Valor Econômico – Especial Ética Concorrencial - 8/11/2015 –
H2
Funcionários também são prejudicados com acertos "por
fora"
Por Adriana Carvalho
Quem sonega impostos, não o faz
sozinho. Da mesma forma, os efeitos da sonegação não são sentidos apenas pelo
órgão arrecadador. A atitude do devedor contumaz tem a característica de unir,
no delito e no prejuízo, diversos atores. Embora seja difícil mensurar
financeiramente o tamanho do problema, é fácil entender quais são os seus
impactos diretos. O sonegador cria uma vantagem competitiva artificial: pode
cobrar mais barato por produtos e serviços, prejudicando outras empresas do
mesmo segmento que não conseguem fazer o mesmo por cumprir devidamente seus
deveres fiscais. Também saem lesados os funcionários, quando a sonegação inclui
arranjos para pagar salários "por fora" das regras da legislação
trabalhista. Fornecedores e parceiros comerciais não escapam, conforme afirma
Enéas Moreira, sócio de auditoria da EY. "O dinheiro que não é tributado
não pode ser utilizado para pagar custos formais. Ou seja, a empresa vai ter
que pressionar alguém para gerar um canal para poder usar esse dinheiro que
entra de forma ilegal." Uma das formas de fazer isso é, por exemplo,
convencendo um fornecedor a burlar valores na hora de emitir notas fiscais.
Além disso, há claro, o custo social. O consumidor que paga menos pelo produto
sem nota fiscal e o empresário que lucra com isso entram junto nessa conta como
perdedores: "O tributo sonegado deixará de ser investido na saúde,
educação e outros setores, impactando nas dificuldades e problemas estruturais
ligados aos serviços públicos", diz o advogado Alexandre Macedo Soares,
conselheiro do Tribunal Administrativo Tributário de Santa Catarina. Para João
Eloi Olenike, presidente Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação
(IBPT), nos últimos anos os órgãos arrecadadores evoluíram com relação aos
mecanismos de controle da evasão. Porém, ainda não conseguiram fechar bem a
torneira do vazamento fiscal. "Há oito anos fizemos um estudo que apontou
que a cada real, 30 centavos eram sonegados. Não fizemos uma atualização desse
estudo, mas creio que se ele fosse feito hoje iria mostrar um valor de 20
centavos por real", afirma Olenike. A substituição das notas fiscais
físicas por versões eletrônicas e a criação em 2007 do Sistema Público de
Escrituração Digital (Sped), que obriga empresas a gerar arquivos digitais para
prestar informações sobre documentos fiscais relativos a ICMS e IPI, são alguns
dos avanços recentes. Outro instrumento que vem sendo utilizado mais amplamente
pelos Estados é o regime de Substituição Tributária do ICMS, que visa diminuir
a sonegação em cadeias intermediárias como atacadistas e varejistas. O
industrial recolhe seu imposto e também o tributo que devido pelos
comerciantes. Para compensar, embute o custo nos preços. "Estamos intensificando
a substituição tributária no Distrito Federal. Assim, ao invés de ter que
fiscalizar, por exemplo, centenas de bares, concentramos esforços nas
indústrias", afirma o secretário de Fazenda Pedro Meneguetti,
acrescentando que o órgão acaba de lançar também o sistema Mineração de Dados.
Ele pretende cruzar os dados de notas fiscais eletrônicas e de cartões de
crédito para identificar casos de evasão com mais facilidade. Mas, ao mesmo
tempo em que as formas de controle se aperfeiçoam, surgem outras modalidades de
fraude. "A substituição tributária é muito boa, mas o Fisco gostou tanto
disso que ampliou demais o mix de produtos incluídos, atingindo também os
produzidos por pequenas indústrias", diz Edinilson Apolinário, diretor
executivo tributário da Associação Nacional dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade (Anefac).