terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Validade da norma coletiva que prevê a inserção da CID em atestados médicos

Notícias Tribunal Superior do Trabalho

Nº 126
Período: 9 a 14 de dezembro de 2015

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamentos, contém resumos não oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade dos resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho.

SEÇÃO ESPECIALIZADA EM DISSÍDIO COLETIVO

Ação anulatória. Atestado Médico. Exigência da inserção da Classificação Internacional de Doenças (CID). Validade da cláusula de convenção coletiva de trabalho. Não violação do direito fundamental à intimidade e à privacidade.

Não viola o direito fundamental à intimidade e à privacidade (art. 5º, X, da CF), cláusula constante de convenção coletiva de trabalho que exija a inserção da Classificação Internacional de Doenças (CID) nos atestados médicos apresentados pelos empregados. Essa exigência, que obriga o trabalhador a divulgar informações acerca de seu estado de saúde para exercer seu direito de justificar a ausência ao trabalho por motivo de doença, traz benefícios para o meio ambiente de trabalho, pois auxilia o empregador a tomar medidas adequadas ao combate de enfermidades recorrentes e a proporcionar melhorias nas condições de trabalho. Sob esse entendimento, a SDC, por unanimidade, conheceu do recurso ordinário e, no mérito, pelo voto prevalente da Presidência, deu-lhe provimento para julgar improcedente o pedido de anulação da cláusula em questão. Vencidos os Ministros Mauricio Godinho Delgado, relator, Kátia Magalhães Arruda e Maria de Assis Calsing. TST-RO-480-32.2014.5.12.0000, SDC, rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, red. p/ o acórdão Min. Ives Gandra Martins Filho, 14.12.2015 (*Cf. Informativo TST nº 114 para decisão em sentido contrário)

Condenação por cyberbulling com piadas de português

Notícias Tribunal Superior do Trabalho
 
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a IGB Eletrônica S.A (antiga Gradiente Eletrônica S/A) a indenizar um advogado que teve sua assinatura falsificada e sofreu assédio moral por e-mails enviados pelo presidente da empresa. Para o relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, o dano ficou comprovado pelas mensagens eletrônicas, que continham piadas alusivas à sua nacionalidade portuguesa, inclusive com conotação pornográfica, e também a ilicitude do ato de terem falsificado sua assinatura. A decisão reforma entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP).
 
Contratado como pessoa jurídica para a função de gerente jurídico corporativo e promovido ao cargo de diretor jurídico, o advogado prestava serviços a várias empresas do grupo econômico da IGB Eletrônica. Na reclamação trabalhista, em que requereu indenização por danos morais, ele alegou que a falsificação da assinatura, em documento apresentado na Junta Comercial do Estado de Amazonas, poderia ter lhe causado transtornos materiais. Afirmou, também, que além de vexatórias, discriminatórias e pornográficas, as "piadas de português" eram enviadas com cópia para diversos executivos, diretores e empregados. Disse, ainda, que era alvo de inúmeros comentários no mesmo sentido, como "isso é coisa de português" e "só se for em Portugal", em tom irônico e ofensivo durante o expediente.
 
A empresa admitiu a falsificação, mas atribuiu a culpa a um escritório de contabilidade que prestava serviços à IGB. Assegurou que os comentários eram brincadeiras esporádicas, em ambiente de total cordialidade. Já em relação aos e-mails, sustentou que o próprio empregado afirmou, em depoimento, que os envios cessaram imediatamente a partir do momento em que ele reclamou e disse ao remetente que as mensagens lhe causavam constrangimento.
 
Decisão
 
Diante do exposto, o juízo da 62ª Vara do Trabalho de São Paulo e o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) julgaram improcedente o pedido de indenização. O TRT reconheceu a veiculação de e-mails e comentários alusivos à nacionalidade portuguesa do advogado e a falsificação, mas entendeu que o fato de os e-mails terem cessado a partir da manifestação do empregado, e de não ter sido demonstrado qualquer prejuízo em decorrência da assinatura adulterada, afastando a necessidade de reparação. Para o TRT, também ficou demonstrado que o advogado respondia aos e-mails em tom irônico e jocoso, o que revelava que o ambiente de trabalho era permissivo quanto a determinadas brincadeiras.
 
Em recurso contra a decisão, o trabalhador alegou que o limite aceitável das brincadeiras foi extrapolado por atos ofensivos e desrespeitosos à sua nacionalidade. Afirmou que a suposta culpa de um escritório de contabilidade contratado não isenta a responsabilidade da empresa pela falsificação. E insistiu que o abalo decorrente do crime à honra é evidente, ensejando inúmeros transtornos materiais, e que não condenar a empresa implicaria impunidade.
 
TST
 
No TST, o ministro Walmir Oliveira da Costa, relator, entendeu desnecessária a prova do prejuízo imaterial exigida pelo TRT em relação à falsificação, uma vez que o dano moral independe da comprovação do abalo psicológico sofrido pela vítima. Também considerou insustentável a conclusão regional de que a cessação dos e-mails seria suficiente para afastar a lesividade e a ilicitude da conduta empresarial. "A mudança de comportamento somente denota a assunção, pelo próprio ofensor, de que suas atitudes eram ofensivas ao reclamante", afirmou. "E, embora possa ser avaliado positivamente, o encerramento futuro da ofensa não apaga os acontecimentos pretéritos e, nesses limites, não se confunde com a sua inexistência".
 
Por violação dos artigos 186 e 927 do Código Civil, e 5º, incisos V e X, da Constituição da República, a Primeira Turma do TST fixou a indenização por dano moral em R$ 157.600 pela falsificação da assinatura e em R$ 78.800 pelo assédio moral.
 
A decisão foi por unanimidade.
 
(Ailim Braz/CF)
 
Processo: RR-547-86.2011.5.02.0062

Bloqueio do WhatsApp

Migalhas
 Eduardo Talamini
 
Sob aspecto objetivo, impedir o WhatsApp de funcionar implica restringir garantia fundamental. Sob o aspecto subjetivo, implica cercear a liberdade de comunicação de milhões de pessoas.
 
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
 
 
O juiz do caso WhatsApp adotou uma medida coercitiva ou de “execução indireta”. Trata-se de mecanismo destinado a pressionar psicologicamente o destinatário da ordem judicial, a fim de que ele mesmo a cumpra. Ameaça-se o devedor com medidas constritivas que o induzem a – voluntária, ainda que não espontaneamente – cumprir a determinação do juiz. A despeito da cominação de multa, houve a recusa por parte do administrador do WhatsApp em fornecer ao juízo dados atinentes a conversas feitas por tal aplicativo. O juiz então renovou a ordem de apresentação, sob “pena” de bloqueio por 48 horas. Descumprida sua ordem, efetivou-se o bloqueio, como medida coercitiva. A decisão do juiz de primeiro grau foi rapidamente suspensa pelo TJSP. Mas a circunstância de não ser a primeira vez (e certamente também não ser a última...) que providência de tal natureza é determinada e a repercussão concreta por ela gerada nas poucas horas em que vigorou justificam essa brevíssima nota.
 
Os mecanismos coercitivos contrapõem-se aos sub-rogatórios, pelos quais o próprio poder jurisdicional, mediante atos diretos do juiz ou de auxiliares seus, produz o resultado que se teria com o cumprimento da decisão. Na concepção clássica de processo, a atuação executiva deveria dar-se basicamente mediante meios sub-rogatórios. Quando não fosse viável a substituição da conduta do obrigado por providências judiciárias, a execução específica era tida por “impossível” e restava a apenas o caminho da conversão em perdas e danos. Na concepção clássica de processo, as coisas paravam por aí. O juiz não poderia emitir ordens às partes. Essa noção está superada, a ponto de dispensar nesse brevíssimo texto qualquer consideração adicional: os exemplos são fartos e não é preciso buscá-los em repertórios jurisprudenciais. Basta ligar a televisão.
 
Enquadrar ou não os meios coercitivos (a “execução indireta”) no âmbito da execução propriamente dita depende da perspectiva que se adote. Carnelutti – em sucessivas obras suas (o que segue é a sistematização de noções que foram sendo ajustadas em seus escritos) – destacou o caráter híbrido dessas medidas, comparando-as com a “estrutura” e a “função” da “execução” (por sub-rogação, “restituição”) e da “pena” (“punição”, “penitência”). Sob o aspecto funcional, a “execução” é meio adotado a fim de que se atinja a situação a que o direito tende com o comando desobedecido; a “pena”, ao invés, emprega-se porque aquela situação não se verificou. A “execução”, em outros termos, visa à “satisfação” do direito violado; a “pena” impõe uma “aflição” em virtude da violação. Estruturalmente, a “execução” sacrifica o mesmo interesse (ou interesse equivalente ao) que se afetaria caso observado o comando; a “pena” golpeia um interesse diverso. A medida coercitiva constitui um terceiro gênero, entre a “pena” e a “execução”. Apresenta em comum com a “pena” sua estrutura, pois recai sobre bem do devedor diferente daquele que é objeto do dever violado. Já funcionalmente, identifica-se com a “execução”: tem finalidade “satisfativa”, antes que “aflitiva”.
 
Essa explicação até mereceria reparos pontuais, pois mistura dois planos classificatórios (o dos comandos sancionatórios com o das medidas sancionatórias – v. o meu Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, 2ª ed., SP, RT, 2003, cap. 5). Mas é correta na essência e muito útil para compreender o papel e os limites da medida de coerção.
 
No âmbito dos deveres de fazer e de não fazer, as medidas coercitivas são fundamentais. Em primeiro lugar, muitos desses deveres são infungíveis, no sentido de que não comportam sub-rogação, podendo apenas ser cumpridos pelo próprio obrigado (a rigor, os deveres de não fazer seriam sempre infungíveis – noção que é relativizada, ao menos quando o obrigado é uma pessoa jurídica ou outro ente coletivo, pela possibilidade de intervenção judicial na administração desse ente). Depois, mesmo quando há, em tese, a possibilidade de sub-rogação, as providências substitutivas de conduta tendem a ser onerosas e demoradas.
 
O progresso tecnológico e a globalização das relações sociais e econômicas conferem ainda maior relevância aos meios de coerção. Em muitas situações, o cumprimento da providência ordenada judicialmente envolve o domínio de tecnologia sofisticada. Ampliam-se, assim, os casos de infungibilidade no cumprimento do dever ou da extrema onerosidade no emprego da providência sub-rogatória. A isso se soma outro complicador. Não raras vezes, os efeitos a coibir ou resultados a atingir situam-se no território brasileiro. No entanto, as providências sub-rogatórias precisariam ser realizadas fora do Brasil. Em outras palavras: a tecnologia amplia a ocorrência de situações em que as condutas geram efeitos transnacionais. Coibir tais efeitos exige atuar fora dos limites do território nacional.
 
Ao que tudo indica (esse comentário é feito sem acesso ao inteiro teor das decisões do processo, que tramita em segredo de justiça), esse foi o cenário com que se deparou o juiz penal do caso em discurso. Diante da dificuldade de agir diretamente sobre os bancos de dados do WhatsApp e de adotar medidas contra as pessoas de seus administradores, o juiz elegeu, como meio de coerção atípico, proibir o funcionamento do aplicativo no Brasil. Pareceu-lhe ser a medida eficaz que estava a seu alcance.
 
Ao juiz é conferido o poder geral para a adoção de medidas coercitivas. Vale dizer: providências atípicas podem ser adotadas. Ele não fica adstrito aos mecanismos expressamente previstos no ordenamento (como a multa processual). A enumeração de medidas constante do § 5.º do art. 461 do CPC/73 (que corresponde ao art. 536, § 1º, do CPC/15) não é exaustiva – o que se depreende da locução conjuntiva “tais como”, que a antecede (no art. 536, § 1º, do CPC/15, a não-exaustividade é indicada pela expressão “entre outras”). Esse é o entendimento assente. O juiz, além disso, não fica vinculado às medidas que eventualmente o autor pleiteie (ainda que no caso, pelo que se tem notícia, a providência coercitiva tenha sido inclusive pleiteada pelo Ministério Público, autor da ação). As medidas em questão são adotáveis de ofício. De resto, tem-se também reconhecido que a norma em questão é subsidiariamente aplicável ao processo penal (CPP, art. 3º).
 
Mas não se trata de poder ilimitado.
 
Primeiro, fica afastada a adoção de qualquer medida que o ordenamento vede. Por exemplo, não poderá ser usada a prisão civil, senão na restrita hipótese prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos (para descumprimento de ordem judicial impositiva de dever de natureza alimentícia).
 
Depois, mesmo no universo de medidas em tese admissíveis, terão de ser considerados os princípios gerais da proporcionalidade e razoabilidade, que norteiam toda a atuação estatal (tratei da incidência de tais princípios na tutela dos deveres de fazer e não fazer no cap. 16 do já referido Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer). As providências adotadas devem guardar relação de adequação com o fim perseguido, não podendo acarretar na esfera jurídica do réu sacrifício maior do que o necessário. O art. 620 do CPC/73 (CPC/15, art. 805) nada mais é do que expressão dessas diretrizes no processo executivo. Daí que a formulação contida nessa norma é por igual aplicável às demais modalidades de processo – não propriamente “por analogia”, mas pela direta incidência daqueles princípios (aliás, no CPC/15, os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade são reafirmados em suas normas gerais – art. 8º).
 
A eleição concreta das medidas coercitivas atípicas, mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, tende a ser tarefa bastante delicada. É da essência do instrumento coercitivo certa desproporcão entre o bem atingido pela sanção e o bem tutelado. Para ser eficaz, a medida de coerção terá de impor ao réu um sacrifício, sob certo aspecto, maior do que o que ele sofreria com o cumprimento do dever que lhe cabe. Daí a extrema dificuldade de estabelecer limites de sua legitimidade, sem destruir-lhe a essência: a medida coercitiva deve configurar efetiva ameaça ao réu, apta a demovê-lo da intenção de transgredir, e, simultaneamente, não afrontar os princípios acima mencionados.
 
Lembre-se, por exemplo, que o Supremo Tribunal Federal, em diferentes oportunidades, firmou jurisprudência reputando inconstitucionais determinadas medidas administrativas de cobrança indireta, no campo fiscal (Súmulas 70, 323 e 547). A apreciação das hipóteses consideradas ilegítimas pelo Supremo auxilia na resolução do problema. Tratava-se de providências destinadas a impedir a atividade empresarial ou profissional de contribuinte em débito, enquanto não fosse pago o tributo (Súmula 70: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”. Súmula 323: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”. Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais”). O mais evidente defeito de tais expedientes estava na sua incompatibilidade com o fim visado: estabelecer-se-ia situação em que, impedido de operar, o profissional ou empresa afastar-se-ia ainda mais de qualquer possibilidade de composição da dívida. Ofender-se-ia a máxima da adequação (ou da finalidade), que é desdobramento da proporcionalidade. E havia outro vício, ainda mais grave. O cunho patrimonial do direito tutelado pela medida indireta de cobrança – ainda que qualificado pelo interesse geral arrecadatório e amparado no princípio da solidariedade – não justificaria a restrição total ao exercício da profissão ou empresa. Mais do que mera desproporção quantitativa (sempre e justificadamente presente nas medidas de coerção), existiria grave desequilíbrio qualitativo: o valor jurídico visado pela medida coercitiva teria menor relevância, na ordem constitucional, do que aqueles afrontados. De mais a mais, seria gravemente atingida a esfera jurídica de terceiros: com a paralisação das atividades da empresa, seus empregados, fornecedores e outros parceiros seriam prejudicados.
 
Daí é possível extrair algumas diretrizes para o emprego de medidas coercitivas atípicas.
 
Em primeiro lugar, o meio de coerção não pode inviabilizar o cumprimento, pelo réu, do dever de fazer ou de não fazer. Não é providência que se destine a penalizar o réu: o sacrifício que se lhe impõe não é castigo nem visa à sua educação; está instrumentalmente vinculado à perspectiva de cumprimento. Use-se como exemplo hipótese similar à condenada pelo Supremo: contra o construtor inadimplente na obrigação de finalizar uma obra, jamais se poderia adotar a suspensão de sua licença para atuar.
 
Além disso, a medida coercitiva não pode sacrificar bem jurídico substancialmente mais relevante, do ponto de vista axiológico, do que o bem protegido. Na maioria dos casos, seria desproporcional e desarrazoada a ameaça de fechamento de uma empresa (com todas as suas graves consequências sociais), caso ela não cumprisse ordem judicial de prestação de serviço contratualmente assumido dentro de determinado prazo. No entanto, semelhante expediente, tal como o lacre de maquinário, poderia tornar-se eventualmente justificável, se o interesse tutelado pela providência dissesse respeito ao meio ambiente ou à saúde pública. (Note-se que, neste exemplo, a medida tende a assumir caráter dúplice – funcionando como instrumento de coerção e também como providência sub-rogatória, quando servir, por exemplo, para sustar a continuidade do resultado danoso ao meio ambiente ou à saúde pública.)
 
A esse ponto liga-se outro aspecto essencial. Além do problema atinente à desproporção sob o aspecto qualitativo, põe-se o problema da exorbitância subjetiva. A liberdade de imprensa não é um direito do jornal. Não é sequer exclusivamente um direito subjetivo do jornalista. Todos eles têm o direito de se valer intensamente dessa liberdade fundamental, a fim de que se garantir a plena e ampla difusão de informações. Mas, em última análise, a liberdade de imprensa é um direito fundamental de cada sujeito, de cada cidadão: do leitor do jornal e daquele que não lê o jornal; do sujeito que assiste diariamente aos jornais televisivos e daquele outro que foge dos noticiários... Tem-se uma garantia institucional. Um direito fundamental objetivado e difuso. Obviamente, o mesmo se dá com a liberdade dos meios de comunicação. O direito ao emprego dos mecanismos e tecnologias de comunicação não são uma propriedade exclusiva das empresas que os operam. Pertencem indistintamente a todos, sejam ou não usuários de cada um desses serviços (CF, arts. 5º, IX, e 220).
 
Como se vê, a questão nem sequer pode ser encarada a partir da (em si mesma já insatisfatória) fórmula do interesse coletivo (que supostamente estaria retratado na investigação criminal) x interesse individual de cada usuário do WhatsApp. Mesmo se fosse isso, nada garantiria a prevalência do “coletivo”: permaneceria a necessidade de ponderar os valores envolvidos. Mas está muito longe de ser isso.
 
Portanto, sob aspecto objetivo, impedir o WhatsApp de funcionar implica restringir uma garantia institucional fundamental. Sob o aspecto subjetivo, implica cercear gravemente a liberdade de comunicação de milhões de pessoas – cem milhões de usuários, ao que consta; mas a liberdade não só deles, como visto. São todos terceiros: alheios ao processo em que se determinou o bloqueio de funcionamento do WhatsApp e alheios ao litígio objeto daquele processo. Não têm como interferir diretamente para o cumprimento da ordem.
 
Não se conhecem os detalhes do caso criminal objeto do processo. No âmbito da ponderação de valores, não é possível dar respostas na base do “ou tudo ou nada”. Portanto, e em tese, não se poderia descartar uma situação limítrofe, absurdamente grave, em que a providência investigativa fosse de tal urgência e essencialidade que justificasse medida coercitiva drástica como a tomada. Mas isso se cinge a situações limítrofes (e ainda assim restaria a dúvida quanto à eficiência prática de tal medida). Adotar o bloqueio de funcionamento como simples sanção pelo desrespeito à autoridade judiciária é desconsiderar todos os aspectos acima destacados.
 
Além de tais balizas relativas ao conteúdo da medida, outra igualmente relevante para a legitimidade da medida coercitiva ou sub-rogatória põe-se no âmbito procedimental. Sempre que possível, o juiz ouvirá previamente as partes (e o terceiro contra quem a ordem e a medida de coerção são dirigidas, como é o caso), ainda que fixando prazo breve para tal manifestação. A observância do contraditório prévio à adoção das medidas atípicas só será afastada nos casos de extrema urgência. Enfim, há exigência de constante diálogo do juiz com as partes (essa dimensão do art. 5º, LV, da CF é apenas explicitada pelos arts. 9º e 10 do CPC/15, que não têm, portanto, conteúdo inovador, sob esse aspecto). Mas se a providência coercitiva é destinada a atingir indiscriminadamente terceiros, como no caso em análise, em que medida bastaria o contraditório entre os sujeitos que estão de algum modo participando do processo? Cada vez mais o processo é apto a produzir resultados que incidem vinculativamente muito além das partes. Em contrapartida, intensificam-se os mecanismos de participação desses terceiros nos processos em que eles não são partes. O instituto da audiência pública e a figura do amicus curiae, já amplamente acolhida no processo brasileiro e agora tipificada como modalidade geral de intervenção de terceiros no CPC/15 (art. 138), são as maiores demonstrações disso.
 
Some-se a isso a questão, não menos relevante, atinente à eficiência prática da medida. Eis um aspecto fundamental das medidas coercitivas: elas não são pena, não são castigo; precisam eficientemente funcionar como meio de pressão psicológica.
 
A excessiva desproporcionalidade da medida cominada como meio de execução indireta tende a não ser eficaz, como meio de pressão sobre o destinatário da ordem, por pelo menos duas razões. A primeira é de que a excessividade da medida pode atingir um “ponto sem volta”, a partir do qual talvez nada mais faça diferença para o sujeito que deveria estar sendo pressionado (o filme Rosalie vai às compras, de Percy Adlon, termina com uma frase que bem ilustra essa situação, dita pela protagonista, que dá o nome ao filme e é interpretada por Marianne Sägebrechet: “Quando você deve dez mil dólares, você não dorme à noite; quando você deve dez milhões, quem não dorme são seus credores”...). Esse primeiro aspecto, muito relevante na quantificação de multas processuais periódicas, talvez não se aplique ao caso em exame.
 
Mas há um segundo aspecto muito pertinente ao caso. A excessiva drasticidade e desproporção da medida podem desde logo incutir no destinatário da ordem a percepção de que ela não prevalecerá, não será mantida em grau de jurisdição superior. Ele então faz uma aposta – em alguns casos (como no ora em análise), razoavelmente segura – de que a medida coercitiva não será mantida, dada sua estrondosa desproporção. Algo como um “quanto pior, melhor”. Uma vez formada essa convicção, o mecanismo de pressão cai por terra. O caso em discurso é uma razoável demonstração disso. A ameaça de bloqueio não serviu para pressionar o administrador do WhatsApp. Ele permaneceu não cumprindo o comando judicial – e apostou, corretamente, na revogação da medida, dada sua exorbitância qualitativa e subjetiva. Logo nas primeiras horas úteis de vigência do bloqueio, ele já estava cassado. Enfim, uma medida coercitiva ineficaz e inútil.
 
 
*Eduardo Talamini é sócio do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini - Advogados Associados. Livre-docente em direito processual (USP). Professor de Processo Civil, Processo Constitucional e Arbitragem (UFPR). Advogado (em férias, nesse exato momento, e nem um pouco desejoso de receber mensagens pelo WhatsApp).
 

Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM)

Jornal Valor Econômico - Legislação & Tributos - 21.12.2015 - E2
 Por Alexandre C. da Silveira e Daniel Tobias Athias
21/12/2015 ­ 05:00
 
A Constituição atribuiu à União a propriedade dos recursos minerais, cuja exploração tem de ser feita no interesse nacional. Dentre as imposições do regime de exploração desses recursos, está o pagamento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), referente ao valor do custo de oportunidade do Estado, compensado pela exploração econômica de seu patrimônio, além de relacionada à finitude do bem. Ou seja, uma vez explorado, ele não estará mais disponível.
 
Apesar de não se tratar de parcela com natureza de "compensação ambiental", voltada para fins de mitigação e compensação por impactos ou danos, isto não implica relegar a questão ambiental da exploração mineral a segundo plano. Reconhece­se apenas que existem medidas/instrumentos próprios que servem a esse propósito, com valores direcionados exclusivamente para essa finalidade, como o que consta do art. 36 da Lei do SNUC. Embora seja instrumento relevante na política de exploração minerária, a CFEM não está particularmente vinculada à questão ambiental.
 
Fato é que a análise da atividade minerária deve ser holística, cotejando o impacto e o retorno socioeconômicos à sociedade. Contudo, tem­se visto que a deturpação de alguns instrumentos de análise leva ao enfraquecimento das medidas de compensação implantadas. Exemplo disso é a utilização do licenciamento ambiental não para impor medidas de proteção ao meio ambiente, mas sim de exigir investimentos em obras sociais e infraestrutura de forma ad hoc pelos licenciadores e pelo Ministério Público; apesar de serem obras essenciais para as comunidades impactadas, é frequente privilegiar as condicionantes sociais em detrimento da questão ambiental.
 
O maior problema da CFEM decorre justamente da forma como esta receita é utilizada pelos entes federativos (qualidade do gasto) ante as características da fonte. A exploração mineral é marcada por duas características intrínsecas: a volatilidade de preços no mercado internacional e a finitude do recurso ­ são esgotáveis e haverá momento em que esta fonte de arrecadação não mais estará presente.
 
Diante da volatilidade dos preços, o gestor público deve estar atento, na alta (como na maior parte da última década), que as receitas estão sujeitas a quedas abruptas. Isto precisa ser considerado quando da decisão de como utilizar esses valores, especialmente visando distingui­los de outras receitas mais constantes, como a tributária. Por exemplo, constrói­se um hospital em tempos de alta que fica sem médicos nos tempos de baixa caso a receita de CFEM tenha sido planejada como fonte de custeio. Melhor seria utilizar fundos para gerir essa receita, pois represariam o excesso, nos tempos de alta; e serviriam como reserva, nos tempos de baixa.
 
Já a finitude traz outras consequências. Uma delas é a necessidade de evitar a dependência desse tipo de receita. Ciente da esgotabilidade, devem ser estimuladas políticas de diversificação produtiva ­ de forma que, com o uso dos valores da CFEM, seja criada uma base de produção de outras receitas, estas não dependentes apenas da mineração. É questionável o gasto público dessa receita em despesas correntes e que não implicam reprodução.
 
Numa analogia recorrente: não se deve vender a prataria da casa para pagar as despesas ordinárias. Pode­se até questionar o papel do direcionamento de 65% da arrecadação da CFEM aos municípios, vez que estes sequer terão condições técnicas (inclusive territorial) para promover tal diversificação.
 
Outra consequência diz respeito à equidade intergeracional e o dever ético que temos para com as futuras gerações. A finitude dos recursos minerais deve ser ponderada com a perpetuação da sociedade ao longo do tempo. Sendo certo o esgotamento destes recursos e a renda deles oriunda, não se deve agir em detrimento das gerações futuras, que, a depender do gasto, não usufruirão desses bens/gastos.
 
A temporalidade parece não estar presente na análise atual quanto ao destino dessa receita, implicando no mau uso destes recursos para gasto corrente ou obras que não acarretarão melhoria para a sociedade (atual e futura). Será que o ordenamento jurídico voltado à gestão e gasto da CFEM orienta no sentido ora proposto? Pensa­se que não. Apesar da vedação de gasto em pagamento de dívida ou despesas correntes com pessoal, o regime de caixa único implica dificuldade de controlar o destino dessa receita e distingui­la das demais que não têm a mesma natureza. Reformas devem ser feitas nesse sentido.
 
O uso da receita de recursos não renováveis em despesas de custeio é desperdiçar fonte esgotável em gastos não reprodutivos, e deve ser evitado.
 
Alexandre Coutinho da Silveira e Daniel Tobias Athias são, respectivamente, doutorando em direito pela USP e sócio do Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff ­ Advogados; mestrando em direito pela USP, advogado do Grinberg & Cordovil ­ Advogados
 

Retrospectiva trabalhista e previdenciária de 2015

Consultor Jurídico
 
19 de dezembro de 2015, 6h08
Por Gustavo Filipe Barbosa Garcia
 
O ano de 2015 foi de intensa produção normativa, com a aprovação de diversos diplomas legais e emendas constitucionais que inovaram substancialmente a ordem jurídica. Vejamos, assim, os principais destaques nas esferas trabalhista e previdenciária.
 
O novo Código de Processo Civil, instituído pela Lei 13.105, de 16 de março de 2015, com início de vigência depois de um ano da data de sua publicação oficial, estabelece importantes modificações na esfera jurisdicional, com possíveis reflexos também nas áreas em estudo, mesmo porque, de acordo com o seu artigo 15, na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições do CPC de 2015 devem ser aplicadas supletiva e subsidiariamente, ou seja, em casos de omissão total e parcial.
 
A Emenda Constitucional 88, de 7 de maio de 2015, por sua vez, alterou o artigo 40, parágrafo 1º, inciso II, da Constituição da República, relativamente ao limite de idade para a aposentadoria compulsória do servidor público em geral.
 
Passou-se a prever que os servidores abrangidos por Regime Próprio de Previdência Social devem ser aposentados compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, aos 70 anos de idade, ou aos 75 anos de idade, na forma de lei complementar.
 
Foi acrescentado, ainda, o artigo 100 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
 
Com isso, até a entrada em vigor da lei complementar em questão, os ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União são aposentados, compulsoriamente, aos 75 anos de idade, nas condições do artigo 52 da Constituição Federal de 1988.
 
A matéria deu origem a diversos desdobramentos e questionamentos, inclusive judiciais, com destaque à Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.316/DF, perante o Supremo Tribunal Federal.
 
Mais recentemente, após o Congresso Nacional rejeitar veto da Presidência da República, a Lei Complementar 152, de 3 de dezembro de 2015, regulamentando essa modificação constitucional, dispôs que devem ser aposentados compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, aos 75 anos de idade: os servidores titulares de cargos efetivos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações; os membros do Poder Judiciário; os membros do Ministério Público; os membros das defensorias públicas; e os membros dos tribunais e dos conselhos de Contas.
 
Além disso, a Lei 13.134, de 16 de junho de 2015, modificou a disciplina do seguro-desemprego, com a previsão de requisitos mais rigorosos para o seu recebimento, notadamente para a primeira solicitação.
 
No âmbito da seguridade social, a Lei 13.135, de 17 de junho de 2015, estabeleceu modificações na legislação previdenciária, em especial quanto à pensão por morte, a qual pode não ser mais vitalícia em caso de recebimento pelo cônjuge ou companheiro, levando em consideração aspectos como o número de contribuições mensais, a duração do casamento ou da união estável e a idade do beneficiário na data de óbito do segurado.
 
É certo que as referidas medidas, restringindo direitos sociais, tiveram como justificativa a necessidade de manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência Social (artigo 201 da Constituição da República).
 
Esse objetivo, entretanto, não pode afrontar o Estado Democrático de Direito, fundado na dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988), em que o retrocesso social é vedado (artigos 5º, parágrafo 2º, e 7º, caput, da Constituição da República).
 
A Lei 13.183, de 4 de novembro de 2015, em conversão da Medida Provisória 676/2015, prevê a possibilidade de não incidência do fator previdenciário no cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição, ou seja, quando o total resultante da soma da idade e do tempo de contribuição do segurado, na data de requerimento da aposentadoria, for: igual ou superior a 95 pontos, se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de 35 anos; ou igual ou superior a 85 pontos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição de 30 anos. Trata-se da chamada fórmula 85/95.
 
As previsões voltadas a disciplinar a desaposentação, não obstante, foram vetadas.
 
Quanto às formas alternativas de pacificação dos conflitos, a Lei 13.129, de 26 de maio de 2015, ampliou o âmbito de aplicação da arbitragem e dispôs sobre a escolha dos árbitros, a interrupção da prescrição pela instituição da arbitragem, a concessão de tutelas cautelares e de urgência nos casos de arbitragem, a carta arbitral e a sentença arbitral.
 
Apesar disso, foi vetada a previsão que autorizava a cláusula compromissória nos contratos individuais de empregados que ocupam cargos de administração de ou diretoria, com a exigência de iniciativa do empregado na instituição da arbitragem ou a sua concordância expressa (artigo 4º, parágrafo 4º).
 
Com isso, ganhou força o entendimento, majoritário na doutrina e na jurisprudência, no sentido da incompatibilidade da arbitragem no âmbito da relação individual de emprego.
 
A Lei 13.140, de 26 de junho de 2015, dispôs sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
 
A mediação, nesse enfoque, é entendida como a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia (artigo 1º, parágrafo único).
 
O mencionado diploma legal, porém, não é aplicável à esfera trabalhista, conforme o seu artigo 42, parágrafo único, ao prever que a mediação nas relações de trabalho deve ser regulada por lei própria, certamente em razão de suas diversas peculiaridades.
 
Na jurisprudência, cabe registrar o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a “transação extrajudicial que importa rescisão do contrato de trabalho, em razão de adesão voluntária do empregado a plano de dispensa incentivada, enseja quitação ampla e irrestrita de todas as parcelas objeto do contrato de emprego, caso essa condição tenha constado expressamente do acordo coletivo que aprovou o plano, bem como dos demais instrumentos celebrados com o empregado” (RE 590.415/SC, relator ministro Luís Roberto Barroso, j. 30.4.2015).
 
A Lei Complementar 150, de 1º de junho de 2015, por seu turno, dispôs sobre o contrato de trabalho doméstico, concretizando os avanços decorrentes da Emenda Constitucional 72/2013, que modificou o artigo 7º, parágrafo único, da Constituição da República.
 
Ficou estabelecido ser empregado doméstico o trabalhador que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias por semana (artigo 1º).
 
Ademais, foram disciplinados importantes direitos sociais, como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e o seguro-desemprego, bem como instituído o regime unificado de pagamento de tributos, de contribuições e dos demais encargos do empregador doméstico (Simples Doméstico).
 
Frise-se ainda que a Lei 13.146, 6 de julho de 2015, instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando sua inclusão social e cidadania.
 
Em harmonia com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, consolidou-se o entendimento de que a pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (artigo 2º).
 
O diploma legal em questão, entre outros aspectos, ao versar sobre o direito ao trabalho, dispõe sobre a inclusão da pessoa com deficiência na atividade laborativa (artigos 34 a 36).
 
A Lei 13.189, de 19 de novembro de 2015, em conversão da Medida Provisória 680/2015, instituiu o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), com os objetivos de possibilitar a preservação dos empregos em momentos de retração da atividade econômica, favorecer a recuperação econômico-financeira das empresas, sustentar a demanda agregada durante momentos de adversidade para facilitar a recuperação da economia, estimular a produtividade do trabalho por meio do aumento da duração do vínculo empregatício e fomentar a negociação coletiva e aperfeiçoar as relações de emprego (artigo 1º).
 
Trata-se de medida de flexibilização das condições de trabalho em épocas de crise, com a possibilidade de celebração do acordo coletivo de trabalho específico, a ser pactuado entre a empresa e o sindicato de trabalhadores, podendo reduzir em até 30% a jornada e o salário (artigo 5º).
 
Merece destaque a previsão de que os empregados de empresas que aderirem ao PPE e que tiverem seu salário reduzido fazem jus a uma compensação pecuniária, a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), equivalente a 50% do valor da redução salarial e limitada a 65% do valor máximo da parcela do seguro-desemprego, enquanto perdurar o período de redução temporária da jornada de trabalho (artigo 4º).
 
Elencadas as principais novidades legais ocorridas em 2015, deve-se salientar que, no plano dos fatos, a instabilidade política tem gerado crescente retração da economia, com reflexos negativos nos níveis de renda e de emprego, acarretando profunda insegurança social.
 
De todo modo, finalizando esta breve retrospectiva, merece ser enfatizado o verdadeiro papel do Direito, principalmente em momentos mais delicados nas esferas econômica, social e política, como o atual.
 
Nesse sentido, em verdade, cabe ao Direito não apenas se adaptar, passivamente, aos novos tempos, mas contribuir, de forma positiva, para o desenvolvimento e o progresso, estabelecendo determinações normativas no sentido da melhoria das condições de vida.
 
Somente assim cumpriremos o mandamento constitucional de construção de uma sociedade livre, justa e solidária (artigo 3º, inciso I, da Constituição da República).
 
 
Gustavo Filipe Barbosa Garcia é livre-docente pela Faculdade de Direito da USP e professor titular do centro universitário UDF. É pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho. Foi juiz do Trabalho e procurador do Trabalho.
 
Revista Consultor Jurídico, 19 de dezembro de 2015, 6h08

Punições da CVM e Conselhinho

Jornal Valor Econômico - Finanças - 21.12.2015 - C10
 Por Juliano Basile
21/12/2015 ­ 05:00
 
Os integrantes dos conselhos de administração de bancos e empresas que dão aval a operações sem investigá­las com rigor estão sendo punidos com multas ou até mesmo com a inabilitação para o exercício do cargo e essa orientação deve ser mantida nos próximos anos em decisões do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) ­ o chamado Conselhinho ­ e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A conclusão está em estudo feito pelos professores da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Bruno Salama e Vicente Braga.
 
Eles analisaram 43 decisões do Conselhinho, entre 2010 e 2014, e fizeram um comparativo com as determinações da CVM tomadas anteriormente sobre os mesmos processos. Ao fim, os professores observaram que a CVM pune menos do que o Conselhinho, mas com rigor maior. Ao todo, de 43 casos analisados pelos dois órgãos, houve absolvição em 32 (ou 74% do total) pela CVM. Já o Conselhinho absolveu apenas 18 casos (ou 42%). Porém, enquanto o Conselhinho aplicou penas mais leves, como advertência em 14 dos 22 processos em que condenou, a CVM só optou por essa pena menos grave em três casos. O Conselhinho só determinou a inabilitação dos executivos em dois casos dos 43 julgados.
 
O resultado indica que os dois órgãos estão punindo mais rigorosamente os integrantes de conselhos de administração. "Há diversos precedentes em que conselheiros foram condenados porque não investigaram com zelo as informações que lhes são apresentadas", constatou o professor Bruno Salama. "A jurisprudência recente da CVM e do Conselhinho exige muito empenho e cuidado do conselheiro", disse.
 
Num desses casos, membros do conselho de administração do Banespa foram punidos com penas de inabilitação que variaram de um a três anos porque deram aval a operações de crédito contra alertas feitos em pareceres técnicos que indicavam indícios desfavoráveis à aprovação. "A lógica dessa decisão foi a de que o conselheiro até pode ir contra relatórios técnicos e indícios negativos, mas deve apresentar justificativas que fundamentem essa discordância", afirmou Vicente Braga, coautor da pesquisa.
 
Em outro caso, conselheiros do Banco Mercantil sofreram multas de R$ 200 mil por aprovar operações simplesmente validando pareceres técnicos, sem formar juízo de valor sobre elas. Para Braga, esse caso mostra que o conselheiro não pode se eximir da "responsabilidade por decisões de temas sensíveis simplesmente com base em relatórios técnicos".
 
Por fim, membros do conselho de administração da Tele Centro Oeste Celular Participações foram inabilitados por um ano após a comprovação de que não fizeram análise diligente sobre operações da empresa. "O conselheiro deve ter uma postura pró­ativa", acrescentou Braga. "Ele não pode simplesmente analisar os relatórios que são postos na sua frente. É preciso investigar os detalhes".
 
No período da pesquisa, não houve nenhum caso envolvendo a Petrobras, mas os professores advertem que, em decisões de maior impacto para a companhia, a jurisprudência demonstra que os integrantes do conselho de administração devem ter uma postura pró­ativa, que vá além dos relatórios apresentados internamente. Isso é necessário para identificar danos vultosos em grandes negócios, como a compra da refinaria de Pasadena, que resultou em sérios prejuízos à estatal, e a construção da refinaria de Abreu e Lima, que teve gastos muitos mais elevados do que as estimativas iniciais. Em ambos os casos, a presidente Dilma Rousseff presidia o conselho de administração da Petrobras no período em que houve autorização para a realização dos negócios.
 
Segundo os professores, se ficar comprovado que o conselho de administração da estatal agiu sem zelo, os seus integrantes podem ser punidos com multa ou com inabilitação para o exercício do cargo de administrador de companhia aberta, pois esses tipos de penalidades têm sido impostos pelo Conselhinho com maior frequência nos últimos cinco anos.
 
Ao fim da pesquisa, três aspectos chamaram a atenção dos professores. O primeiro é que demora muito para que os casos que saem da CVM sejam julgados pelo Conselhinho. Uma das razões é que a Procuradoria­Geral da Fazenda Nacional (PGFN) demora, em média, três anos para fazer um parecer sobre cada processo.
 
Outro aspecto é que o Conselhinho modifica muitas decisões da CVM. Segundo os autores da pesquisa, os valores e a extensão de cada punição variam conforme a gravidade dos atos verificada em cada órgão.
 
O terceiro aspecto é que os dois órgãos consideraram que os membros dos conselhos de administração têm o dever de diligência sobre as operações que aprovam dentro de bancos e empresas. "Exige­se do conselheiro não apenas cuidado, mas muito cuidado. Já não vivemos mais o tempo em que qualquer desculpa colava", escreveram os autores.
 

Incêndio do Museu da Língua Portuguesa

Entristeceu-me o incêndio de ontem do Museu da Língua Portuguesa, na capital paulista, porém lamentei ainda mais intensamente a morte de um bombeiro civil (brigadista) na ação de combate ao infortúnio. Segundo o anunciado, o acervo do museu é totalmente digital e é fácil recuperá-lo.
Visitei o museu há uns 2 anos e me chamou a atenção a excessiva ênfase às influências africanas e indígenas na abordagem do nosso idioma, indicando inclusive a localização geográfica das respectivas tribos.
Sou longe de ser um filólogo, mas as referidas influências, tão fortemente enaltecidas, limitam-se a formação de palavras (mesmo que sejam muitas) e não dizem respeito à origem, formação e estrutura da língua, que não é apenas aquela falada no Brasil.
Sinceramente, o Museu da Língua Portuguesa deveria ser rebatizado para Museu da Língua Portuguesa do Brasil, uma vez que o nosso belo idioma, talvez a maior herança dos nossos colonizadores portugueses, deita raízes muito mais profundas no latim e no grego. Os irmãos portugueses certamente não conhecerão um sem-número de palavras que aparecem do museu sinistrado, porque não dizem respeito à língua como um todo, mas a particularidades da cultura brasileira.
Lembro-me de que, em minha época de colégio, memorizei radicais gregos e latinos, prefixos e sufixos, e isto me ajudou muito na escola (inclusive nas aulas de biologia) e continua me auxiliando até hoje diante de vocábulos cujo significado desconheço.
Desejo que a reconstrução do museu da Língua Portuguesa seja breve, mas que ele possa enfim resgatar a verdadeira essência latina e grega do idioma naquilo que é relevante para a sua estrutura e base para a formação de novas palavras, sem a demasiada ênfase às contribuições de tribos indígenas e africanas (parece que isto passou a ser politicamente correto e é tempo de abrandar esse aspecto).
A alternativa seria alterar o nome do museu para Museu da Língua Portuguesa do Brasil. Aí, sim, poderíamos compreender melhor o seu acervo.

Escute a conversa na Bandnews no dia 24.12.2015 entre Boechat e Prof. Deonísio da Silva sobre o meu comentário


Registre as histórias, fatos relevantes, curiosidade sobre Paulo Amaral: rasj@rio.com.br. Aproveite para conhecê-lo melhor em http://www2.uol.com.br/bestcars/colunas3/b277b.htm

Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar