sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Dividendos polêmicos

Valor Econômico - EU & Investimentos - 29.01.09 - D1
Dividendos da discórdia
Por Murillo Camarotto e Fernando Torres, Valor Online, de São Paulo
O aprofundamento da crise internacional, que já começou a deixar marcas na atividade econômica brasileira, ainda não se mostrou tão forte a ponto de atingir a saúde financeira das maiores empresas nacionais de capital aberto. Levantamento realizado pelo Valor Online com as 20 maiores empresas de capital aberto brasileiras mostra que nos quatro meses após o fatídico 15 de setembro de 2008, quando a quebra do Lehman Brothers marcou a proliferação da crise pelo mundo, essas companhias anunciaram R$ 21,7 bilhões em remuneração aos acionistas, tanto na forma de dividendos como em juros sobre o capital próprio. No mesmo intervalo entre o fim de 2007 e o início de 2008, antes da crise chegar, o total ficou em R$ 18,5 bilhões.
Entre outras coisas, a distribuição destes valores para os acionistas mostra, segundo especialistas, que boa parte das grandes companhias nacionais ainda não vive situação delicada em termos de necessidade de crédito ou disponibilidade de caixa. Se fosse este o caso - como vem ocorrendo no exterior e com algumas empresas brasileiras de menor porte, como a Lojas Renner -, seria uma opção interessante a retenção dos dividendos e a alocação desses recursos em uma espécie de colchão de segurança para o dia-a-dia das operações.
Apesar de a legislação prever distribuição mínima de 25% do lucro na forma de dividendo, os administradores das empresas não têm a obrigação de antecipar o pagamento e também podem alegar, durante a assembléia de acionistas, que a remuneração é "incompatível com a situação financeira da companhia", de acordo com a Lei 6.404/76.
A opção pela distribuição dos proventos, no entanto, é bem vista por especialistas em finanças corporativas, que não enxergam grande utilidade em manter o caixa elevado diante de perspectivas fracas para a demanda futura. Mas os representantes dos trabalhadores vêem com muitas ressalvas a farta remuneração aos acionistas em tempos de demissões e pedidos de redução de jornada e salário e planejam reações. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) informou que já avalia o lançamento de um movimento pela suspensão temporária dos dividendos.
Favorável à distribuição dos proventos, o professor de Finanças do Ibmec-SP, Ricardo Almeida, diz não considerar saudável a manutenção de caixa elevado em períodos de crise. Uma vez retidos, segundo ele, esses recursos são normalmente aplicados em investimentos cujas taxas de retorno são bastante inferiores às que poderiam ser obtidas individualmente pelos acionistas, no caso da distribuição desses valores. "Por isso, é natural que haja uma pressão pelo pagamento dos dividendos."
Ele também acredita que não faz sentido manter o caixa alto quando as perspectivas de demanda são desanimadoras. Na opinião do professor, o esvaziamento do caixa por conta da distribuição de proventos, neste caso, acaba sendo positivo, pois obriga os administradores da companhia a trabalhar duro na redução de custos, algo vital em tempos turbulentos.
Na mesma linha, o professor de Finanças da Escola de Administração de Empresas, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo, Antonio Gledson de Carvalho, não vê grande utilidade para o caixa diante de um horizonte sem demanda. "Os recursos pertencem aos acionistas. Se você (empresa) acha que não vai vender nada no ano que vem, não tem por que manter os empregos e queimar as reservas; vai distribuir aos acionistas", explica o professor.
Baseadas nesta diretriz, algumas grandes pagadoras de dividendos já começaram a encolher sua estrutura, o que quase sempre passa por demissões, anúncios de férias coletivas e suspensão de investimentos. "O primeiro ajuste que se faz em momentos como este é na mão-de-obra e não no dividendo. As demissões refletem a preocupação com a demanda futura, enquanto que os dividendos já estavam programados", diz o professor de Finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA), José Carlos Luxo.
Os professores ponderam, no entanto, que as companhias devem ter cautela na intensidade dos ajustes, levando sempre em conta a possibilidade de reaquecimento econômico. Tanto Almeida, do Ibmec, quanto Carvalho, da FGV, acreditam que demissões exageradas e cancelamento de investimentos podem deixar algumas companhias "de calças na mão" na hora de atender a uma eventual retomada da demanda.
Principal entusiasta dessa teoria, Almeida vê certa "impaciência" em algumas empresas. Ele lembrou que a quebra do Lehman Brothers ocorreu em uma época do ano em que as companhias fechavam seus orçamentos para 2009 e que alguma dose de pânico pode ter contagiado os planos. "Parece que muitas empresas estão se preparando para um 2009 com demanda pífia, até menor do que realmente pode ocorrer", avalia Almeida. "Se não tivesse esse pânico, e com alguma expectativa de retomada da demanda no segundo semestre, algumas empresas poderiam optar por um planejamento diferente; poderiam manter o caixa e os investimentos e reduzir os dividendos."
Apesar de não haver correlação legal entre o pagamento de proventos e a manutenção de empregos, a elevação dos dividendos tem potencial para ser explorada pelos sindicatos como forma de pressionar as empresas contra as demissões.
E isso deve mesmo ocorrer. O presidente da CUT, Artur Henrique da Silva, afirma que a expansão dos dividendos reforça a tese de que muitas empresas estão utilizando a crise como desculpa para estabelecerem processos de demissão, de flexibilização e de salários. Ele informou que a entidade, por meio de sua subseção alocada no Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos (Dieese), está debruçada na elaboração de um estudo que abrange o pagamento de dividendos das 200 maiores empresas de capital aberto do Brasil.
A idéia da CUT é cruzar esses dados com empréstimos tomados pelas companhias com recursos oriundos do BNDES, FAT e FGTS. A depender dos resultados, a central sindical avalia o lançamento de uma campanha nacional pelo cancelamento dos dividendos durante o período de crise.
"O nosso estudo tem como objetivo mostrar contradições nas empresas que têm lucros altos, pagam dividendos, mandam recursos para o exterior e demitem trabalhadores", diz o sindicalista. "É fácil falar de responsabilidade social em tempos de economia aquecida e crédito farto. Para nós, responsabilidade social é fazer caixa e manter investimentos em vez de pagar dividendos", afirma o presidente da CUT, em um apelo dirigido a fundos de pensão, empresários e até mesmo acionistas individuais das companhias de capital aberto.
Das 20 companhias analisadas no estudo, 13 anunciaram remuneração a seus acionistas nos quatro meses que se seguiram ao dia 15 de setembro de 2008, ante 14 que fizeram o mesmo um ano antes. Os pagamentos mais robustos foram anunciados por Petrobras (R$ 7 bilhões), Vale (R$ 3,5 bilhões) e Bradesco (R$ 1,99 bilhão). Entre as empresas que anunciaram demissões no período analisado estão Vale, Gerdau, Santander e Usiminas.

Recursos para as ONGs

Joranl Destak - 30.01.09 p. 06
dinheiro público
Governo repassou R$ 2,9 bilhões para ONGs em 2008
Publicado em 30/01/2009 -
Organizações Não Governamentais (ONGs) e da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips) receberam do governo federal R$ 2,9 bilhões em 2008. O valor é 41% maior do que os R$ 1,2 bilhão que serão destinados à Segurança Pública neste ano. De 2001 até 2008 houve um aumento de 87% nos valores anuais repassados à essas entidades. No total, em oito anos, elas receberam R$ 23,3 bilhões dos cofres federais . Número de ONGs cresce Em 2007, existiam cerca de 3 mil organizações que recebiam recursos do governo. No ano passado, esse número subiu para 4.264, um acréscimo de 42%. De acordo com o site Contas Abertas, dos cerca de R$ 3 bilhões liberados em 2008, metade saiu dos ministérios da Ciência e Tecnologia (R$ 716 milhões), da Saúde (R$ 542,2 milhões) e do Desenvolvimento Agrário (R$ 207 milhões). CPI das ONGs As investigações no repasse do governo federal às ONGs não ganharam força no Congresso. Um dos únicos punidos foi o reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholland, acusado de desviar R$ 470 mil da universidade para decorar seu apartamento, em 2008. Ele pediu demissão e deixou o cargo.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Novas orientações jurisprudenciais do TST

Orientações Jurisprudenciais TST SDI-1 nºs 367 a 372 (Subseção I) e 149 a 153 (Subseção II)

TST PUBLICA NOVAS ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS

O Tribunal Superior do Trabalho publicou, nas três últimas edições do Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho, as Orientações Jurisprudenciais nºs 367 a 372 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), as de nºs 149 a 153 da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais e as Orientações Jurisprudenciais Transitórias de nºs 62 a 67 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais.

Orientações Jurisprudenciais da SDI-1:

367. AVISO PRÉVIO DE 60 DIAS. ELASTECIMENTO POR NORMA COLETIVA. PROJEÇÃO. REFLEXOS NAS PARCELAS TRABALHISTAS.
O prazo de aviso prévio de 60 dias, concedido por meio de norma coletiva que silencia sobre alcance de seus efeitos jurídicos, computa-se integralmente como tempo de serviço, nos termos do § 1º do art. 487 da CLT, repercutindo nas verbas rescisórias.
368. DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS. ACORDO HOMOLOGADO EM JUÍZO. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. PARCELAS INDENIZATÓRIAS. AUSÊNCIA DE DISCRIMINAÇÃO. INCIDÊNCIA SOBRE O VALOR TOTAL.
É devida a incidência das contribuições para a Previdência Social sobre o valor total do acordo homologado em juízo, independentemente do reconhecimento de vínculo de emprego, desde que não haja discriminação das parcelas sujeitas à incidência da contribuição previdenciária, conforme parágrafo único do art. 43 da Lei nº 8.212, de 24.07.1991, e do art. 195, I, “a”, da CF/1988.
369. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DELEGADO SINDICAL. INAPLICÁVEL.
O delegado sindical não é beneficiário da estabilidade provisória prevista no art. 8º, VIII, da CF/1988, a qual é dirigida, exclusivamente, àqueles que exerçam ou ocupem cargos de direção nos sindicatos, submetidos a processo eletivo.
370. FGTS. MULTA DE 40%. DIFERENÇAS DOS EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO DECORRENTE DE PROTESTOS JUDICIAIS.
O ajuizamento de protesto judicial dentro do biênio posterior à Lei Complementar nº 110, de 29.06.2001, interrompe a prescrição, sendo irrelevante o transcurso de mais de dois anos da propositura de outra medida acautelatória, com o mesmo objetivo, ocorrida antes da vigência da referida lei, pois ainda não iniciado o prazo prescricional, conforme disposto na Orientação Jurisprudencial nº 344 da SBDI-1.
371. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO. SUBSTABELECIMENTO NÃO DATADO. INAPLICABILIDADE DO ART. 654, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL.
Não caracteriza a irregularidade de representação a ausência da data da outorga de poderes, pois, no mandato judicial, ao contrário do mandato civil, não é condição de validade do negócio jurídico. Assim, a data a ser considerada é aquela em que o instrumento for juntado aos autos, conforme preceitua o art. 370, IV, do CPC. Inaplicável o art. 654, § 1º, do Código Civil.
372. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO. LEI Nº 10.243, DE 27.06.2001. NORMA COLETIVA. FLEXIBILIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
A partir da vigência da Lei nº 10.243, de 27.06.2001, que acrescentou o § 1º ao art. 58 da CLT, não mais prevalece cláusula prevista em convenção ou acordo coletivo que elastece o limite de 5 minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho para fins de apuração das horas extras.

Orientações Jurisprudenciais da SDI-2:
149. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. HIPÓTESE DO ART. 651, § 3º, DA CLT. IMPOSSIBILIDADE DE DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DE INCOMPETÊNCIA RELATIVA.
Não cabe declaração de ofício de incompetência territorial no caso do uso, pelo trabalhador, da faculdade prevista no art. 651, § 3º, da CLT. Nessa hipótese, resolve-se o conflito pelo reconhecimento da competência do juízo do local onde a ação foi proposta.
150. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO RESCINDENDA QUE EXTINGUE O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO POR ACOLHIMENTO DA EXCEÇÃO DE COISA JULGADA. CONTEÚDO MERAMENTE PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
Reputa-se juridicamente impossível o pedido de corte rescisório de decisão que, reconhecendo a configuração de coisa julgada, nos termos do art. 267, V, do CPC, extingue o processo sem resolução de mérito, o que, ante o seu conteúdo meramente processual, a torna insuscetível de produzir a coisa julgada material.
151. AÇÃO RESCISÓRIA E MANDADO DE SEGURANÇA. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL VERIFICADA NA FASE RECURSAL. PROCURAÇÃO OUTORGADA COM PODERES ESPECÍFICOS PARA AJUIZAMENTO DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. VÍCIO PROCESSUAL INSANÁVEL.
A procuração outorgada com poderes específicos para ajuizamento de reclamação trabalhista não autoriza a propositura de ação rescisória e mandado de segurança, bem como não se admite sua regularização quando verificado o defeito de representação processual na fase recursal, nos termos da Súmula nº 383, item II, do TST.
152. AÇÃO RESCISÓRIA E MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO DE REVISTA DE ACÓRDÃO REGIONAL QUE JULGA AÇÃO RESCISÓRIA OU MANDADO DE SEGURANÇA. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. INAPLICABILIDADE. ERRO GROSSEIRO NA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO.
A interposição de recurso de revista de decisão definitiva de Tribunal Regional do Trabalho em ação rescisória ou em mandado de segurança, com fundamento em violação legal e divergência jurisprudencial e remissão expressa ao art. 896 da CLT, configura erro grosseiro, insuscetível de autorizar o seu recebimento como recurso ordinário, em face do disposto no art. 895, “b”, da CLT.
153. MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO. ORDEM DE PENHORA SOBRE VALORES EXISTENTES EM CONTA SALÁRIO. ART. 649, IV, DO CPC. ILEGALIDADE.
Ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649, IV, do CPC contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art. 649, § 2º, do CPC espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista.

Orientações Jurisprudenciais Transitórias da SDI-1:
62. PETROBRAS. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. AVANÇO DE NÍVEL. CONCESSÃO DE PARCELA POR ACORDO COLETIVO APENAS PARA OS EMPREGADOS DA ATIVA. EXTENSÃO PARA OS INATIVOS. ARTIGO 41 DO REGULAMENTO DO PLANO DE BENEFÍCIOS DA PETROS.
Ante a natureza de aumento geral de salários, estende-se à complementação de aposentadoria dos ex-empregados da Petrobras benefício concedido indistintamente a todos os empregados da ativa e estabelecido em norma coletiva, prevendo a concessão de aumento de nível salarial – “avanço de nível” -, a fim de preservar a paridade entre ativos e inativos assegurada no art. 41 do Regulamento do Plano de Benefícios da Fundação Petrobras de Seguridade Social – Petros.
63. PETROBRAS. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. INTEGRALIDADE. CONDIÇÃO. IDADE MÍNIMA. LEI Nº 6.435, DE 15.07.1977.
Os empregados admitidos na vigência do Decreto nº 81.240, de 20.01.1978, que regulamentou a Lei nº 6.435, de 15.07.1977, ainda que anteriormente à alteração do Regulamento do Plano de Benefícios da Petros, sujeitam-se à condição “idade mínima de 55 anos” para percepção dos proventos integrais de complementação de aposentadoria.
64. PETROBRAS. PARCELAS GRATIFICAÇÃO CONTINGENTE E PARTICIPAÇÃO NOS RESULTADOS DEFERIDAS POR NORMA COLETIVA A EMPREGADOS DA ATIVA. NATUREZA JURÍDICA NÃO SALARIAL. NÃO INTEGRAÇÃO NA COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA.
As parcelas gratificação contingente e participação nos resultados, concedidas por força de acordo coletivo a empregados da Petrobras em atividade, pagas de uma única vez, não integram a complementação de aposentadoria.
65. REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA UNIÃO. ASSISTENTE JURÍDICO. APRESENTAÇÃO DO ATO DE DESIGNAÇÃO.
A ausência de juntada aos autos de documento que comprove a designação do assistente jurídico como representante judicial da União (art. 69 da Lei Complementar nº 73, de 10.02.1993) importa irregularidade de representação.
66. SPTRANS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. CONTRATO DE CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. TRANSPORTE COLETIVO.
A atividade da São Paulo Transportes S/A - SPTrans de gerenciamento e fiscalização dos serviços prestados pelas concessionárias de transporte público, atividade descentralizada da Administração Pública, não se confunde com a terceirização de mão-de-obra, não se configurando a responsabilidade subsidiária.
67. TELEMAR. PRIVATIZAÇÃO. PLANO DE INCENTIVO À RESCISÃO CONTRATUAL (PIRC). PREVISÃO DE PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO COM REDUTOR DE 30%. APLICAÇÃO LIMITADA AO PERÍODO DA REESTRUTURAÇÃO.

Não é devida a indenização com redutor de 30%, prevista no Plano de Incentivo à Rescisão Contratual da Telemar, ao empregado que, embora atenda ao requisito estabelecido de não haver aderido ao PIRC, foi despedido em data muito posterior ao processo de reestruturação da empresa, e cuja dispensa não teve relação com o plano.
Fonte: TST, em Notícias de 05.12.2008.

Cartilha do MTE sobre a nova Lei de Estágio

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 13.01.09 - E1Cartilha do Ministério do Trabalho esclarece sobre nova Lei do Estágio
Luiza de Carvalho
De São Paulo
As dúvidas em relação à aplicação da nova Lei do Estágio - a Lei nº 11.788, de 2008 -, que impôs uma série de regras para a concessão de estágios por parte das empresas, começam a ser dirimidas. O Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE) elaborou uma "cartilha esclarecedora" sobre a Lei do Estágio, que responde às 37 dúvidas mais freqüentes manifestadas pelas empresas e instituições de ensino desde que a lei entrou em vigor. O principal ponto esclarecido pelo governo trata das obrigações das empresas que concedem estágios - dispersas na lei, o que provoca diferentes interpretações. No entanto, os dois tópicos que mais causaram polêmica na nova legislação - o limite de dois anos para a duração do estágio e de 30 horas semanais para a jornada de trabalho - permanecem sem interpretações que garantam maior flexibilidade.A nova Lei de Estágio aumentou a responsabilidade das partes concedentes do estágio, além de instituir benefícios como a obrigatoriedade de recesso remunerado de 30 dias, vale-transporte e seguro acidente de trabalho. De acordo com a cartilha do ministério, cabe às empresas indicar um funcionário de seu quadro de pessoal, com formação ou experiência profissional na área de conhecimento desenvolvida no curso do estagiário, para orientar e supervisionar até dez estagiários simultaneamente. Outra exigência é enviar à instituição de ensino, com periodicidade mínima de seis meses, um relatório de atividades do estagiário.O limite de duração de dois anos dos estágios gerou dúvidas principalmente quanto à renovação de contratos de estágios que se deram sob a vigência da antiga lei - as empresas não sabiam ao certo se o período de estágio já realizado seria contabilizado. A cartilha não esclarece a questão, mas, procurado pelo Valor, o Ministério do Trabalho informou que, no caso de renovação, a duração do contrato anterior conta - ou seja, se o estudante tinha um ano na empresa somente poderá fazer a renovação por mais um ano. De acordo com Luiz Gonzaga Bertelli, presidente executivo do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), que auxiliou na elaboração da cartilha, o limite é necessário pois o jovem precisa de experiências em locais diferentes para ter a capacitação adequada para o mercado. Para Bertelli, um benefício importante trazido pela nova lei é a possibilidade de pessoas físicas contratarem estagiários, o que deve favorecer categorias como engenheiros e arquitetos.Pela cartilha, quando se tratar de estudantes de ensino médio não-profissionalizante e dos anos finais do ensino fundamental, as empresas devem reservar o percentual de 10% das vagas de estágio para portadores de deficiência. Na opinião da advogada Sara Costa Benevides, do escritório Homero Costa Advogados, a cartilha pecou nesse ponto, pois não há referência ao tipo de ensino na lei. "A intenção do legislador não foi restringir a reserva de vagas ao ensino médio", diz. Outra inovação trazida pelo documento é a possibilidade de desconto na bolsa-auxílio recebida pelo estagiário em caso de ausências constantes no trabalho. (LC)Baixe aqui inteiro teor da cartilha: http://www.mte.gov.br/politicas_juventude/Cartilha_Lei_Estagio.pdf

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Crise aumenta pedidos de recuperação

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 09.10 e 11.01.09 - E1

Crise econômica aumenta número de pedidos de recuperação judicial
Adriana Aguiar e Zínia Baeta, de São Paulo
Ainda que o número de recuperações judiciais requeridas pelas empresas tenha aumentado apenas 15,9% na comparação entre 2007 e 2008, os meses de novembro e dezembro do ano passado já refletem os efeitos da crise econômica sobre as empresas. Nele, o crescimento dos pedidos de recuperação, conforme dados da Serasa, foi de 143,7% e 130%, respectivamente. E, ao que tudo indica, o cenário não deve mudar, ao mesmo a curto prazo. Grandes escritórios de advocacia do país e bancas especializadas em recuperações e falências consultadas pelo Valor registram desde outubro um crescimento intenso nas consultas de empresas interessadas em utilizar a recuperação judicial como saída para seus problemas financeiros. O número de empresas com recuperações a serem propostas no Poder Judiciário também já é grande neste mês de janeiro.
O advogado Júlio Mandel, do escritório Mandel Advocacia, especializado em falências e recuperações, afirma que quatro de seus clientes aguardam o resultado das negociações para a liberação de crédito com instituições financeiras para decidirem se entram ou não com pedidos de recuperação judicial na Justiça. "Essas empresas estão com dificuldade de liquidez. Se conseguirem os empréstimos não precisarão entrar com os pedidos", afirma o advogado, que relata um aumento de 50%, desde outubro, no número de consultas preventivas por empresas em dificuldades - dezenas vindas de companhias de menor porte. Mandel também lembra do problema das empresas já em recuperação em darem continuidade a seus planos, também em razão da falta de crédito. O advogado especialista em falências Nelson Marcondes Machado, do escritório Marcondes Machado Advogados, afirma ter seis casos já engatilhados de empresas que devem entrar com recuperações. A banca tem recebido, em média, duas ligações de representantes de grandes empresas por semana. "O número de consultas triplicou e deve continuar assim em 2009", afirma.
Em função do aumento da demanda na área de falências e recuperações judiciais, o escritório Barbosa, Müssnich & Aragão Advogados contratou dois advogados especializados. Na banca Bumachar Advogados Associados, o aumento de consultas correspondeu a 30% nos últimos três meses e quase a metade desses clientes já pediram recuperações judiciais. O TozziniFreire , com cerca de cinco vezes mais consultas desde outubro, está à frente de cinco negociações diferentes, nas quais representa credores, com usinas, concessionárias e um frigorífico.
Dentre os motivos que têm levado as empresas a estudarem a recuperação judicial e a entrarem com pedidos na Justiça, segundo os advogados, estão a falta de capital de giro. "Boa parte dessas empresas são sólidas e sofrem pelo momento e pela escassez de crédito", afirma Edemilson Wirthmann Vicente, sócio do escritório Limongi Wirthmann Vicente Advogados. De acordo com ele, ao longo de 2008 o escritório acompanhou cinco recuperações de clientes. Neste ano, já são oito que analisam a possibilidade de recorrer ao instrumento. Além do crédito escasso, mais caro e dos prazos menores, o assessor econômico da Serasa, Carlos Henrique de Almeida, afirma que a inadimplência dos consumidores aumentou em 2008 na comparação com o ano anterior. O percentual correspondeu a 7,6% entre janeiro e dezembro do ano passado, o que colabora para a dificuldade das empresas. Outra mudança sentida pelos advogados é no tipo de empresa que busca a recuperação. Em outubro e novembro do ano passado, por exemplo, a maior parte delas era do setor agroindustrial - mas agora os setores agora são os mais diversos, segundo eles, incluindo empresas de varejo, do setor têxtil e de autopeças, por exemplo.
As empresas em recuperação, no entanto, estão tendo mais investimentos de fundos interessados em participar com ativos para tentar reerguê-las, segundo a advogada Laura Mendes Bumachar, do Barbosa, Müssnich. Ela assessora quatro fundos que já possuem participação nessas empresas, mas temem por uma falência. O interesse em investir nesses empreendimentos se explica pelo artigo 67 da nova Lei de Falências, que prevê que se o capital foi investido após o pedido de recuperação, esses créditos são preferenciais dentro de uma falência. "Para fundos que já estão nas empresas, é melhor investir um dinheiro a mais e ter a possibilidade de ver a empresa se reerguer para reaver esse capital do que perder de vista o que já foi investido antes da recuperação", diz Laura. O advogado Luiz Fernando Valente de Paiva, do escritório Pinheiro Neto Advogados, também afirma que há um crescimento, ainda que pontual, no número de empresas ou fundos interessados em investir nas empresas em recuperação. A banca assessorou, em novembro, o Sindicato dos Bancos, que optou por conceder US$ 30 milhões para a recuperação judicial da Sementes Selecta, do mercado de soja. O banco é detentor da alienação fiduciária da fábrica de beneficiamento de soja da empresa, com sede em Araguari, em Minas Gerais. Outra movimentação observada é a de empresas interessadas em adquirir ativos de empresas em recuperação, segundo os advogados Marcelo Rodrigues e Fábio Rosas, do escritório TozziniFreire Advogados. Atualmente, eles assessoram um potencial comprador da Agrenco, em recuperação judicial desde o fim de agosto.
Além dos pedidos de recuperação judicial, os extrajudiciais também tendem a aumentar com a crise. Em 2008, foram 14 pedidos de recuperação extrajudicial, acima dos 9 requerimentos verificados em 2007 - uma elevação de 55,6%. Neste ano, só o Barbosa, Müssnich coordena dois novos casos: da ITSA TV por assinatura, já homologado na Justiça de Brasília e ontem submetido aos credores americanos, e de uma indústria têxtil que está para ser homologado pelo Poder Judiciário.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Falta de pagamento das verbas rescisórias gera dano moral

Noticiário do TRT da 15ª Região - 07.01.09

EMPRESA INDENIZA POR DANO MORAL POR NÃO TER PAGO AS VERBAS RESCISÓRIAS
A 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região deu provimento a recurso ordinário do reclamante, num processo movido contra uma indústria de produtos alimentícios de Ribeirão Preto, condenando a reclamada a pagar R$ 4 mil ao ex-empregado, a título de indenização por dano moral. A empresa demitiu o autor, mas não pagou as verbas rescisórias, apesar de reconhecer, inclusive na contestação ao pedido, que elas eram devidas. Além disso, a empresa não fez a homologação da rescisão do contrato de trabalho, o que impediu o reclamante de levantar os depósitos do FGTS.
Desempregado e sem dinheiro, o trabalhador se viu sem condições de prover o próprio sustento e deixou de honrar seus compromissos financeiros. Vários cheques emitidos por ele foram devolvidos por insuficiência de fundos, e seu nome acabou incluído nos cadastros da Serasa, situação confirmada pela prova documental juntada ao processo.
Ao contrário, as alegações da reclamada, de que atravessava “sérios problemas financeiros”, não foram provadas. Ainda que tivessem sido, não afastariam a culpa da empresa pela ocorrência do dano moral. O entendimento é da relatora do acórdão no TRT, desembargadora federal do trabalho Tereza Aparecida Asta Gemignani, e foi acompanhado pelos demais integrantes da Câmara. “O artigo 186 do Código Civil imputa o dever de reparação àquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral”, lecionou a desembargadora.
– Extraem-se daí os pressupostos a compor a definição do que seja ato ilícito passível de indenização, como sendo a ação ou a omissão, advindas da culpa ou dolo, que tenham relação de causalidade com o dano experimentado pela vítima – reforçou a magistrada.
Quanto à quantia a ser paga, a relatora argumentou que ela foi fixada considerando-se a gravidade do ato e a necessidade de assegurar o efeito pedagógico da indenização. Para a desembargadora Tereza, o valor é suficiente para compelir os responsáveis a evitar novas ocorrências da mesma natureza, sem, contudo, acarretar o enriquecimento ilícito do autor. O valor será corrigido desde a data do arbitramento, conforme estabelece a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). (Processo nº 00473-2007-067-15-00-8 RO)

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Brasil no ranking de confiança

Jornal do Commercio - Economia - 05.01.09 - A-3

Brasil é 4º país do mundo no ranking de confiança das empresas
A confiança das empresas está em queda no mundo todo, exceto nos chamados países emergentes, incluindo o Brasil. O País é hoje o quarto mais otimista do mundo e só perde em confiança para Índia, Botswana e Filipinas. Foram pesquisadas 7 mil empresas de capital fechado em 36 países.Os resultados deste estudo internacional, realizado pela empresa de auditoria e consultoria Grant Thornton International, serão divulgados amanhã (5) em Londres.De acordo com o estudo, em 2008 o índice de otimismo no mundo todo caiu 56% em relação ao ano anterior, passando de +40% para -16%. O índice de confiança entre as empresas brasileiras é de +50%, o que coloca o País entre o quarto mais confiante do mundo, atrás da Índia (+83%), Botswana (+81%) e Filipinas (+65%) Os países em que as empresas estão mais pessimistas com o atual cenário econômico são Japão (-85%) e Espanha (-65%).Em termos de regiões globais, a União Européia aparece como a mais pessimista (-38%). A América Latina registrou +11% e a Ásia,+39%. Apesar de positivos, estes índices são inferiores aos registrados em 2007.Há ainda localidades onde a mudança de humor foi drástica. Caso de Hong Kong, que saiu de um índice de otimismo de +81% em 2007 para -49% em 2008 - a forte presença do setor financeiro em Hong Kon, duramente afetado pela crise econômica, explica a queda na confiança dos empresários da região. O estudo sobre índice de confiança das empresas de capital fechado é realizado pela empresa de auditoria desde 2003."A pesquisa mostra uma clara polarização. De um lado, os emergentes mais otimistas e de outro, os países ricos muito menos confiantes", diz Mauro Terepins, presidente da Terco Grant Thornton, subsidiária no Brasil da Grant Thornton International. "Os Estados Unidos, por exemplo, mostram um índice de -34% de pessimismo, enquanto a China mostra +30% de confiança" exemplifica.Uma possível explicação para o otimismo dos empresários nos países emergentes é o fato de que, enquanto os países ricos se preparam para atravessar um período doloroso de crise, com ajustes de custos e onda de demissões, além da falta de confiança dos próprios consumidores, as empresas dos países emergentes olham para as oportunidades existentes no mercado doméstico, ainda amortecido pelo crescimento econômico registrado nos trimestres anteriores ao agravamento da crise financeira global.No caso brasileiro, aponta, fatores como o crescimento econômico registrado no País nos últimos anos, a estabilidade da moeda e a solidez das empresas privadas e do sistema bancário do País dão sustentação ao otimismo das empresas consultadas pelo estudo. Além disso, a pesquisa não leva em conta a percepção das companhias de capital aberto, que amargaram maiores perdas de valor de mercado com a volatilidade do mercado de capitais.DEMANDAUm consenso entre empresários do mundo todo pôde ser levantado pela pesquisa: 33 dos 36 países ouvidos identificaram que o fator que mais causa apreensão é a queda na demanda. Em segundo lugar, vem a escassez do crédito. "Isso mostra claramente como é importante criar medidas para impulsionar o consumo interno e movimentar a economia" diz Terepins.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Ministério Público e investigação criminal

Jornal do Commercio –Direito & Justiça – 29.12.08 – B-7
MP na investigação criminal
DA REDAÇÃO
O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer pela improcedência da ação direta de inconstitucionalidade (Adin), com pedido de liminar, proposta pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol-Brasil) contra disposições que tratam da atuação dos membros do Ministério Público na investigação criminal. A Adin tem como relator o ministro Ricardo Lewandowski, que, ao invés de analisar o pedido de liminar, decidiu que a matéria deverá ser examinada diretamente em seu mérito. Desde que a ação foi proposta, em 2006, diversas entidades representativas de policiais, magistrados e membros do Ministério Público foram admitidos ao processo como amici curiae (amigos da corte). No último dia 18, a Adepol-Brasil requereu que fosse requisitada a devolução dos autos pela Procuradoria Geral da República (PGR), que agora os devolveu com seu parecer.A Adepol alega a inconstitucionalidade dos artigos 7º, incisos I, II e III; 8º, incisos I, II, IV, V, VI, VII e IX; 38. I, II e III e 150, I, II e III, todos da Lei Complementar (LC) 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. A entidade impugna, também, o artigo 26, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.625/1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Por fim, pede que seja declarada a inconstitucionalidade total da Resolução 13/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que regulamenta a investigação criminal pelo Ministério Público (MP).A Adepol-Brasil argumenta que os poderes de investigação são atribuição exclusiva dos delegados de polícia e que, portanto, as normas atacadas afrontariam a Constituição Federal (CF), sobretudo os seus artigos 2º; 5º, incisos II, LIII e LIV; 22, inciso I; 24, inciso XI; 129, incisos I, II, VI , VII e VIII e 144, parágrafo 1º, incisos I, II e IV e parágrafo 4º.Consultado, o CNMP manifestou-se, preliminarmente, pelo não cabimento da Adin face à Resolução 13/06, observando que ela constitui mera reprodução de normas estabelecidas na legislação nacional (LC 75 e Lei 8.625/93). Portanto, não teria caráter autônomo para ser atacada em Adin.Igual manifestação foi colhida da Presidência da República e da Advocacia-Geral da União (AGU). No mérito, o CNMP sustentou que inexiste incongruência entre a direta realização de diligências por membros do MP, no âmbito da investigação criminal, e qualquer dispositivo constitucional. No mesmo sentido se manifestaram a Presidência da República (além do CNMP e do Congresso Nacional, o presidente da República é um dos requeridos na Adin) e a AGU. Eles se posicionaram a favor da possibilidade de o MP realizar investigação criminal, sem contaminar as investigações por sua participação na colheita pré-processual da prova. Em seu parecer, a PGR observa que não se pode confundir o conceito "polícia judiciária" com o de "investigação criminal". Segundo a Procuradoria, trata-se de conceitos próximos, mas distintos. Ela lembra que a Constituição Federal (CF), em seu artigo 144, parágrafo 1º, sem mencionar exclusividade de qualquer espécie, atribui à Polícia Federal a "investigação de determinadas infrações penais". Assim, não há como incluir, mesmo em termos léxicos, a investigação criminal dentro do conceito "polícia judiciária".Segundo a PGR, "as funções investigatórias do Ministério Público decorrem do sistema constitucional e, designadamente, da combinação dos incisos I, III, VIII e IX do artigo 129 da CF. A impossibilidade, em certas circunstâncias, de separar o caráter penal das repercussões civis dos ilícitos reforça esse poder ministerial".legitimidade. Ainda segundo a PGR, "o acertado entendimento de que o MP tem legitimidade para atuar na investigação criminal desenvolve, ademais, a teoria dos poderes implícitos - inherente powers - pacificada no direito americano, segundo a qual a concessão de uma função a determinado órgão ou instituição pela própria Constituição traz consigo, implicitamente, a concessão dos meios necessários à sua concretização. Esses meios foram devidamente reconhecidos pelo Poder Legislativo".Por fim, a PGR argumenta que "a tese da imparcialidade do MP que, segundo alguns, impediria sua atuação nas investigações criminais - porquanto contaminaria a formação da opinio delicti (fundadas suspeitas sobre a existência do delito) -, destoa completamente da visão do processo penal constitucional".Segundo a PGR, "este raciocínio ignora que a possibilidade de investigação criminal pelo MP leva em consideração uma fórmula institucional, dentro da qual - não há razão para se pensar de outra forma - está envolvida uma instituição pública com conceitos e padrões de atuação bem fixados".A possibilidade de o Ministério Público participar de investigação criminal é objeto de diversas Adins e de um Inquérito em tramitação no STF e ainda não tem pronunciamento oficial da Corte. Ainda sem julgamento no STF sobre o assunto estão Adins propostas pelo Partido Liberal (PL) em 2003; duas ajuizadas pela Adepol-Brasil no Distrito Federal e em Minas Gerais, ambas em 2004; uma proposta pela PGR em Rondônia, naquele mesmo ano. Tramitam, ainda, no STF, Adins ajuizadas pela Adepol no Rio Grande do Sul em 2004; outras três propostas por seccionais da Adepol em várias estados; e, por fim, o Inquérito 1968, proposto pelo Ministério Público Federal no DF em 2003.O assunto divide a jurisprudência. Basicamente, a divergência é entre uma corrente que defende fortemente a exclusividade de atribuições e recusa a atuação direta dos membros do MP na investigação criminal, e outra, que defende essa possibilidade, argumentando que ela representa um reforço saudável na estrutura do sistema.

MP das filantrópicas

Jornal do Commercio - País - 29.12.08 -A-8

Brechas abertas pela MP da Filantropia
Alessandra Mello
Do Estado de Minas

O Senado devolveu para o governo federal a polêmica medida provisória da Filantropia (MP 446), editada há cerca de um mês, que anistia pelo menos 928 entidades interessadas em obter ou renovar o certificado de assistência social. O documento reconhece oficialmente a atuação sem fins lucrativos para garantia de isenção de impostos federais. Apesar de seu destino incerto, a medida continua em vigor, beneficiando, só em Minas Gerais, pelo menos 27 instituições, algumas ligadas a políticos e a maioria delas com atuação na área de educação. A decisão só deve sair em março, quando a MP da filantropia caduca. Até lá, a expectativa é que o impasse em torno da constitucionalidade dessa iniciativa do Executivo seja resolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O Ministério Público Federal (MPF) contesta a validade da MP da Filantropia e pede que ela seja anulada. A medida chegou ao Congresso em 6 de novembro e deveria ser analisada até março, quando perde a validade. O governo desistiu de reenviar a MP ao Congresso e encaminhou ao Senado um projeto de lei para substituir o texto, mas, se fosse tramitar normalmente, as chances de a MP ser aprovada não seriam pequenas, já que muitas das entidades na expectativa de serem beneficiadas têm relações com políticos de todo o País. Caso da Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura, que administra as faculdades da família do senador Wellington Oliveira (PMDB), e da Fundação José Bonifácio Lafayette Andrada, comandada pela família do deputado federal Bonifácio Andrada (PSDB). O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que até a edição da MP era o responsável por analisar os processos de emissão do certificado de filantropia, não dá informações sobre nenhum dos processos que poderão ser beneficiados pelo perdão fiscal. Informou apenas, por meio da assessoria de Comunicação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que os casos parados no conselho estão em análise e serão encaminhados aos respectivos ministérios para a verificação. É que além de anistiar todas as entidades com pendências no CNAS - a maioria delas com recursos contra a negativa do conselho em expedir o certificado de filantropia -, a MP também determinou que cada ministério fique responsável por analisar os pedidos de reconhecimento de entidades de assistência social.Força-tarefa. A justificativa oficial é que essa mudança na norma vai agilizar a tramitação dos 928 processos. Todos eles foram alvo de uma força-tarefa proposta pelo governo federal em julho, para analisar os casos pendentes do conselho. A intenção do mutirão, criada por decreto, era analisar os processos pendentes e depois passar os relatórios para que o Ministério da Previdência Social desse a palavra, já que as isenções das entidades são na área da contribuição patronal ao INSS. Quase quatro meses depois, nenhum deles foi despachado definitivamente. Se o impasse continuar, todos os processos contra essas entidades poderão perder a validade, já que a Receita Federal encurtou o prazo para que as dívidas da Previdência sejam cobradas na Justiça. Como o governo federal não sabe o que vai acontecer, um projeto de lei já foi enviado ao Senado para substituir o texto da MP da Filantropia, maliciosamente apelidada pela oposição de "pilantropia". A intenção era votá-lo até o fim deste ano, o que não ocorreu. Prevista para 17 de dezembro, a votação do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado foi adiada e a proposta só volta a tramitar na Casa ao fim do recesso parlamentar.Pelo novo texto do governo, as instituições filantrópicas sem qualquer problema terão os certificados provisórios de funcionamento renovados pelos ministérios aos quais estão ligadas. As instituições com pendências de ordem fiscal ou jurídica terão de recorrer caso a decisão final seja de não conceder a certificação. Nestes casos, enquanto o recurso não for analisado, a Receita Federal lançará os débitos pendentes, que ficarão suspensos, sendo anulados ou cobrados quando o ministério julgar os pedidos, ao contrário do que previa a medida provisória devolvida, que renovava automaticamente certificados de entidades filantrópicas, inclusive daquelas suspeitas de fraudes.A reportagem tentou falar com o senador Wellington Oliveira (PMDB) e com o deputado federal Bonifácio Andrada (PSDB), mas não conseguiu contato com os políticos.

Polêmica no Congresso
A medida provisória que modifica as regras para concessão de certificados de filantropia e renova automaticamente as licenças pendentes no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) foi recebida pelo Congresso Nacional no dia 7 de novembro. A discussão do tema no Senado criou uma polêmica sobre a validade de uma MP que, em termos práticos, anistia entidades ameaçadas de perderem os certificados. O texto provocou protestos porque renovou, de uma só vez, a permissão de funcionamento para mais de duas mil entidades beneficentes, mesmo daquelas que teriam cometido irregularidades. Mas o governo alega que a MP foi necessária para prorrogar o prazo de cinco anos estabelecido para a prescrição das dívidas tributárias das entidades, cobradas pela Receita Federal, porque o CNAS não conseguiria analisar os recursos em tempo hábil diante do volume acumulado. O prazo vence no dia 31 de dezembro.Em função da polêmica, no dia 19 de novembro, o presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), devolveu a MP das Filantrópicas para o governo com o argumento de que a MP não obedecia aos critérios de urgência e relevância. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), apresentou um recurso na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) questionando a legalidade da devolução da MP. Ainda não há parecer para a consulta. A MP, portanto, continua em vigor. (AM)

Tendências da responsabilidade civil

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 29.12.08 - E2

Novos paradigmas da responsabilidade civil
Sílvio de Salvo Venosa

Há dois campos no direito civil que sofrem transformações mais acentuadas no fim do século XX e início deste século: o da responsabilidade civil e o da família. O direito de família transformou-se principalmente entre nós após a Constituição Federal de 1988, não tendo o Código Civil de 2002 dado uma resposta à altura dos anseios sociais. A doutrina e a jurisprudência vêm suprindo as omissões legislativas com o maior empenho.

Por outro lado, na responsabilidade civil o mais recente diploma civil introduziu disposições que alteram paradigmas do passado na esfera do estatuto de 1916, como quase dogmas. Assim, podem ser apontados com maior ênfase os textos dos artigos 927 e seu parágrafo único, 928, 931, 936, 944 e seu parágrafo único e 945. Aqui tecemos algumas considerações sobre o parágrafo do artigo 927.
Ao se analisar a teoria do risco - mais exatamente o chamado risco criado - nessa fase de responsabilidade civil de pós-modernidade, o que se leva em conta é a potencialidade de ocasionar danos, a atividade ou conduta do agente que resulta, por si só, na exposição a um perigo, noção introduzida pelo artigo 2.050 do Código Civil italiano de 1942. Leva-se em conta o perigo da atividade do causador do dano por sua natureza e pela natureza dos meios adotados. Muitos dos novos princípios contratuais e de responsabilidade inseridos no Código Civil de 2002 já figuravam como princípios expressos ou implícitos no Código de Defesa do Consumidor.
A teoria da responsabilidade objetiva bem demonstra o avanço da responsabilidade civil nos séculos XIX e XX. Foram repensados e reestruturados muitos dogmas a partir da noção de que só havia responsabilidade com culpa. O âmbito da responsabilidade sem culpa aumenta significativamente em vários segmentos dos fatos sociais. Tanto assim é que culmina com a amplitude permitida pelo parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".
Na responsabilidade objetiva, há, em princípio, uma pulverização do dever de indenizar por um número amplo de pessoas. Contudo, o princípio gravitador da responsabilidade extracontratual no Código Civil ainda é o da responsabilidade subjetiva, ou seja, da responsabilidade com culpa, pois essa também é a regra geral traduzida na legislação em vigor, no caput do artigo 927 do código. Em situações excepcionais o juiz poderá concluir pela responsabilidade objetiva no caso que examina. No entanto, advirta-se, o dispositivo questionado explicita que somente pode ser definida como objetiva a responsabilidade do causador do dano quando este decorrer de "atividade normalmente desenvolvida" por ele. O juiz deve avaliar, no caso concreto, a atividade costumeira do ofensor e não uma atividade esporádica ou eventual, qual seja, aquela que, por um momento ou por uma circunstância, possa ser um ato de risco. Não sendo levado em conta esse aspecto, poder-se-á transformar em regra o que o legislador colocou como exceção.
A noção clássica de culpa foi sofrendo, no curso da História, constantes temperamentos em sua aplicação. Nesse sentido, as primeiras atenuações em relação ao sentido clássico de culpa traduziram-se nas "presunções de culpa" e em mitigações no rigor da apreciação da culpa em si. Os tribunais foram percebendo que a noção estrita de culpa, se aplicada rigorosamente, deixaria inúmeras situações de prejuízo sem ressarcimento. Não se confunde a presunção de culpa, onde culpa deve existir apenas se invertendo os ônus da prova, com a responsabilidade sem culpa ou objetiva, na qual se dispensa a culpa para o dever de indenizar. De qualquer forma, as presunções de culpa foram um importante degrau para se chegar à responsabilidade objetiva.
A teoria do risco aparece na história do direito, portanto, com base no exercício de uma atividade, dentro da idéia de que quem exerce determinada atividade e tira proveito direto ou indireto dela responde pelos danos que ela causar, independentemente de culpa sua ou de prepostos. O princípio da responsabilidade sem culpa ancora-se em um princípio de eqüidade: quem aufere os cômodos de uma situação deve também suportar os incômodos. O exercício de uma atividade que possa representar um risco obriga por si só a indenizar os danos causados por ela. No direito mais recente, a teoria da responsabilidade objetiva é justificada tanto sob o prisma do risco como sob o prisma do dano. Não se indenizará unicamente porque há um risco, mas porque há um dano e, nesse último aspecto, em muitas ocasiões dispensa-se o exame do risco.
A insuficiência da fundamentação da teoria da culpabilidade levou à criação da teoria do risco, a qual sustenta que o sujeito é responsável por riscos ou perigos que sua atuação promove, ainda que coloque toda diligência para evitar o dano. Trata-se da denominada teoria do risco criado ou do risco benefício. O sujeito obtém vantagens ou benefícios, e em razão dessa atividade deve indenizar os danos que ocasiona. Cuida-se da responsabilidade sem culpa em inúmeras situações nas quais sua comprovação inviabilizaria a indenização para parte presumivelmente mais vulnerável. A legislação dos acidentes do trabalho é um exemplo emblemático desse aspecto.
A inovação presente no parágrafo sob exame requer extrema cautela na sua aplicação. Por esse dispositivo, a responsabilidade objetiva aplica-se, além dos casos descritos em lei, também "quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". Por esse dispositivo, o julgador poderá definir como objetiva a responsabilidade do causador do dano no caso concreto. Esse alargamento da noção de responsabilidade constitui realmente a maior inovação do novo Código Civil em matéria de responsabilidade e requererá, sem dúvida, um cuidado extremo dos tribunais. É discutível a conveniência de uma norma genérica nesse sentido. Melhor seria que se mantivesse nas rédeas do legislador a definição da teoria do risco. As dificuldades começam pela compreensão da atividade de risco. Em princípio, toda atividade gera um risco. É fato, por outro lado, que o risco por si só não gera o dever de indenizar se não houver dano. Por outro lado, se dano houver, deve ser certo e avaliável.
De qualquer modo, alargar o campo da responsabilidade objetiva com uma norma aberta, sem um critério concreto, causa extrema instabilidade e pode ser colocada a serviços de espíritos insinceros, aventureiros ou toscos. Com isso há fundado receio de que os tribunais realcem o elemento dano, preterindo a constatação de culpa de forma geral, deixando uma das partes simplesmente sem defesa.
A jurisprudência ainda é inicial nos primeiros anos de vigência do Código Civil de 2002. Ainda levaremos algum tempo para maior amadurecimento e estabilidade dos julgados.
Sílvio de Salvo Venosa é autor de várias obras de direito civil, consultor e parecerista nessa área

Tendências da responsabilidade civil

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 29.12.08 - E2
Novos paradigmas da responsabilidade civil
Sílvio de Salvo Venosa

Há dois campos no direito civil que sofrem transformações mais acentuadas no fim do século XX e início deste século: o da responsabilidade civil e o da família. O direito de família transformou-se principalmente entre nós após a Constituição Federal de 1988, não tendo o Código Civil de 2002 dado uma resposta à altura dos anseios sociais. A doutrina e a jurisprudência vêm suprindo as omissões legislativas com o maior empenho.

Por outro lado, na responsabilidade civil o mais recente diploma civil introduziu disposições que alteram paradigmas do passado na esfera do estatuto de 1916, como quase dogmas. Assim, podem ser apontados com maior ênfase os textos dos artigos 927 e seu parágrafo único, 928, 931, 936, 944 e seu parágrafo único e 945. Aqui tecemos algumas considerações sobre o parágrafo do artigo 927.
Ao se analisar a teoria do risco - mais exatamente o chamado risco criado - nessa fase de responsabilidade civil de pós-modernidade, o que se leva em conta é a potencialidade de ocasionar danos, a atividade ou conduta do agente que resulta, por si só, na exposição a um perigo, noção introduzida pelo artigo 2.050 do Código Civil italiano de 1942. Leva-se em conta o perigo da atividade do causador do dano por sua natureza e pela natureza dos meios adotados. Muitos dos novos princípios contratuais e de responsabilidade inseridos no Código Civil de 2002 já figuravam como princípios expressos ou implícitos no Código de Defesa do Consumidor.
A teoria da responsabilidade objetiva bem demonstra o avanço da responsabilidade civil nos séculos XIX e XX. Foram repensados e reestruturados muitos dogmas a partir da noção de que só havia responsabilidade com culpa. O âmbito da responsabilidade sem culpa aumenta significativamente em vários segmentos dos fatos sociais. Tanto assim é que culmina com a amplitude permitida pelo parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".
Na responsabilidade objetiva, há, em princípio, uma pulverização do dever de indenizar por um número amplo de pessoas. Contudo, o princípio gravitador da responsabilidade extracontratual no Código Civil ainda é o da responsabilidade subjetiva, ou seja, da responsabilidade com culpa, pois essa também é a regra geral traduzida na legislação em vigor, no caput do artigo 927 do código. Em situações excepcionais o juiz poderá concluir pela responsabilidade objetiva no caso que examina. No entanto, advirta-se, o dispositivo questionado explicita que somente pode ser definida como objetiva a responsabilidade do causador do dano quando este decorrer de "atividade normalmente desenvolvida" por ele. O juiz deve avaliar, no caso concreto, a atividade costumeira do ofensor e não uma atividade esporádica ou eventual, qual seja, aquela que, por um momento ou por uma circunstância, possa ser um ato de risco. Não sendo levado em conta esse aspecto, poder-se-á transformar em regra o que o legislador colocou como exceção.
A noção clássica de culpa foi sofrendo, no curso da História, constantes temperamentos em sua aplicação. Nesse sentido, as primeiras atenuações em relação ao sentido clássico de culpa traduziram-se nas "presunções de culpa" e em mitigações no rigor da apreciação da culpa em si. Os tribunais foram percebendo que a noção estrita de culpa, se aplicada rigorosamente, deixaria inúmeras situações de prejuízo sem ressarcimento. Não se confunde a presunção de culpa, onde culpa deve existir apenas se invertendo os ônus da prova, com a responsabilidade sem culpa ou objetiva, na qual se dispensa a culpa para o dever de indenizar. De qualquer forma, as presunções de culpa foram um importante degrau para se chegar à responsabilidade objetiva.
A teoria do risco aparece na história do direito, portanto, com base no exercício de uma atividade, dentro da idéia de que quem exerce determinada atividade e tira proveito direto ou indireto dela responde pelos danos que ela causar, independentemente de culpa sua ou de prepostos. O princípio da responsabilidade sem culpa ancora-se em um princípio de eqüidade: quem aufere os cômodos de uma situação deve também suportar os incômodos. O exercício de uma atividade que possa representar um risco obriga por si só a indenizar os danos causados por ela. No direito mais recente, a teoria da responsabilidade objetiva é justificada tanto sob o prisma do risco como sob o prisma do dano. Não se indenizará unicamente porque há um risco, mas porque há um dano e, nesse último aspecto, em muitas ocasiões dispensa-se o exame do risco.
A insuficiência da fundamentação da teoria da culpabilidade levou à criação da teoria do risco, a qual sustenta que o sujeito é responsável por riscos ou perigos que sua atuação promove, ainda que coloque toda diligência para evitar o dano. Trata-se da denominada teoria do risco criado ou do risco benefício. O sujeito obtém vantagens ou benefícios, e em razão dessa atividade deve indenizar os danos que ocasiona. Cuida-se da responsabilidade sem culpa em inúmeras situações nas quais sua comprovação inviabilizaria a indenização para parte presumivelmente mais vulnerável. A legislação dos acidentes do trabalho é um exemplo emblemático desse aspecto.
A inovação presente no parágrafo sob exame requer extrema cautela na sua aplicação. Por esse dispositivo, a responsabilidade objetiva aplica-se, além dos casos descritos em lei, também "quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". Por esse dispositivo, o julgador poderá definir como objetiva a responsabilidade do causador do dano no caso concreto. Esse alargamento da noção de responsabilidade constitui realmente a maior inovação do novo Código Civil em matéria de responsabilidade e requererá, sem dúvida, um cuidado extremo dos tribunais. É discutível a conveniência de uma norma genérica nesse sentido. Melhor seria que se mantivesse nas rédeas do legislador a definição da teoria do risco. As dificuldades começam pela compreensão da atividade de risco. Em princípio, toda atividade gera um risco. É fato, por outro lado, que o risco por si só não gera o dever de indenizar se não houver dano. Por outro lado, se dano houver, deve ser certo e avaliável.
De qualquer modo, alargar o campo da responsabilidade objetiva com uma norma aberta, sem um critério concreto, causa extrema instabilidade e pode ser colocada a serviços de espíritos insinceros, aventureiros ou toscos. Com isso há fundado receio de que os tribunais realcem o elemento dano, preterindo a constatação de culpa de forma geral, deixando uma das partes simplesmente sem defesa.
A jurisprudência ainda é inicial nos primeiros anos de vigência do Código Civil de 2002. Ainda levaremos algum tempo para maior amadurecimento e estabilidade dos julgados.
Sílvio de Salvo Venosa é autor de várias obras de direito civil, consultor e parecerista nessa área

Registro da alienação fiduciária de veículos

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 26, 27 e 28.12.08 - E3

A alienação fiduciária de veículos e os cartórios
Glauber Moreno Talavera
Os sortilégios e a controvertida mística do clérigo russo Rasputin, se convertidos para as letras jurídicas, certamente criariam um mosaico de passes de ilusionismo retórico, malabarismos literários, circunlóquios e piruetas verbais que favoreceriam a interpretação equivocada que atualmente tem corrompido a essência da norma contida no parágrafo 1º do artigo 1.361 do Código Civil. Ao prever que a propriedade fiduciária constitui-se com o registro do contrato no registro de títulos e documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, o normativo referido evidenciou que o registro haverá de ser realizado em um ou em outro e não em um e em outro órgão, ressaltando a aplicação do disjuntivo e não do conectivo, lógica essa que fora reiterada expressamente pelo artigo 27 da recém-aprovada Lei de Consórcios - a Lei nº 11.795, de 2008 -, cujo termo inicial de vigência será 6 de fevereiro de 2009.

Em outras palavras, o registro dos contratos de alienação em garantia de veículos na repartição competente para o licenciamento torna despiciendo qualquer outro registro. Todavia, embora simples a interpretação da norma, é certo que a hipertrofia do mercado brasileiro de automotores robustece a tentativa de subverter a essência da lei, uma vez que mais de dois terços do total de veículos emplacados neste ano foram adquiridos mediante financiamento, via de regra garantido pelo negócio fiduciário acessório que teve como objeto, por meio de condição resolutiva, a transitória alienação do próprio veículo pelo consumidor adquirente - devedor fiduciante - à instituição que financiou sua aquisição - credora fiduciária - até quitação das prestações e a conseqüente liquidação do contrato.
Sob o argumento de que a disjunção, que enaltece a necessidade de registro do contrato de alienação fiduciária de veículos apenas na repartição competente para o licenciamento, decorre de um singelo erro de redação do parágrafo 1º do artigo 1.361 do Código Civil - que utilizou "ou" e não "e", como ensejado pelos que esposam esse entendimento -, expedem-se aqui e acolá normativos em que se entrevê a arbitrariedade das próprias razões de seus conceptores, que passam ao largo da complexidade do processo legislativo que culminou com a promulgação do monumento que é o Código Civil brasileiro e, talvez em razão disso, enveredem caminhos transversos para retocar o que entendem corrompido.
Vale ressaltar que, esposando o mesmo propósito de corrigir a redação do do parágrafo 1º do artigo 1.361 do Código Civil, foram apresentados pelo à época deputado Ricardo Fiúza o Projeto de Lei nº 6.960 e o Projeto de Lei nº 7.312, ambos de 2002, que, tendo recebido parecer desfavorável do então deputado Luiz Antonio Fleury Filho, foram arquivados. Afora os referidos, há outros inspirados pela mesma ordem de idéias - tal qual o Projeto de Lei nº 3.351, de 2004, e o Projeto de Lei nº 309, de 2007 - que, à míngua de uma engenharia argumentativa melhor sedimentada, seguem reproduzindo o notadamente combalido mantra do erro de redação.
Sem olvidar a inteligência e a interpretação sistêmica a que se submete o artigo 236 da Constituição Federal, ao conjugar o texto do parágrafo 1º do artigo 1.361 do Código Civil com as disposições dos artigos 127 a 131 da Lei de Registros Públicos - a Lei nº 6.015, de 1973 -, que versam especificamente sobre as atribuições do registro de títulos e documentos, conclui-se que o Código Civil, ao estabelecer no ano de 2002 que é bastante o registro do contrato de alienação fiduciária de veículos na repartição competente para o licenciamento, revogou tacitamente a previsão contrária que, em vigor desde 1973, disciplinou o regime dos serviços concernentes aos registros públicos. Na mesma linha de entendimento, o Supremo Tribunal Federal (STF), na decisão unânime proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 2.150-8, considerou constitucional o registro da alienação fiduciária de veículos diretamente nas repartições de trânsito, dispensada a atuação dos cartórios.
Integrando o arcabouço interpretativo que destoa totalmente do que está previsto de forma expressa no Código Civil, tem-se também a alegação de que o registro do contrato de alienação fiduciária de veículos nos cartórios de títulos e documentos tem o condão de reduzir o potencial de fraudes na expedição do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículos (CRLV), uma vez que tais inconsistências são atribuídas à falta de estrutura dos Detrans para prestar tal serviço e dar publicidade ao ato. Sobre a suposta segurança dos procedimentos de registro, vale trazer à lembrança o voto proferido pelo ministro Athos Gusmão Carneiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 1.774-0, de São Paulo, que concluiu que "a publicidade que o registro de títulos e documentos proporciona não supera os limites da ficção, pela quase impossibilidade total que terceiros têm na consulta a esses registros, para verificar a situação do bem".
Suplantando os erros dessa dinâmica, a maioria dos que esposavam a tese da obrigatoriedade dos registros dos contratos em cartório sucumbiu diante de decisões judiciais que retiraram, liminarmente ou no mérito, a eficácia dos normativos expedidos em desconformidade com o que preceitua o parágrafo 1º do artigo 1.361 do Código Civil.
Atualmente, como expressão natural da racionalidade que inspira o contínuo aprimoramento da interpretação das normas, é de concluir-se que a atecnia da exigência do duplo registro continuará sendo paulatinamente apagada e certamente a última sonata dos poucos que ainda insistem nessa ilegalidade está em um porvir muito próximo, como ocorre na clássica "Sinfonia dos adeuses", de Haydn, em que cada músico, quando termina sua partitura, apaga a vela que ilumina seu atril e simplesmente vai embora.
Glauber Moreno Talavera Glauber Moreno Talavera é advogado, mestre e doutor em direito civil e doutorando em direito processual civil pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e professor das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU)

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Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar