quarta-feira, 23 de março de 2016

Mais sobre a questionada nomeação de Eugênio Aragão para o Ministério da Justiça

Consultor Jurídico
 
22 de março de 2016, 19h51
Por Sérgio Rodas
 
Procurador da República só pode virar ministro ou secretário de Estado se tiver ingressado na carreira antes da Constituição de 1988 e tiver manifestado sua preferência pelo regime antigo até 1995, ou seja, dois anos após a promulgação da Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/1993).
 
Essa é a conclusão a qual chegou o criminalista Eduardo Muylaert, sócio do Muylaert, Livingston e Kok Advocacia Criminal, em parecer encomendado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo. Seguindo esse raciocínio, o novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, não poderia ter se afastado do Ministério Público Federal para assumir o cargo. Isso porque não há provas de que optou pela regulação anterior, o que automaticamente o submeteria às proibições daqueles que viraram membros do órgão após a entrada em vigor da Carta Magna.
 
No documento, que será apresentado aos membros dessa entidade no dia 30 de março, o advogado foi questionado se membro do Ministério Público Federal que entrou na instituição antes da Constituição de 1988 poderia virar ministro.
 
A dúvida surgiu após a presidente Dilma Rousseff nomear Eugênio Aragão, que era vice-procurador-geral Eleitoral, para o comando do Ministério da Justiça. Como ele ingressou na carreira em 1987, o governo entende que ele tem o direito adquirido das vantagens da carreira na configuração anterior. Uma delas é ocupar cargos fora do MP, já que as constituições anteriores fundiam as funções do MP e da Advocacia-Geral da União num órgão só, pertencente ao Poder Executivo.
 
Graças a isso, a gestão Dilma afirma que Aragão não se enquadra na recente decisão do Supremo Tribunal Federal que proibiu promotores e procuradores da República e de Justiça de ocuparem cargos políticos no Executivo. Com essa decisão, a corte barrou a indicação do membro do MP da Bahia Wellington César Lima e Silva para o Ministério da Justiça, e ele optou por permanecer na carreira em vez de renunciar à função e ficar no governo.
 
No parecer, Muylaert destacou que a jurisprudência do STF entende que o membro do MP que assume cargo no Executivo fragiliza a instituição, que pode ser alvo de ações para favorecer os interesses de um certo grupo político. E isso diminui a independência dos integrantes desse órgão para agir com imparcialidade na fiscalização do poder público.
 
O criminalista aponta que, antes da Constituição de 1988, não havia vedação explícita à ocupação de ministérios e secretarias por membros do MP, “embora já fosse inconveniente”. Contudo, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias facultou aos procuradores da República a opção entre as regras do MPF e da AGU, e a Lei Orgânica do MP estabeleceu um prazo de dois anos para que essa escolha fosse feita. Com isso, Muylaert disse que o legislador deixou claro que os membros do MPU “não poderiam transitar entre carreiras diversas ou beneficiar-se de mais de um regime jurídico”.
 
Essa escolha, porém, teria que ser demonstrada “em um ato comissivo, e não omissivo”, destacou o advogado, citando entendimento do ministro Marco Aurélio no julgamento do RO 999. Embora o Supremo tenha afirmado que esse limite temporal não se aplicava aos membros de MPs estaduais, “em nenhum momento se admitiu que o prazo de dois anos não se aplicasse aos procuradores da República”, ressaltou o parecerista.
 
“Portanto, a conclusão é a de que um procurador da República só pode assumir funções de ministro ou secretário de Estado se atender a duas condições: ter ingressado na carreira antes da vigência da Constituição de 1988 e ter, no prazo de dois anos fixado na Lei Orgânica do Ministério Público, optado pelo regime antigo”, concluiu Eduardo Muylaert.
 
Ele também criticou as tentativas de permitir que um procurador da República que não fez sua opção entre carreiras até 1995 possa permanecer sob o regime antigo. “Querer invalidar, a esta altura, um dispositivo saudável da Lei Orgânica seria um contrassenso. Afinal, ninguém pode querer os benefícios de um regime sem suportar também os seus ônus. A recente ciranda de nomeações de membros do Ministério Público, seja estadual, já descartada, seja federal, esta ainda buscada pelo Poder Executivo, no momento em que a Procuradoria-Geral da República investiga vários integrantes do governo, mostra todos os inconvenientes dessa solução que a Constituição de 1988 quis banir.”
 
Além disso, essa “confusão de papéis enfraquece as instituições e cria indesejáveis conflitos”, opinou Muylaert. Isso porque o MP é uma “instituição una” e, sendo ministro, um membro dela provavelmente entrará em conflito com seu chefe, o procurador-geral da República. Além disso, o integrante do governo terá que agir como agente político, podendo entrar em contradição com atos que tenha exercido como membro do MP.
 
Por isso, o criminalista avalia que a Constituição acertou ao vetar a indicação de promotores e procuradores da República e de Justiça para cargos no Executivo e que as exceções da ADPF e da Lei Orgânica devem ser interpretadas restritivamente.
 
“Quando a lei exige uma opção no prazo de dois anos, que expirou em 1995, não se pode admitir que a opção seja feita a qualquer tempo, pois isto seria a própria negação da letra e do espírito da Lei Orgânica e da disposição constitucional, que, como seu nome o diz, é transitória, adaptada ao regime de transição, e não uma franquia para todo o sempre.”
 
Implicitamente, Eduardo Muylaert sustenta com o parecer que Eugênio Aragão não pode ser ministro da Justiça. A razão disso é que ele não optou expressamente pelo regime antigo até 1995, conforme apontado, na semana passada, pelo integrante do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) Carlos Frederico Santos.
 
Na sessão que o órgão aprovou o afastamento de Aragão para assumir a pasta, o conselheiro disse que, diante da ausência de provas dessa opção, ele automaticamente ficaria sob as regras da Constituição de 1988, que veda que membros do MP exerçam funções fora as institucionais e de magistério. No entanto, o CSMPF concluiu que, como ele tomou posse no cargo antes da carta, submetia-se às normas anteriores e poderia ser ministro da Justiça.
 
Ações do PPS
Com base no voto do conselheiro Carlos Frederico Santos, o PPS protocolou junto ao ministro do STF Gilmar Mendes, na quinta-feira (17/3), uma reclamação contra a posse de Eugênio Aragão no Ministério da Justiça. O partido alega que, embora Aragão tenha ingressado no MPF antes de 1988, submete-se às mesmas vedações aplicadas aos que entraram na carreira depois da promulgação da Constituição.
 
Assim, a legenda pede a concessão de liminar para que o procurador da República seja afastado imediatamente do cargo.
 
O PPS também impetrou mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça para impedir que Aragão substitua agentes da Polícia Federal, como disse ao jornal Folha de S.Paulo que faria se “cheirasse vazamento”.
 
Nesta terça (22/3), a ministra Assusete Magalhães deu 72 horas para o novo ministro e para a Advocacia-Geral da União se manifestarem sobre a ação. Com informações da Agência Brasil e da Assessoria de Imprensa do STJ.
 
 
Sérgio Rodas é repórter da revista Consultor Jurídico.
 
Revista Consultor Jurídico, 22 de março de 2016, 19h51

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