Aimoré Carreteiro
21/09/2009

Está em vigor a nova lei para o mandado de segurança, nas modalidades individual e coletivo, a Lei nº 12.016, de 2009. Esta lei, sancionada pelo presidente da República, faz parte do II Pacto Republicano de Estado, por meio do qual os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário tentam promover reformas processuais para atualização de normas legais.
Uma das principais inovações da lei é disciplinar o mandado de segurança coletivo, que está previsto na Constituição Federal, mas até o momento não era disciplinado por legislação ordinária. Essa previsão é benéfica por incorporar à lei a prática dos tribunais sobre a matéria.
No que diz respeito à lista de legitimados, a nova lei manteve o que já era estabelecido pela Constituição Federal, esclarecendo, todavia, que os partidos políticos somente podem ingressar com a ação para defesa de interesses relacionados à sua finalidade partidária ou defesa do interesses de seus integrantes. Essa previsão pacifica o entendimento que partido político não pode impetrar mandado de segurança para defesa de quaisquer interesses coletivos ou difusos ligados à sociedade. Neste caso, a intenção do legislador foi a de evitar que partidos políticos utilizem desse importante instituto de forma diversa de sua finalidade, preservando-se a correta utilização do mandado de segurança coletivo.
Outra inovação da nova lei é a possibilidade de impetração de mandado de segurança por meio eletrônico ou fax. Embora a possibilidade de impetração por fax já existisse em razão de lei especial (Lei nº 8.900, de 1990), não há dúvida de que essas medidas contribuem para agilizar o ingresso do mandado de segurança. Como consequência, a análise do magistrado sobre o caso também poderá ser feita de forma mais ágil, o que beneficia a sociedade.
A lei também foi alterada para prever o cabimento de recurso (agravo de instrumento) contra a decisão que defere ou indefere liminar em mandado de segurança. Muito embora o recurso fosse aceito em diversos tribunais do país, inclusive no Superior Tribunal de Justiça (STJ), não era incomum sua rejeição com fundamento na ausência de previsão legal autorizando tal recurso. A grande vantagem dessa previsão é a pacificação do entendimento majoritário sobre o assunto, evitando possíveis surpresas aos advogados e seus clientes.
Em outros aspectos, porém, o legislador foi conservador e, até mesmo, retrocedeu na regulamentação do instituto. É o caso, por exemplo, da concessão de liminar, que agora pode depender de prestação de caução pelo impetrante. Se a prestação de caução virar regra, apenas aqueles com capacidade financeira poderão ser beneficiados pelo instituto. Ou seja, caso haja um rigor excessivo na aplicação dessa nova norma, a existência do mandado de segurança poderá ser inútil à grande massa de cidadãos do país.
Da mesma forma, a nova lei cria proibição à concessão de liminares (e execução provisória) para, por exemplo, compensar créditos tributários, liberar mercadorias e bens provenientes do exterior, assim como para determinar pagamentos a servidores públicos. Ao proibir a concessão dessas medidas de urgência, o legislador afasta o princípio básico de controle pelo Judiciário dos atos da administração pública, ferindo a própria essência do mandado de segurança. Na realidade, ao assim proceder, o legislador está tentando substituir o discernimento do magistrado quando da análise do caso concreto e, dessa forma, afastando a eficácia do instituto. Essa alteração, obviamente, é indesejável e não pode ser aceita, sob pena de afronta à própria Constituição Federal. A Ordem dos Advogados do Brasil, inclusive, e em atitude louvável, já ingressou com ação direta de inconsitucionalidade (Adin) perante o Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de discutir a constitucionalidade desta nova previsão.
Outra alteração que poderá colocar o indivíduo em situação difícil é o dispositivo que determina a necessidade de desistência do mandado de segurança individual para que ele possa se beneficiar do resultado do mandado de segurança coletivo. Isso porque o indivíduo pode optar pela desistência de seu mandado de segurança individual e o coletivo ser julgado improcedente. Como existe prazo decadencial de 120 dias para o ingresso do mandado de segurança, a probabilidade de, em tais casos, já ter transcorrido o prazo para o indivíduo impetrar um segundo mandado de segurança individual é enorme. Assim, o indivíduo será colocado em verdadeira emboscada, o que não pode ser admitido.
Além do mais, o legislador manteve normas que há muito são alvos de críticas. Exemplo disso é a manutenção da chamada suspensão de segurança - medida de revisão de decisão judicial de primeira instância - e da denominada remessa necessária - medida para suspender a eficácia da sentença de procedência da ação até análise posterior pelo órgão de segunda instância. Isso porque essas medidas, cabíveis apenas em favor do poder público, além de ferir a igualdade de tratamento, representam limitação ilegítima à eficácia que o sistema constitucional e processual empresta à liminar e à sentença do mandado de segurança. O legislador, portanto, vai de encontro ao movimento atual de atribuição de maior eficácia às leis processuais, mantendo roupagem velha ao instituto.
Se o objetivo do II Pacto Republicano era propiciar um sistema de Justiça mais ágil e efetivo, ao menos em uma primeira análise, parece que tal pretensão não será alcançada com a nova lei. Caberá agora aos tribunais consertar essas limitações de eficácia ao mandado de segurança e fazer com que ele continue a ser importante mecanismo para a defesa dos interesses da sociedade contra atos do poder público.
Mateus Aimoré Carreteiro é advogado das áreas de contencioso cível e arbitragem do Veirano Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

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