Valor Econômico – Empresas - 11/04/2016
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Recuperações judiciais avançam
nas fábricas de autopeças do país
Por Eduardo Laguna
A cada mês, quase duas
fabricantes de autopeças recorrem à Justiça na tentativa de escapar da falência
pelo instrumento da recuperação judicial. Foi esse o ritmo médio apurado entre
março do ano passado e fevereiro deste ano, 12 meses em que 22 empresas do
setor buscaram o expediente, ainda que nem sempre os requerimentos sejam
aceitos por juízes. De 2013 a 2014, 27 companhias fizeram o mesmo, o que
significa que 49 fornecedores de peças solicitaram recuperação judicial em
pouco mais de três anos, de acordo com a Serasa Experian. A lista aumenta à
medida que a crise das montadoras, destino de dois terços da produção, ganha
contornos "dramáticos" para usar um adjetivo empregado por
executivos dessa indústria. Dos pequenos fabricantes de estrutura familiar
que nos não raros casos de insolvência dependem do socorro de grandes clientes
para comprar matériasprimas a subsidiárias de multinacionais, forçadas,
muitas vezes, a captar dinheiro com as matrizes estrangeiras, um grupo
crescente de empresas sente a dificuldade de gerar caixa suficiente aos
compromissos de curto prazo quando minguam as encomendas numa indústria que usa
menos da metade de sua capacidade. Sufocadas, elas batem nas portas de bancos,
mas se deparam com um sistema financeiro seletivo. Sem crédito, caem em um, nem
sempre reversível, quadro de asfixia financeira. Desde 2013, quando o mercado
de automóveis inverteu a curva de nove anos seguidos de crescimento, 24
empresas de autopeças esgotaram todas as alternativas e tiveram falências
decretadas pela Justiça, ainda segundo a Serasa. "Os subsetores mais
dependentes das montadoras de veículos comerciais, que não exportam e
participam pouco do mercado de reposição são os que apresentam maior estresse
financeiro no momento", diz Fernando Nogueira, diretor da TCP Latam,
butique de investimento e assessoria financeira que viu na crise a oportunidade
de fazer dinheiro com a reestruturação de empresas de autopeças. Pode não ser a
"quebradeira" que alguns esperavam após o consumo de veículos
retroceder uma década. Todos termômetros que medem a saúde financeira na cadeia
de suprimentos indicam, porém, acelerada deterioração. De um ritmo anual
estabilizado entre cinco e seis companhias, o número de recuperações judiciais
último recurso para escapar da bancarrota pedidas por fabricantes de
componentes automotivos chegou a 11 em 2013, saltando para 16 e 15 nos dois
anos seguintes, respectivamente (veja gráfico acima). Por seus primeiros
registros, 2016 mostra potencial de marcar um indesejado novo pico na
estatística. Só entre janeiro e fevereiro, o total que partiu para esse caminho
sete já é quase metade do resultado final de 2015. A Arteb, tradicional
fabricante de faróis com mais de mil trabalhadores em São Bernardo do Campo, no
ABC paulista, é um dos casos recentes dessa lista. Além da queda de 40% nas
vendas, a companhia citou dificuldades do aumento de custo e da falta de
crédito ao ter, no mês passado, o pedido de recuperação aceito pela Justiça.
Desde o início do ano, também entraram em recuperação judicial a Rayton, uma
fabricante de peças de transmissão da Grande São Paulo, e a Wetzel, de peças
fundidas e usinadas em ferro e alumínio, com sede em Joinville (SC). Em geral,
filiais de multinacionais não chegam a esse ponto porque, pior que seja a
situação, podem contar com o caixa dos controladores no exterior, reforçado
pelos resultados históricos nos Estados Unidos, onde as vendas de carros
bateram recorde em 2015, e pela recuperação do mercado europeu. Só no ano
passado, US$ 5,52 bilhões entraram no país em empréstimos corporativos a
controladas da indústria automobilística, incluindo montadoras. Ainda assim, as
grandes multinacionais também tiveram que enxugar estruturas e lançar programas
de reestruturação para atravessar a tormenta. Unindose a um grupo formado por
sistemistas automotivos como a Delphi, que já fechou três unidades no país, a
também americana Eaton vai desativar em junho sua fábrica em Guarulhos (SP),
mesma cidade onde a gaúcha Randon encerrou a produção de semirreboques.
Fornecedora, entre outros produtos, de parachoques e painéis de instrumentos,
a Plascar, controlada por dois fundos de investimento americanos, já havia
fechado em 2014 as fábricas de Pindamonhangaba e Campinas, ambas cidades do
interior paulista, e agora renegocia contratos com bancos e busca um novo sócio
para o negócio. Na base da cadeia, pequenos fornecedores ganham sobrevida com a
liquidez emergencial dada por grandes clientes: multinacionais sistemistas e
montadoras, que, para garantir o fornecimento das peças, antecipam recebíveis e
chegam a comprar insumos usados na produção dos componentes. "Temos um
grupo de risco de mais de 40 fornecedores. São empresas em dificuldade
financeira ou que perderam grande volume de venda. Antes, não eram mais do que
três nessa situação", diz Luis Afonso Pasquotto, presidente da fabricante
de motores Cummins.