segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Mestres concluem doutorado e são dispensados das universidades

Valor Econômico - Eu & Carreira - 19, 20 e 21.09.08 - D10

Mestres viram doutores e acabam demitidos em universidades privadas
Por Jorge Félix, para o Valor,
de São Paulo

A falta de mão-de-obra qualificada é uma das maiores ameaças ao crescimento econômico, segundo alguns economistas, empresas ou mesmo o governo. O país forma mais de 10 mil doutores por ano. No entanto, esta elite do meio acadêmico brasileiro, cada vez mais, encontra dificuldades para arranjar emprego, sobretudo nas universidades, responsáveis pela preparação de profissionais de ponta, supostamente, tão exigidos pelo mercado de trabalho. O problema ocorre, de acordo com o Sindicato dos Docentes de Instituições de Ensino Superior (Andes), na rede privada, onde as demissões de professores com doutorado ou livre-docência, nos últimos cinco anos, são observadas com freqüência, logo após a obtenção do título acadêmico.
Ruy Baron / Valor
Ronaldo Motta, secretário de Ensino Superior do MEC, diz que o governo ampliará a fiscalização para evitar as demissões
"Quando fui fazer a homologação da rescisão de meu contrato de trabalho no sindicato, tive uma surpresa: encontrei quatro outros professores de direito", relata José Cretella Neto, ex-docente da Universidade Paulista (Unip), a maior do país em número de alunos, demitido em 2004, meses depois de receber a livre-docência. "Dois desses colegas tinham obtido o doutorado na USP, como eu. Um outro, na Universidade Complutense de Madri, Espanha. Finalmente, o último, na Universidade de Nagoya, no Japão. Perguntei o porquê de estarmos sendo dispensados e todos me deram a mesma informação: redução de custos", conta.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, as universidades devem ter um terço do corpo docente formado por mestres ou doutores. Em geral, esses professores titulados recebem um percentual a mais por hora/aula. "Como a lei exige de forma vaga, as universidades privadas preferem ter um terço de mestres e nenhum doutor. Preferem também especialistas com cursos lato sensu", afirma Cretella. O professor, no entanto, faz questão de sublinhar que as universidades cumprem a lei, mas defende que a lei precisa mudar porque "a economia de custos das universidades para fazer frente à concorrência" está comprometendo a qualidade do ensino superior.
"Não é a realidade", afirma Hermes Ferreira Figueiredo, presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Estado de São Paulo (Semesp) e proprietário da Universidade Cruzeiro do Sul. "Casos isolados podem dar a impressão de que há um movimento de demissão, mas isso não é uma rotina no setor", garante. Segundo ele, o país está formando mais doutores, as universidades privadas estão empregando mais titulados, porém, a demanda continua inferior à oferta desta mão-de-obra. "O número de doutores depende do programa pedagógico de cada instituição, a universidade é como qualquer empresa, há uma avaliação de desempenho, não publicou durante o ano, será dispensado", diz Figueiredo.
O presidente do Andes, Ciro Teixeira Correia, discorda: "A situação é séria e se dá pelo descontrole do governo sobre o setor privado, muitos professores estão escondendo o título de doutorado". De acordo com ele, a solução passa por adaptar o sistema privado às regras das universidades públicas, onde há o regime de dedicação exclusiva. "Isso faz toda a diferença na qualidade do ensino. O professor-horista não tem vínculo com a universidade, esta falta de comprometimento reduz a produção de pesquisa e sem ela o conhecimento não avança e o ensino fica pior", acredita.
Figueiredo rebate: "Uma universidade numa cidadezinha de Tiririca da Serra não tem condição de contratar um doutor por tempo integral para pesquisar e em nenhum lugar está escrito ou provado que um doutor é melhor professor do que um profissional com experiência". Segundo Figueiredo, o mercado de trabalho para doutores é "quase exclusivo" em universidades e, diante do aumento do número de titulados, está ocorrendo uma "pressão das corporações" pelo crescimento de vagas. Para ele, as demissões podem ocorrer por supressão de cursos, por exemplo.
Somente uma pesquisa detalhada poderia comprovar os motivos reais. Apesar de afirmar que as demissões têm pouca relação com os custos, Figueiredo reconhece que a exigência por mais professores titulados aumenta as despesas: "É fácil falar em ensino mais caro por uma mensalidade menor, mas esta equação não fecha". Se o motivo das demissões é de difícil aferição, as conseqüências já foram medidas. No Índice Geral de Cursos, avaliação das instituições divulgada pelo Ministério da Educação no início do mês, apenas 4,9% das universidades privadas receberam notas máximas (4 ou 5), sendo que as maiores do país ficaram entre as 40 piores na lista de 173 avaliadas.
O Valor consultou o site de várias universidades privadas e constatou que poucas atendem à portaria 2.864/2005, que obriga a divulgação nominal do corpo docente de cada curso, indicando a área de conhecimento, titulação, qualificação profissional e regime de trabalho (inciso IV). A maioria dos sites está preocupada em convencer o potencial aluno de que as instituições oferecem qualificação profissional, ampliando as chances no mercado de trabalho e nenhuma delas informa o número de alunos por turma que, em muitos casos, passa de 100, obrigando o professor a dar aula com microfone como em cursinhos pré-vestibular.
"Isto tudo decorre da falta de fiscalização por parte do governo", acusa Correia. É justamente essa promessa que faz o Ministério da Educação em resposta a onda de demissões de doutores: ampliar o cerco às instituições privadas. O secretário de Ensino Superior do MEC, Ronaldo Motta, reconhece que o problema "é sério", mas acredita que será evitável à medida que os processos de regulação e supervisão tornem-se mais rigorosos, segundo ele, como tem sido a prática recente. No caso, o próprio IGC. O índice contempla entre suas variáveis o corpo docente, quanto à titulação ("valorizando sobremaneira os doutores") e o regime de trabalho (identificando negativamente a presença excessiva de horistas).
Como agora a divulgação será anual, Motta garante que a tendência será de queda na avaliação das instituições com baixo número de doutores. "Quem agir assim, demitindo seus doutores, será certamente identificado na avaliação institucional e será penalizado com a assinatura de um protocolo de compromisso, tal como expresso na Lei dos Sinaes", diz, referindo-se ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, criado em 2004. Motta, porém, ressalta que não há uma regra universal que aponte que todos os professores devam ter dedicação exclusiva.
No Senado Federal, um projeto-de-lei (PL) começou a tramitar, há um ano, para obrigar as universidades privadas a estabelecer um corpo docente formado de, pelo menos, 25% de doutores, 50% de mestres (ou doutores) e 40% de professores em regime de trabalho em tempo integral. A agilidade na tramitação e a aprovação do PL dependem, no entanto, da vontade do governo de defender a idéia, pois a relatoria estava com um senador do PT, Siba Machado, suplente da ex-ministra Marina Silva, que retornou ao cargo.
"A educação superior no Brasil tem dado passos gigantescos nos últimos anos. Mas são passos capengas", diz Arthur Virgilio Neto (PSDB-AM), autor do PL. "O número de cursos e alunos aumenta, mas a qualidade cai. Por que isso ocorre? Pela massificação desacompanhada de rigor na composição do corpo docente, o que repercute na tímida atuação das universidades brasileiras no campo das pesquisas. É isso que pretendo corrigir", justifica o senador. A idéia, porém, foi recebida com protestos pelas universidades.
Até mesmo instituições que contratam um grande número de professores titulados, como as PUCs, reagiram à criação desta obrigatoriedade legal. Segundo o Andes, a concorrência no setor tem empurrado as universidades tradicionais a adaptarem-se às regras de mercado. "A aprovação desta lei seria descabida. Não é o Legislativo que deve dizer quantos doutores tem que ter uma universidade, que não é uma concessão pública, como os meios de comunicação, que não são obrigados a contratar só doutores em jornalismo", compara Figueiredo.

Prêmio de alienação de controle desaparece do mercado

Valor Econômico - Eu & Investimentos - 19, 20 e 21.09.08 - D3

Prêmio de controle sai de cena nas operações do Novo Mercado
Por Graziella Valenti e Murillo Camarotto*,

As últimas transações de fusões e aquisições, ocorridas entre empresas do Novo Mercado da Bovespa, devem corrigir uma expectativa sobre companhias apenas com ações ordinárias (ON, com direito a voto). Nos recentes negócios, os valores envolvidos estavam muito próximos ou abaixo do preço de mercado das companhias. Mas tal fato, que gerou visível frustração dos investidores, era justamente o que deveria acontecer: redução do prêmio de controle, uma vez que ele deve ser dividido entre todos.
Silvia Costanti / Valor
Marcos Pinto, da CVM: incorporações com troca de controle são negócios diferentes dos que estamos acostumados
O debate sobre o pagamento do prêmio de controle voltou a se intensificar no Brasil sete anos após a reforma da Lei das Sociedades por Ações e a criação do Novo Mercado. No passado, o minoritário brasileiro, detentor basicamente de ações preferenciais (PN, sem voto), era mero espectador das trocas de controle com grandes prêmios aos donos de empresas, pois não participava dos ganhos. Após as revisão da lei, em 2001, e a criação do segmento especial da Bovespa, passou a ter garantia de alinhamento de seus interesses aos do controlador, porém está assistindo aos prêmios encolherem ou até mesmo deixarem de existir.
De 2003 até hoje, foram realizadas 45 ofertas aos minoritários em função da venda do controle de empresas abertas, para cumprimento da regra inserida pela reforma da Lei das S.A. de 2001, que trouxe a obrigatoriedade de estender aos minoritários de ordinárias 80% do prêmio de controle - o "tag along". Essas operações, algumas combinadas de oferta para fechamento de capital da empresa, movimentaram R$ 18 bilhões. Os números consideram a base disponível da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que não oferece informações sobre 2001 e 2002.
Entretanto, apesar do volume total ser expressivo, a maioria das ofertas girou soma irrelevante. Com poucas ordinárias em circulação no mercado, o benefício do prêmio acabava se concentrando nos donos do negócio. Dessas operações, apenas 12 levaram mais do que R$ 100 milhões ao bolso dos minoritários e duas gigantes, Arcelor Brasil e AmBev, responderam sozinhas por 78% do total (R$ 14 bilhões). Outra 13 ofertas não chegaram a girar nem R$ 1 milhão.
O debate sobre prêmio de controle começou a surgir na compra da Datasul pela Totvs, que embutia um prêmio de 18% - bem menor que os mais de 300% pagos aos donos do Grupo Ipiranga, adquirido por Petrobras, Braskem e Ultrapar. A discussão esquentou ainda mais com dois movimentos no setor de construção civil, em que as dificuldades das empresas e do segmento acabaram com o ágio das operações. Tenda foi absorvida pela Gafisa com um desconto implícito 53,3% inferior à cotação de mercado. Já a Company embutia um deságio da ordem de 10% quando adquirida pela Brascan.
Mas o que o investidor pouco se deu conta é que o encolhimento dos prêmios nas transações se deve, justamente, aos avanços das regras, principalmente no caso do Novo Mercado, em que só existem ações ordinárias com 100% de "tag along". Como todos têm o mesmo direito, o valor das operações precisa ser dividido entre os acionistas ao invés de ficar apenas com o controlador. Além disso, nos casos de deságio é preciso considerar se houve deterioração do negócio.
Até essas recentes transações, predominava no mercado a sensação de que o "tag along" era garantia de ganho, quando na realidade é o direito de permanecer alinhado ao controlador. No caso de Tenda, por exemplo, foi submetido ao minoritário o mesmo elevado deságio que o sócio majoritário recebeu.
Para Leonardo Barém Leite, sócio do escritório Demarest & Almeida Advogados, especializado em direito societário e em fusões e aquisições, as discussões sobre prêmio são muito exacerbadas no Brasil, em função da forte presença do controlador.
No futuro, com o aumento das companhias de capital pulverizado, ou seja, sem a figura do controlador, esse debate diminuirá. Leite explicou que, nesse cenário, as decisões serão tomadas pela administração e pela assembléia de acionistas. Aí, acabarão as brigas.
Mas o que colocou mais lenha na fogueira do debate de controle, nas operações recentes é que, diferentemente do costume, o controle mudou de mãos por meio de operações de incorporação, sem pagamento em dinheiro ou apenas parte da transação. Os modelos geraram polêmica, especialmente entre os investidores.
No caso de Tenda e de Company, as escolhas feitas pelos controladores, por usarem a incorporação como modelo, são compulsórias aos demais investidores, que não têm opção. Incorporação é a nova moda do mercado brasileiro para troca de controle. Era uma ferramenta já bastante utilizada em operações com preferencialistas e alvo de enormes discussões. Agora, o uso foi estendido também para aquisições. Ainda que polêmicas, essas operações preservaram o alinhamento de direitos entre todos os acionistas - majoritários e minoritários.
"Na incorporação, o controlador migra para outra empresa junto com todo mundo, nas mesmas condições dos outros acionistas", explicou Marcos Pinto, diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), sem se referir a nenhuma transação específica. "São operações muito diferentes das que estamos acostumados a ver. Há uma presunção muito forte de que o controlador, que conhece o negócio, considera boa a opção. Pressupõe, mas não assegura", completou, lembrando que os administradores têm o dever de lealdade à companhia e aos sócios.
De forma geral, os modelos das transações estão mais sofisticados e complexos, acompanhando o desenvolvimento do próprio mercado brasileiro. A tendência é que, cada vez mais, as operações envolvam reestruturações societárias e ações como moeda de troca, no lugar de pagamento em dinheiro.
Esses novos formatos propiciam a redução do prêmio imediato, com argumento de que o pagamento em ações permite que o investidor se beneficie futuramente da geração de valor e das sinergias do negócio. Nos mercados internacionais desenvolvidos, as compras com ações são bastante comuns, especialmente quando envolvem companhias de grande porte.
Na ocasião da compra da Tenda, o controlador da empresa, Henrique Alves Pinto, enfatizou que o acerto da decisão ficaria evidente para os minoritários "no futuro", com os resultados da nova empresa. Também na operação de Company, a intenção foi privilegiar o investidor de longo prazo, para que mantivesse os papéis da Brascan recebidos no negócio e se aproveitassem de uma esperada valorização futura.
Essa combinação de fatores - diluição do prêmio entre todos os acionistas, sofisticação do mercado e uso de pagamento em ações - aponta que os prêmios elevados só existirão em casos de ofertas hostis. Nessas operações, o interessado lança uma proposta sem negociar com a administração ou os sócios da empresa alvo, seduzindo os investidores justamente pelo prêmio que ela representa. Esse modelo ainda não foi usado no Brasil, com exceção da fracassada tentativa da Sadia de ficar com a Perdigão, em 2006. Ele está fortemente relacionado à existência de companhias sem controlador definido.
Tobias Stirnberg, do escritório de origem americana Shearman & Sterling LLP, afirmou que o prêmio só é tema determinante de uma aquisição quando é nesse formato hostil. "Aí, aplica-se um prêmio entre 10% e 30% e é o mercado quem decide. Não tem controlador", disse. Ainda assim, os prêmios são mais comedidos do que o histórico brasileiro, justamente porque é uma oferta para todos. Na investida da InBev pela Anheuser- Busch, o primeiro preço oferecido era 11% superior ao valor de mercado.
A figura da incorporação, porém, não é tão comum como tem se mostrado no mercado brasileiro, na opinião de Stirnberg. Ele considera estranhas, por exemplo, as operações em que o controlador decide o que fazer com a empresa de forma compulsória também para os demais acionistas. É daí que vem a sensação de estranheza dos estrangeiros com as operações locais.
Nos casos em que houve maior polêmica sobre o valor dos negócios - Tenda e Company - , o modelo adotado dá esse poder ao acionista controlador. Além de vender a empresa, ele decide o que será feito com o investidor. As incorporações são movimentos societários que dependem apenas de aprovação do acionista, mediante assembléia. Elas não precisam de aval da CVM. Assim, a existência de um controlador permite que ele, com 51% das ações, decida por todos. No caso de Totvs e Datasul, embora o modelo fosse semelhante, a ausência de um sócio com esse poder, tornou necessária a aprovação do mercado para a transação, deixando a decisão para o investidor, o que minimiza a polêmica.

CVM desiste de estudo para comparar regras de países
De São Paulo

Em meio ao debate mais profundo acerca dos desdobramentos das operações de troca de controle, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) optou por enterrar um estudo que visava comparar as regulamentações de vários países sobre o tema. A idéia da pesquisa nasceu em 2005.
O objetivo era analisar o que dizem leis e normas mundo afora a respeito de operações societárias que acarretem mudanças significativas, compulsórias ou voluntárias, nas posições dos acionistas não-controladores, situação que vem gerando polêmica no mercado brasileiro. Também estava prevista a comparação das legislações sobre transações de incorporações de empresas do mesmo grupo.
No entanto, a contratação do estudo, que seria financiado com recursos do Banco Mundial (Bird), foi considerada desnecessária pela CVM no final de 2007, antes da etapa de abertura dos envelopes, quando seriam apresentadas as propostas técnicas e financeiras das instituições interessadas em realizar o levantamento.
Ao Valor, a autarquia informou que a paralisação do processo de licitação resultou do próprio desenvolvimento do arcabouço regulatório brasileiro. "Após análise acerca da conveniência e oportunidade no prosseguimento do certame, a CVM tomou a decisão de não prosseguir com o estudo, pois diversos aspectos da legislação societária que seriam abordados nos estudos já haviam sido contemplados em inúmeros julgamentos pelo colegiado", justificou o regulador, sem especificar alguns desses julgamentos.
Essa decisão, porém, não significa que as polêmicas estão encerradas. Ao contrário, vem se consolidando, ano após ano, que a autarquia avaliará os casos separadamente, conforme eles aconteçam. Tampouco a opção por não fazer o estudo indica que a CVM está plenamente satisfeita com a legislação atual.
A Lei das S.A. abre brechas ao condicionar que seja feita oferta aos minoritários somente em casos de alienação de controle. Se alguém tornou-se sócio majoritário sem que outro tenha vendido uma posição de controle, pode não haver necessidade de "tag along", mesmo quando há elevado prêmio embutido na transação.
Caso em discussão nesse sentido, por exemplo, é a aquisição do controle da Aracruz pela Votorantim Celulose e Papel (VCP), pela compra de uma fatia de 28% das ações ordinárias detida por um dos sócios controladores. A proposta do grupo de Antônio Ermírio de Moraes para levar o controle embutia um prêmio de 37% frente à cotação em bolsa.
Recentemente, em debate realizado em São Paulo com cinco presidentes da CVM, a atual xerife Maria Helena Santana, propôs essa discussão aos antecessores. Esse tema, inclusive, foi abordado por ela em sua primeira aparição pública após assumir o comando do regulador, em julho do ano passado.
Luiz Leonardo Cantidiano, sócio do escritório Motta, Fernandes Advogados, chamou atenção para o modelo europeu. Na Europa, aquele que adquirir fatia de 30% de uma companhia aberta fica obrigado a fazer oferta para todos os demais acionistas.
Mas ele assinalou que não há um modelo que resolva todas as polêmicas. A Europa enfrenta o desafio de lidar com aquisições de fatias de até 29%, para que o comprador se exima de comprar os papéis de todos os acionistas. Exemplo recente é a investida do Deutsche Bank sobre o Postbank, numa operação de ? 2,8 bilhões de euros. O banco passou incólume da obrigatoriedade de oferta pois adquiriu 29,75% dos papéis. (MC e GV)

Sociedade estrangeira como sócia de limitada

Valor Econômico – Legislação e Tributos – 22.09.08 – E2

As sociedades estrangeiras e as limitadas
Armando Luiz Rovai

Não obstante os trabalhos que vêm sendo escritos a respeito do Código Civil de 2002 e seu impacto no mundo empresarial, uma questão ainda não ficou bem evidenciada, qual seja: a temática sobre a participação das sociedades estrangeiras no Brasil.

Desta feita, é oportuna uma análise sobre o tema, principalmente no que abarca sobre a responsabilidade social. Via de regra, a adoção de sociedades estrangeiras no quadro societário de sociedades nacionais possui uma dupla finalidade; i) viabilizar a realidade econômica do Brasil, num mundo globalizado onde as fronteiras são cada vez mais infinitas e, ii) dentro de uma sistemática que é adotada por muitos, para proteção patrimonial - sempre -, dentro de um cenário legal e regular.

Ocorre, contudo, que o artigo 1.134 do Código Civil é enfático ao dispor que a sociedade estrangeira, qualquer que seja o seu objeto, não pode, sem autorização do Poder Executivo, funcionar no país, ainda que por estabelecimentos subordinados, podendo; ressalvados os casos expressos em lei, ser acionista de sociedade anônima brasileira.

A redação desse artigo nos possibilita compreender que as sociedades estrangeiras somente podem participar de empresas nacionais na condição de acionistas. Sabe-se, contudo, que a maioria das sociedades que vem operar no Brasil busca sua constituição sob o tipo societário limitada, por causa da agilidade operacional desse tipo de empresa, bem como e, principalmente, em razão da possibilidade de menor exigência de transparência dos seus balanços fiscais.

Destarte, na prática, o que se tem presenciado, é a utilização de sociedades estrangeiras, tipo offshore - sociedades constituídas em paraísos fiscais, que possuem tal denominação por, geralmente, localizarem-se em ilhas -, por aqueles que almejam a manutenção e perpetuação do patrimônio conquistado, fazendo com que sociedades estrangeiras participem de sociedades nacionais do tipo Ltda, como meio de proteção para salvaguardar os bens e direitos conquistados ao longo dos anos.

É de se ressaltar que tais sociedades não se tratam exclusivamente de meios ilegais para práticas de atos ilícitos. Tratam-se, muitas vezes, de expedientes regulares e usuais, próprias das exigências de um mundo globalizado com a incidência de mecanismos empresariais de alta velocidade.

Neste sentido, vale dizer, também, que seria utópico aguardar a autorização do Executivo para o início das atividades de todas as sociedades estrangeiras que pretendem se instalar no Brasil - outra alternativa disposta no artigo 1.134 do Código Civil. Essa medida, tomada ao pé da letra, no mínimo, inviabilizaria o país e tornaria mais alto o famoso "custo Brasil".

Cumpre observar que não são poucos os que entendem que a redação do artigo 1.134, de fato, não proíbe a sociedade estrangeira de investir em outros tipos societários - porque, isso seria desastroso economicamente, haja vista a quantidade de sociedades limitadas estrangeiras que, efetivamente, figuram como sócias em sociedades nacionais.

Ademais, é de bom tom que se esclareça que as sociedades estrangeiras, por possuírem personalidade jurídica, podem ser utilizadas como meio de distinguir o patrimônio da sociedade e dos sócios, através de planejamentos societários adequados e regulares, algo extremamente útil, tendo em vista os riscos inerentes da atividade negocial.

Neste diapasão, as pessoas físicas têm notória preocupação a respeito da salvaguarda dos bens e direitos conquistados ao longo dos anos, considerando que essa conquista de patrimônio assegura-se como uma das mais tradicionais formas de avaliação e reconhecimento das capacidades do ser humano.

Porém, um item tem que ficar evidenciado. Pela letra da lei, as sociedades do tipo limitada que contiverem em seus quadros societários sociedades estrangeiras estarão em desacordo com o artigo 1.134 do Código Civil Brasileiro - em outras palavras, estariam irregularmente constituídas.

Exemplo e conseqüência do que ora se consigna, é o da sociedade limitada, inadimplente, que possui no seu quadro societário sócios estrangeiros. No caso dos respectivos credores buscarem, em juízo, seus haveres, entendemos que o patrimônio dos sócios estaria sujeito à expropriação, pois, diante da patente irregularidade constitutiva societária, a responsabilidade dos sócios passaria a ser ilimitada.

Não se trata da hipótese de desconsideração da personalidade jurídica, prevista no artigo 50 do Código Civil, mas, sim, da conseqüência de sua irregularidade diante das normativas do diploma legal vigente. O artigo 1.080 do Código Civil dispõe que as deliberações infringentes do contrato ou da lei tornam ilimitada a responsabilidade dos que expressamente as aprovaram.

De todo modo, a realidade e a prática demonstram que um grande número de sociedades limitadas estrangeiras figura como sócia em sociedades nacionais, na configuração de verdadeiras joint ventures societárias, tendo em vista que com o desenvolvimento das relações econômicas, houve aumento do comércio entre os países, o que intensificou o fluxo de bens e serviços.

Sociedades cujas sedes são localizadas em outros países são responsáveis pela produção e circulação de bens e serviços, num mercado, veloz e feroz, significando que, para acompanhar a dinamização das relações econômicas internacionais, as empresas tiveram de encontrar maneiras de aumentar seu poder tecnológico e sua logística, atuando em países distantes de suas respectivas sedes, com leis e costumes diferentes dos seus.

Parece-nos, assim, bastante tranqüilo concluir que as sociedades do tipo limitada, cujos sócios sejam sociedades estrangeiras, por ocasião da aplicação do artigo 1.134 do Código Civil, estão irregulares, devendo adaptar-se ao tipo societário de sociedade anônima. Via de conseqüência, as elaborações e divulgações das demonstrações financeiras dessas sociedades ajustar-se-iam ao princípio da publicidade, em evidente atenção ao princípio da transparência - mola propulsora e elemento principal dos requisitos que levam á responsabilidade social, evidente mecanismo de equilíbrio e ajuste negocial.

Por fim, entendemos que cabe ao poder público a devida fiscalização, através dos órgãos incumbidos da execução do Registro Público de Empresas - Juntas Comerciais - atentando-se para os respectivos arquivamentos societários, a fim de que haja o evidente cumprimento da Lei, em favor da transparência.

Armando Luiz Rovai é doutor em direito pela PUC-SP e ex-presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo

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Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar