terça-feira, 26 de agosto de 2014

Bancos suíços publicam demonstrações financeiras

Jornal Valor Econômico - 25.08.2012 Bancos suíços rompem silêncio de dois séculos Por Giles Broom | Bloomberg Valentin Flauraud/BloombergSob pressão de agências fiscalizadoras internacionais, bancos suíços, como Pictet, assumem nova política, num momento em que seu tradicional sigilo está em xeque Dois dos maiores bancos suíços de capital fechado estão prestes a publicar seus resultados, após dois séculos de sigilo. O Cie Lombard, Odier SCA, banco com sede em Genebra criado em 1796, deverá publicar suas demonstrações financeiras em 28 de agosto, segundo um funcionário da empresa que pediu para não ser identificado devido à política do banco. E o Pictet & Cie Group SCA, terceiro maior gestor de ativos e fortunas suíço depois do UBS AG e do Credit Suisse Group AG, também está prestes a divulgar um relatório de resultados neste mês. Sob pressão de agências fiscalizadoras internacionais, em janeiro as duas empresas abandonaram suas centenárias estruturas societárias, o que implicou na exigência de reportar publicamente seus resultados financeiros. Os bancos estão assumindo a nova política num momento em que o setor de private banking suíço e seu tradicional sigilo estão sob um crivo sem precedentes por parte das autoridades fiscais americanas e europeias. "Será fascinante ver os resultados do Pictet e do Lombard Odier após terem mantido seus números sob sigilo por tanto tempo", disse Tim Dawson, analista da Helvea SA, em Genebra, que acompanha o desempenho de companhias financeiras de capital aberto na Suíça. "Esses caras estão na vanguarda de uma adaptação à mudança de ambiente no setor bancário suíço." Embora o Pictet e o Lombard Odier não tenham especificado quais números publicarão em seus balanços e provavelmente produzirão uma grande massa de informações sobre seu desempenho que serão úteis para analistas do mercado, investidores em gestores de ativos de capital aberto e para os próprios clientes dos bancos. Os bancos, tradicionalmente utilizados pelas famílias mais ricas do mundo para proteger suas fortunas, supervisionam cerca de US$ 630 bilhões para clientes privados e institucionais, segundo as empresas. Bancos em toda a Suíça estão buscando adaptar seus modelos de negócios a uma nova era de conformidade regulatória e fiscal em que as autoridades tributárias governamentais passarão a exigir que eles divulguem detalhes sobre seus clientes privados e intercambiem informações através de fronteiras nacionais. Os novos requisitos legais passaram a exigir investimentos em infraestrutura tecnológica e margens mais estreitas, num momento em que a receita proveniente de serviços, como a execução de operações financeiras, transações e empréstimos, secaram após a crise financeira, em meio a uma demanda moderada por investimentos de risco e juros baixos. O Pictet é um entre uma dúzia de bancos suíços sob investigação pelo Departamento de Justiça americano por ter, supostamente, ajudado cidadãos americanos a driblar o pagamento de impostos, ao passo que o Lombard Odier passou a participar de um programa de divulgação voluntário nos Estados Unidos, juntamente com mais de cem outros bancos no país. Mais da metade dos negócios do Pictet agora provém de clientes institucionais, em vez de ser provenientes de pessoas ricas, que originalmente contribuíram para que o banco de controle familiar criado em 1805 se transformasse no maior banco privado de Genebra. O banco ganhou sua primeira conta de fundo de pensão em 1967. O Lombard Odier incrementou o volume de ativos gerenciados para clientes institucionais para US$ 47,7 bilhões no fim de 2013, contra US$ 25,2 bilhões há cinco anos, à medida que os mercados globais recuperaram-se da crise financeira, segundo a empresa. O Lombard Odier é gestor de cerca de US$ 200 bilhões em nome de clientes privados e institucionais em todo o mundo, inclusive de ativos mantidos sob custódia. Neste mês, o banco contratou Nancy Everett, que dirigia os negócios de gestão fiduciária no BlackRock Inc de 2011 a 2013, para ajudar a montar negócios entre gestores financeiros americanos. O banco está também enfatizando suas credenciais como empresa moderna, com experiência em tecnologia através do marketing de software proprietário e por meio de sua crescente iniciativa de networking online, disponibilizada para gestores de recursos independentes e operadoras familiares, que começou em 2009. Descrever seus negócios de forma mais detalhada e pública poderá ajudar tais bancos a comercializar seus serviços, de acordo com Francesco Lurati, professor de comunicação corporativa na Universidade de Lugano, Suíça. "No passado, sigilo e privacidade eram o único trunfo mercadológico", disse Lurati em entrevista por telefone. "Hoje, eles provavelmente precisam comunicar seus principais atributos fundamentais. Eles precisam assegurar que as pessoas compreendam suas competências e que eles têm condições de fazer um trabalho melhor do que os concorrentes." No ano passado, os dois bancos anunciaram que iriam abandonar estruturas que implicavam que empresas parceiras assumissem responsabilidade ilimitada por prejuízos. A lei suíça agora os obriga a publicar demonstrações financeiras que contêm informações sobre seus balanços e lucros. Os relatórios semestrais precisam ser publicados no prazo de dois meses após o fim de cada período contábil relevante de seis meses. As duas empresas também nunca revelaram a rentabilidade de sua mais antiga prestação de serviços financeiros a clientes privados, em contraposição a incumbências de gestão de investimento, que cada vez mais desejam assumir em nome de clientes institucionais, como fundos de pensão ou serviços de custódia que prestam a outros bancos e a gestores de recursos. A Moody's Investors Service rebaixou sua perspectiva para o setor bancário suíço - de estável para negativa - em relatório de 31 de julho, que descreveu a rentabilidade e a eficiência como "em deterioração". A Moody's compila pontuações para 17 bancos, entre eles o Pictet.

Limites da sinistralidade nos reajustes de contratos

Jornal Valor Econômico - Legislação & TRibutos (Rio) - 25.08.2014 - E2 Sinistralidade e relação contratual Por Renata Vilhena Silva O conceito de sinistralidade é usado pelas operadoras de saúde como balizador na hora do reajuste de preços. A apuração dos últimos 12 meses da receita versus despesa indica se o contrato é financeiramente compensador para as partes, ou se o valor pago na mensalidade é justo e mantém a relação contratual equilibrada, considerando os sinistros ou as despesas geradas com aquele contrato. Quanto mais um grupo usa o plano de saúde, maior a sinistralidade e, consequentemente, maior o reajuste no ano seguinte. A configuração de abuso ocorre quando a cláusula, que consta da maioria dos contratos coletivos empresariais, passa a ser cobrada de forma incorreta para burlar os dispositivos legais previstos no Código Civil, no Código de Defesa do Consumidor e nas regras da própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Como todos os contratos preveem aumento por faixa etária, quando esse é aplicado não deve ser imputada, ainda, a cláusula de sinistralidade. Não se pode cobrar de um cliente dois aumentos anuais. Ou se cobra pela mudança de faixa ou pela sinistralidade. A fragilidade e ilegalidade do conceito é evidente se pensarmos que as operadoras, ao traçarem seus planos de negócio, já calculam uma margem de risco para sua atuação no mercado. De acordo com o artigo 757 do Código Civil, de 2002, não é permitida a transferência do risco que descaracteriza o contrato de seguro. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. As operadoras de saúde fingem que a lei não existe e a Agência Nacional de Saúde Suplementar finge que as fiscaliza Como as contas não são transparentes e os cálculos das taxas de uso nunca são mostrados, não há a comprovação de quitação das mesmas que justifique a sinistralidade. A medida também se torna nula pelo Código de Defesa do Consumidor que trata da ausência de informação clara e adequada no artigo 6º, III (Lei nº 8078, de 1990) e da imposição de obrigação iníqua, excessiva, que cria desvantagem exagerada e permite a variação unilateral do preço - no artigo 51, incisos IV e X. Uma relação contratual tem de ser útil e justa às duas partes, sem privilegiar o interesse de uma, em detrimento da outra. Um dos casos mais comuns é o dos pacientes com câncer. Se em uma apólice existir um paciente de alto custo, que gera a sinistralidade, quando esse paciente morre, as taxas não voltam ao patamar anterior em que não havia o gasto. As taxas de sinistro continuam altas e sendo cobradas, como se aquele paciente ainda estivesse utilizando o remédio caro ou gerando despesas de uma internação na UTI. A mensalidade deveria ser reduzida quando não ocorre o sinistro. Há menos de dois anos (24 de outubro de 2012), a ANS criou a Resolução Normativa nº 309, que dispõe sobre o agrupamento de contratos coletivos de planos privados de assistência à saúde para fins de cálculo e aplicação de reajuste. O artigo 3º é claro na questão dos reajustes e seus termos também não têm sido respeitados. Seria recomendável que os planos coletivos fizessem agrupamentos de, no mínimo, dois mil beneficiários para a diminuição dos riscos atuariais. Felizmente, os tribunais de justiça brasileiros vêm acolhendo recursos de empresas que se sentem lesadas com a aplicação abusiva dos reajustes e esse entendimento garante ao consumidor o direito à saúde, sem prejuízo do que foi acordado na assinatura do contrato. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou em 17 de abril de 2013 a Apelação nº 0218154-93.2011.8.26.0100, de reajuste de um contrato coletivo com base na sinistralidade. Na súmula 469, o desembargador Moreira Viegas entendeu que aquela disposição contratual colocava o consumidor em desvantagem exagerada ao permitir que o fornecedor variasse o preço de maneira unilateral e que havia ali a violação do artigo 51, incisos IV e X, do Código de Defesa do Consumidor. Também reconheceu a abusividade na cláusula contratual que previa a rescisão unilateral imotivada e, ainda, julgou inadmissível o cancelamento injustificado do seguro saúde que coloca os segurados do contrato coletivo em situação de desvantagem - o que é contrário à Lei nº 9.656, de 1998, e ao Código de Defesa do Consumidor. A sentença foi mantida e o recurso desprovido. Em outro caso, envolvendo ação civil pública contra a Amil Assistência Médica Internacional, que firmou contratos coletivos por adesão com micro e pequenas empresas, o juiz entendeu parcialmente procedente o pedido do Ministério Público do Estado de São Paulo, tendo declarado nula a cláusula contratual que estipula em desfavor do consumidor reajuste por sinistralidade. Além disso, impôs a abstenção à demandada de inserir, nos contratos celebrados, disposição estabelecendo reajuste por sinistralidade, sob pena da incidência de multa, com fundamento no artigo 461, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, no valor de R$ 5 mil, por descumprimento e, ainda, a revisão da contraprestação que lhe é devida, com a incidência somente dos índices da ANS, sem prejuízo dos reajustes por mudança de faixa etária. "Não é viável a utilização de fórmula matemática composta com fatores apurados unilateralmente pela recorrente e de, repita-se, difícil compreensão. Nega-se, por isso, provimento ao apelo". (TJ-SP - 6ª Câmara de Direito Privado - Apelação nº 0216448-75.2011.8.26.0100). Esses exemplos deixam claro que as operadoras fingem que a lei não existe e a ANS finge que as fiscaliza. Resta ao consumidor ficar atento e vigiar sempre a atuação da operadora que contratou para que a violação dos direitos não ocorra. Renata Vilhena Silva é advogada especializada em direito à saúde

Consumidor que indeniza forncedor por abuso nas reclamações

Fonte: Migalhas Consumidor deve indenizar empresa por excesso no direito de reclamar Eduardo A. Silveira Inúmeras decisões judiciais atuais entenderam que reclamações intempestivas, imoderadas, que ultrapassam o limite do razoável, geram o dever de indenizar a empresa pelos danos causados. O avanço da internet, a facilidade de acesso às redes sociais através de smartphones cada vez mais modernos e a nova geração de consumidores, muito mais antenados, criaram uma nova modalidade de aproximação entre empresas e clientes. Essa relação, porém, nem sempre é harmoniosa. Em que pese a grande maioria das empresas terem um canal próprio de comunicação com o cliente, como, por exemplo, o “fale conosco”, os consumidores acabam recorrendo às redes sociais, como forma de extravasar aquela raiva momentânea, compartilhando a sua indignação, revolta e até mesmo a sua impressão ou experiência não muito boa sobre determinada empresa ou produto. Ocorre que, mesmo tendo o consumidor razão em sua reclamação, este não pode ir além do direito de exprimir a sua opinião, ou seja, não pode ultrapassar o direito a livre manifestação do pensamento previsto no art. 5º, IV da Constituição Federal, sob de cometer um ilícito civil previsto no art. 186 do Código Civil. Em alguns casos, contudo, o que se tem visto é que o “ataque gratuito” ou um post infeliz realizado em um momento de fúria, pode gerar um dano irreparável às empresas. Isso porque, com a velocidade da internet, em minutos um post, uma foto, um texto ou um vídeo na web pode ser compartilhado entre milhares de pessoas, tornando-se um viral. Casos assim têm chamado atenção das empresas, do Judiciário e dos profissionais que atuam no ramo do direito. Aos poucos o Judiciário tem entendido que tais reclamações, que ultrapassam o limite do razoável, pode gerar indenização por danos morais em favor da empresa. Isso porque, tradicionalmente, a Lei protege o Consumidor, hipossuficiente na relação consumerista. Ocorre que, historicamente, quando a Lei passa a superproteger determinada parte do negócio jurídico, esta tem a tendência natural de cometer abusos no exercício de seu direito. Por sorte, o direito, como ciência social que é, acompanha o desenvolvimento humano, se transforma e se adapta à nova realidade das relações sociais. Por tais razões, temos hoje inúmeras decisões judiciais entendendo que reclamações intempestivas, imoderadas, que ultrapassam o limite do razoável ou que não correspondem à realidade, geram o dever de indenizar a empresa pelos danos causados (danos morais). Temos alguns precedentes na Justiça Paulista em que clientes foram acionados judicialmente pelas críticas que fizeram à determinadas empresas. Em um deles, um consumidor do interior do Estado foi condenado a pagar R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a uma grande loja do segmento de comércio eletrônico, por ter insultado atendentes em um site que ficou no ar por 25 (vinte e cinco) minutos. Do ponto de vista das empresas, como não é possível exigir que um cliente retire um conteúdo do ar, não há alternativa senão recorrer ao judiciário ou realizar uma composição amigável. Considerando a complexa relação desenvolvida entre empresas e consumidores com a chegada da era digital, a única conclusão a que se pode chegar é que o acordo é sempre a melhor alternativa para as duas partes. Isso evita muitas vezes um litígio e, em determinadas situações, um atendimento atencioso e bem realizado por parte da empresa acaba superando uma experiência desagradável do consumidor. ___________________ * Eduardo A. Silveira é advogado da área de Contratos do escritório Duarte e Tonetti Advogados Associados.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Esclarecimentos adicionais sobre os impactos do novo código comercial

Fonte: Migalhas 19.08.2014 http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI206088,31047-Alguns+esclarecimentos+adicionais+sobre+o+impacto+economico+do Alguns esclarecimentos adicionais sobre o impacto econômico do projeto do Código Comercial Marcelo Guedes Nunes Estudo que projetou os impactos econômicos do novo Código Comercial assumiu o pressuposto de que o resultado da lei projetada seria negativo e não tentou por um só momento invalidar essa hipótese. Em artigo publicado neste Migalhas (dia 9/06/14), o professor Haroldo Verçosa repercute os resultados de um estudo que procurou estimar o impacto econômico do projeto de Código Comercial, atualmente em trâmite no Congresso Nacional. Após tomar o estudo como fundamento de suas opiniões, o professor conclama aos que eventualmente discordem da metodologia utilizada a apresentar suas razões. Fico satisfeito em descobrir que o professor passou a se interessar por pesquisa empírica em direito, campo de estudos recém desembarcado no Brasil. Fico igualmente satisfeito em notar a sua compreensível preocupação em descobrir se o estudo padeceria de algum defeito de ordem metodológica. De fato, o estudo apresenta deficiências metodológicas sérias e veicula informações que aparentam ser técnicas, mas que na verdade não resultaram de uma reflexão cuidadosa. Tais deficiências podem acabar contribuindo para a desinformação do público, o que acredito não tenha sido o objetivo dos autores do estudo, nem daqueles que inadvertidamente divulgaram seus resultados. Por tal razão, aproveito o espaço cedido pelo Migalhas para atender ao pedido do professor, bem como às mensagens que recebi ao longo dos últimos dias por conta de um artigo publicado recentemente no Valor, e explicar em maior detalhe alguns dos problemas metodológicos desse estudo. Espero que os esclarecimentos sejam capazes de dirimir as dúvidas e de contribuir para o fortalecimento da pesquisa empírica em nossa comunidade jurídica. *** O estudo se propõe a calcular os custos de litígio do projeto, definido como os custos incorridos por conta das ações judiciais geradas em decorrência da edição de uma nova lei. Para fazer o cálculo, os pesquisadores tomam a lei de falências como referência e afirmam que a quantidade de processos com base nessa lei vem subindo nos últimos nove anos em decorrência da dificuldade dos tribunais interpretarem o novo diploma. Partindo dessa premissa, o estudo calcula o impacto do projeto através de uma regra de três: se a lei de falências tem 201 artigos e gerou 2.740 processos por ano, um projeto de 1.102 artigos gerará 15.043, somente em segundo e terceiro graus. Em seguida, outra regra de três é aplicada para estimar a quantidade de processos em primeiro grau, utilizando informações do CNJ. O estudo afirma que esses dados não seriam estimações, o que é errado, pois a conta não considera o tipo de processo gerado pelas leis, nem as unidades federativas que a pesquisa abrange. Finalmente, utiliza-se um preço médio por processo tirado de outro estudo, para chegar a um custo total do projeto de mais de R$ 136 milhões. A proposta de estabelecer uma relação de causalidade linear entre os custos de um projeto e a sua quantidade de artigos soa estranha. Não parece razoável calcular o impacto de uma lei considerado apenas quantos dispositivos ela tem e assumindo que qualquer artigo, independentemente do seu conteúdo, geraria um custo estimado de R$ 124 mil. Como explicado no artigo do Valor, essa generalização leva a conclusões sem sentido, como, por exemplo, a de que projetos com disposições contraditórias entre si produziriam impactos iguais, desde que apresentem o mesmo número de artigos; ou que a revogação da lei das S/A através de um único artigo de lei custaria ao país R$ 124 mil; ou, ainda, que seria possível reduzir o impacto econômico de um projeto de lei apenas renumerando seus artigos como incisos. *** Mas ainda que assumíssemos essa suposição, ela valeria apenas para os custos de litígio e não para os possíveis benefícios que poderiam ser gerados pela aplicação da lei. Espera-se de um estudo de impacto econômico ponderações sobre a relação entre os custos e os benefícios da lei projetada, para verificarmos se o resultado final será favorável ou não para sociedade. Não se pode conceber uma pesquisa de impacto econômico, que levante apenas custos e não apresente considerações sobre os potenciais ganhos da lei. Mas foi isso o que acabou sendo feito. Pegue-se o exemplo da lei de falências. A conta do custo de litígio chegaria ao valor de R$ 33,88 milhões. Admitindo que esse valor seja verdadeiro (o que não acredito), ainda assim a lei foi bem recebida pela comunidade jurídica e suponho que ninguém seja hoje favorável ao retorno da concordata apenas porque o número de recuperações judiciais aumentou. Seria, portanto, razoável ao menos considerar a hipótese de que os benefícios gerados pela nova lei de falências tenham superado os custos de sua implementação. O problema é que o estudo analisa apenas os supostos custos e não se propõe sequer a considerar a possibilidade do projeto gerar algum benefício. Ao fixar a premissa de que nenhum dos 1.102 artigos do projeto de Código Comercial produziria sequer um centavo de ganho, o estudo dá a impressão de ter sido planejado para produzir um resultado negativo. *** O estudo também se equivoca ao supor que a nova lei de falências teria causado um aumento no volume de processos e que esse aumento seria generalizável para outros projetos de lei. Os dados da Serasa Experian mostram que o volume de processos de falências em primeira instância caiu depois da nova lei, descendo de patamares superiores a 1500 pedidos por mês para aproximadamente duzentos. Os dados mostram, além disso, que a soma dos pedidos de falência e concordata entre 1997 e 2005 (de 174.308) é substancialmente maior (quase seis vezes mais) do que a soma dos pedidos de falência e recuperação ingressados entre 2005 e 2013 (de 30.040). A queda nas ações de falência pode ser explicada pela introdução do piso de quarenta salários-mínimos (art. 94 da lei) como requisito obrigatório para o ingresso de um requerimento desse tipo, dispositivo que barrou a entrada de pedidos espúrios e financeiramente irrelevantes. Já o aumento nas ações de recuperação pode ser explicado pelo fato do legislador ter deliberadamente intencionado oferecer aos empresários um remédio jurisdicional para socorrê-los em épocas de crise. Com a crise de 2008, era, portanto, esperado que eles corressem aos tribunais para pedir ajuda, ocasionando um aumento nos pedidos de recuperação. De qualquer forma, tendo em vista que a nova lei de falências provocou uma significativa redução na quantidade de processos, a tentativa de associar um imaginado aumento de ações a todo e qualquer projeto de lei em matéria comercial fica comprometida. *** Mas se os dados públicos são tão claros, de onde surgiu a ideia de que a nova lei de falências teria dado causa a um aumento na quantidade de ações? Ao que parece, o estudo incorre em um erro elementar: ele desconsidera o volume de processos antes do advento da nova lei. Regra básica para uma avaliação de impacto legislativo é, sempre que possível, comparar a situação anterior à vigência da lei com a situação posterior. É por meio da confrontação entre um cenário em que a lei não era vigente com outro no qual a lei vigorava, que se pode tentar estimar o impacto da mudança legislativa. No estudo aqui discutido, o objetivo era avaliar como a entrada em vigor da nova lei de falências (variável explicativa) teria afetado o volume de processos (variável de interesse), o que poderia ser feito através de uma simples comparação entre a quantidade de processos antes e depois de 2005. O problema é que o estudo desconsiderou a situação anterior à vigência da lei e calculou apenas a variação do volume de processos a partir do ano de 2005, período em que a nova lei já havia impedido o ingresso de todas as falências irrelevantes. Não por outra razão, os autores chegam à conclusão equivocada de que a quantidade de ações teria aumentado, quando, na verdade, a lei está associada a uma drástica redução no volume de processos. *** Mas quais seriam, então, as explicações para a variação na quantidade de ações depois da vigência da nova lei? Há algumas hipóteses formuladas pelos especialistas. Uma delas é a seguinte. A interpretação da lei de falências foi rapidamente absorvida pelos tribunais (o prazo de 10 anos do estudo é superestimado) e a variação na quantidade de ações pode ser explicada não por dilemas hermenêuticos de uma década, mas pela associação entre os pedidos de recuperação e falência, de um lado, e o desempenho geral da economia brasileira, de outro. Quando a economia vai mal, existe uma tendência de aumento nos pedidos de recuperação e falência; quando a economia vai bem, eles tendem a diminuir. Uma análise preliminar dos dados (a ser confirmada) parece corroborar essa explicação, ao mostrar um aumento mais acentuado a partir de 2008 e 2009, época da crise, atingindo preferencialmente empresas de pequeno e médio porte, mais sujeitas a conjunturas econômicas desfavoráveis. Surpreende o fato dessa e de outras possíveis explicações não terem sido sequer considerada pelos autores do estudo (como, por exemplo, a que tem sido chamada de “indústria da recuperação judicial”). Sem manifestar qualquer preocupação em formular hipóteses concorrentes com a sua, o estudo assume que a variação seria integralmente explicada por dúvidas sobre o sentido da lei e generaliza de forma apressada essa discutível premissa, afirmando que todo projeto geraria as mesmas quantidades de dúvidas hermenêuticas e de processos judiciais. *** Há, por fim, um sério problema de intencionalidade. Sob a justificativa de que o projeto teria artigos demais, o estudo admite ter selecionado intencionalmente para a análise alguns dispositivos que causariam maior custo para o empresariado. A pergunta é: se os autores já partiram da premissa de que certos artigos gerariam maior custo, qual o propósito do estudo? Se o objetivo era estimar um impacto até então desconhecido, como o estudo pode iniciar sua análise escolhendo alguns artigos que identifica, de antemão, como sendo os mais custosos? A resposta é que o estudo não procurou estimar um impacto desconhecido. Na realidade, ele assumiu o pressuposto de que o resultado da lei projetada seria negativo e, em desacordo com os ditames básicos da pesquisa quantitativa, não tentou por um só momento invalidar essa hipótese, procurando apenas construir argumentos para comprová-la. Essa arbitrariedade na fixação das conclusões se manifesta mais adiante em outras escolhas, como por exemplo no cálculo dos custos. Pegue-se o caso das companhias abertas. O estudo calcula o custo do projeto sobre as empresas de capital aberto como uma função da mudança no market cap das empresas listadas no IBRX, antes e depois da possível entrada em vigor do novo Código Comercial. Essa mudança no market cap é, por sua vez, calculada a partir de uma redução no índice preço/lucro do mercado. Assume-se que essa redução no preço/lucro seria uma fração (ou "coeficiente de multiplicação", conforme consta do estudo) do desvio padrão do mesmo preço/lucro. No entanto, o fato de assumir valores arbitrários para esse "coeficiente" torna toda a conta arbitrária. Não foi possível encontrar no estudo razões econômicas nem estatísticas para a escolha dos valores, que expressam uma opção subjetiva dos autores e que, portanto, espelham não um dado objetivo, mas a preferência individual deles. Por exemplo, um jurista que tenha se posicionado veementemente contra o projeto poderia arbitrar um coeficiente ainda maior de, digamos, 1,2, chegando a um impacto negativo de mais de R$ 109 bilhões. Já outro jurista favorável ao projeto poderia atribuir um coeficiente de -0,66, chegando a um impacto positivo de R$ 68 bilhões. O que esses números acrescentam ao debate? Em uma palavra: nada. *** Concluindo, para não reduzirmos a pesquisa empírica a uma variante das velhas contendas dogmáticas, na qual as pilhas de citações doutrinárias serão substituídas por amontoados de números sem significado, os pesquisadores engajados nesse tipo de trabalho precisam abraçar uma postura de desprendimento, marcada pela desconfiança sobre suas próprias intuições. As pesquisas empíricas foram criadas para testar hipóteses e não para confirmar intuições. Por tal razão, o erro do estudo foi dogmatizar as intuições de seus autores, reduzindo o que deveria ser uma hipótese de trabalho a uma verdade apriorística não questionada. Uma postura que, a despeito da forma matemática, em nada difere da velha retórica acadêmica, baseada na seleção intencional de citações doutrinárias e soluções jurisprudenciais favoráveis à tese sustentada. Espero que esses comentários tenham servido para alertar os autores do estudo, bem como os professores que o divulgaram, a respeito dos equívocos metodológicos cometidos. Minha intenção, acima de tudo, é elevar o nível do debate e contribuir para que a Jurimetria, a análise econômica do direito e as demais variantes da pesquisa empírica no Brasil se desenvolvam infensas aos subjetivismos dos já desgastados embates da doutrina tradicional. Encerro por ora meus comentários sobre esse assunto, mas fico à disposição dos autores do estudo e dos professores que o repercutiram para avançar na discussão.

BNDES condenado a divulgar financiamentos

Valor Econômico – Brasil – 21.08.2014 – A5. Justiça obriga BNDES a divulgar empréstimos. Por Maíra Magro | De Brasília. A Justiça Federal em Brasília condenou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a divulgar, em seu site, informações detalhadas sobre todos os empréstimos a entidades ou empresas públicas e privadas, relativas aos últimos dez anos e daqui pra frente. A decisão inclui qualquer apoio a programas, projetos, obras e serviços com aporte de recursos públicos, e engloba também a subsidiária BNDESPar, braço de investimentos em participações do banco. O BNDES afirmou que recorrerá da sentença. Segundo a juíza Adverci Rates Mendes de Abreu, da 20ª Vara do Distrito Federal, o banco está sujeito à Lei de Acesso a Informações Públicas e os contratos da instituição, por envolverem recursos públicos, não são protegidos pelo sigilo fiscal ou bancário. Apesar de ser uma empresa pública federal, que recebe aportes bilionários do Tesouro Nacional, o BNDES é considerado uma "caixa preta" até mesmo pelos órgãos de controle. O banco não divulga informações sobre financiamentos a empresas privadas com a justificativa de que estão protegidas por sigilo bancário. A Advocacia-Geral da União (AGU) entrou no processo como assistente do banco para reforçar o pedido de manutenção do sigilo. Se a sentença prevalecer, o BNDES fica obrigado a divulgar o valor dos empréstimos, destinatários, modalidade de apoio e sua justificativa, além de detalhes como forma e condição de captação dos recursos, critérios para definir onde o dinheiro é investido, risco, prazos, taxas de juros, garantias e o retorno obtido. "Em que pese sua natureza jurídica de direito privado, [o BNDES] é empresa pública federal e está sujeito ao regime jurídico administrativo e às regras de direito público, dentre as quais a Lei de Acesso à Informação", afirma a juíza, acrescentando que as entidades privadas que contratarem com o banco estão sujeitas às mesmas exigências. De acordo com ela, a divulgação não contraria o sigilo bancário das companhias: "Ao contratar com o poder público, tais empresas se sujeitam às regras de direito público, e, portanto, à lei da transparência". A decisão foi tomada na análise de uma ação civil pública apresentada pela Procuradoria da República no Distrito Federal. Para o Ministério Público Federal (MPF), quando se fala em dinheiro público, o sigilo bancário não se aplica. "Se fosse um banco privado, as informações não teriam relevância para o cidadão. Mas no caso do BNDES é importante saber como o dinheiro público está sendo tratado", disse ao Valor a procuradora da República Luciana Loureiro Oliveira, ao entrar com a ação. O processo foi motivado por um inquérito aberto pelo MPF em 2011, diante da notícia de que o BNDES faria um aporte de até R$ 4,5 bilhões na fusão entre o grupo Pão de Açúcar e as operações brasileiras da rede francesa Carrefour. O negócio acabou não se concretizando, mas gerou protesto contra o uso de dinheiro do contribuinte para financiar grandes grupos. Segundo a procuradora, o banco se negou a fornecer os dados solicitados pelo MPF para investigar, na época, se haveria interesse público na operação. Agora, o BNDES também foi condenado a repassar ao MPF todas as informações requisitadas sobre apoio ou financiamento a entidades públicas e privadas, independentemente de ordem judicial. O BNDES enfrenta outras ações semelhantes na Justiça. Em fevereiro, o presidente eleito do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, concedeu liminar à "Folha de S. Paulo" garantindo o acesso a relatórios de análise do banco para concessão de empréstimos e financiamentos superiores a R$ 100 milhões. O caso ainda será julgado pelo plenário da Corte. Procurado pelo Valor, o BNDES afirmou que "fornece o máximo de informações possíveis" sobre suas operações, "resguardadas apenas aquelas para as quais existam restrições legais que impeçam sua divulgação ou quando estejam relacionadas a questões de caráter comercial e concorrencial que possam prejudicar o BNDES ou seus clientes.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Questionamentos sobre os impactos no novo código comercial

Jornal Valor Econômico - Legislação & TRibutos (Rio) - 05.08.2014 - E2 Os números do novo Código Comercial Os números do novo Código Comercial Por Marcelo Guedes Nunes e Adilson Simonis Recentemente foi divulgado um estudo que tenta avaliar os custos que adviriam da aprovação do projeto de Código Comercial em trâmite no Congresso Nacional. O estudo tem o mérito de chamar a atenção para o tema da avaliação de impacto legislativo. No entanto, graves deficiências metodológicas, especialmente a não sustentação de premissas com um mínimo de rigor científico, ofuscam essa qualidade. Violando uma regra básica de imparcialidade, o estudo admite ter se baseado em um número arbitrário de artigos, intencionalmente selecionados por serem aqueles que, segundo critérios não explicados, gerariam o maior custo para o empresariado. Uma pesquisa imparcial partiria da premissa de que o projeto poderia impactar de forma positiva, neutra ou negativa e tentaria estimar esse impacto. Ao direcionar o trabalho para um resultado de conveniência, o estudo incorre em um vício grave, que invalida suas conclusões e retira seu caráter científico. A boa ciência é uma luta contra as intuições. Por tal razão, quando temos um palpite devemos duvidar dele e não sair em busca de aspectos para confirmá-lo. Um problema do estudo é que a crítica é tão genérica que poderia ser utilizada contra qualquer projeto de lei O estudo também falha ao assumir que o custo de uma lei pode ser medido pela quantidade de artigos. A conta feita pelos autores é a seguinte: como a Lei de Falências deu causa a uma média de 2.740 processos por ano, o Código Comercial, que tem 5,49 vezes mais artigos, produziria uma quantidade proporcional de, no mínimo, 15.043 processos por ano. Partindo dessa discutível causa e efeito linear e tomando de outro trabalho um custo médio por processo de R$ 1.800 na Justiça Estadual (sem explicar como essa transposição seria possível), entre outras suposições, a pesquisa chega ao custo de R$ 136.580.852,31 milhões (por ano) ou aproximadamente R$ 124 mil por artigo novo. Um problema é que a crítica é tão genérica que poderia ser utilizada contra qualquer projeto. Como o custo médio de qualquer artigo seria de R$ 123 mil, qualquer lei com, por exemplo, dez artigos produziriam um impacto de R$ 1,2 milhão, não importa o que digam os dispositivos. Assim, um projeto de dez artigos que proibisse a criação de câmaras especializadas em direito empresarial teria o mesmo impacto de outro, que também com dez artigos tornasse obrigatória a implantação da Justiça especializada. Um óbvio contrassenso. Pelo mesmo cálculo, uma lei de um único artigo que determinasse o encerramento das atividades da BMF&Bovespa custaria ao país R$ 124 mil. Outra falha é a premissa de que a quantidade de falências e recuperações teria aumentado em decorrência de uma dificuldade dos tribunais em interpretar o novo texto legal. Primeiro, com a nova Lei de Falências, a quantidade de falências caiu, descendo de valores superiores a 1.500 falências requeridas por mês para aproximadamente 200 (dados públicos do Serasa). Segundo, o estudo não considerou o mais relevante evento econômico dos últimos 50 anos: a crise de 2008. O aumento na quantidade de ações observado a partir de 2008 não tem relação com celeumas hermenêuticas nos tribunais e está provavelmente associado ao impacto da crise sobre empresas em dificuldade. Em outra passagem, para calcular o impacto do conceito de função social da empresa, o estudo pega a soma do valor de mercado de todas as companhias listadas no IBRX, de R$ 2,134 trilhões, e aplica uma fórmula com um coeficiente de multiplicação arbitrário, resultando em uma redução no valor das empresas de até R$ 90 bilhões. O estudo afirma também, sem qualquer explicação, que o conceito de função social da empresa daria causa a uma redução de até 10% na quantidade de empresas abertas por ano. Qual o fundamento desses coeficientes de multiplicação? De onde surgiu a ideia de que até 10% dos potenciais novos empresários deixariam de ir ao mercado? E, o que é mais intrigante. Por que o conceito de função social, que já está na Constituição Federal, poderia afugentar os pequenos e reduzir o valor somado de todas as companhias listadas no IBRX de uma só vez? Enfim, as deficiências são inúmeras, os custos atribuídos ao projeto são, na verdade, uma manifestação de preferências subjetivas de seus autores e o trabalho não apresenta condições mínimas de trazer qualquer contribuição ao debate quantitativo, como apregoado em seu preâmbulo. Ao contrário, ele tem o potencial de ferir a reputação das recém chegadas abordagens empíricas e ajudar a difundir a imagem errada, porém corrente, de que, uma vez manipulados, os números podem dizer qualquer coisa. Marcelo Guedes Nunes e Adilson Simonis são, respectivamente, advogado e presidente da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ); professor livre-docente de estatística do IME-USP

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Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar