terça-feira, 21 de outubro de 2008

Nova matéria sobre partipação de sócio estrangeiro em limitada

Valor Econômico – Legislação & Tributos – 20.10.08 – E1


Juízes entendem que estrangeiras sócias de limitadas são irregulares
Zínia Baeta, de São Paulo20/10/2008
No início deste ano a Justiça paulista negou a uma empresa o requerimento de falência de um credor por ela ser sócia estrangeira de uma sociedade limitada no país. A 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo entendeu que, por ser cotista de uma limitada e funcionar sem a autorização do Poder Executivo, a empresa seria irregular e, portanto, não teria o direito de pedir a falência de um credor. Em uma outra situação, a Justiça do trabalho da capital paulista autorizou que os sócios de uma sociedade limitada respondessem com seus bens pelos débitos trabalhistas da empresa. A sociedade também foi considerada irregular por possuir sócios estrangeiros e atuar sem a autorização do Executivo. As decisões citadas, ainda que de primeira instância e raras na jurisprudência, ilustram os debates que começam a surgir no Poder Judiciário sobre o funcionamento das sociedades estrangeiras no Brasil.


A discussão sobre a questão surgiu com o novo Código Civil em 2002 e está hoje dividida em duas correntes doutrinárias: uma entende ser necessária a autorização do Poder Executivo para a participação de estrangeiros em limitadas - apesar dos entraves práticos - e que sociedades estrangeiras só poderiam participar de sociedades anônimas no país. A outra corrente defende não existir qualquer empecilho legal para a participação das estrangeiras em empresas limitadas. A questão é no mínimo polêmica, já que o número de empresas atingidas pela discussão é imenso.

O advogado Armando Rovai, professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e ex-presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp), defende a necessidade de autorização do Poder Executivo para o funcionamento de sociedades nessas circunstâncias. Segundo ele, a lei veda a participação do estrangeiro nas limitadas sem esse consentimento. Para o professor, o artigo 1.134 do novo Código Civil é claro ao estabelecer essa necessidade. O dispositivo diz que "a sociedade estrangeira, qualquer que seja o objeto, não pode, sem autorização do Poder Executivo, funcionar no país, ainda que por estabelecimentos subordinados, podendo todavia ser acionista de sociedade anônima brasileira".

O juiz titular da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, Alexandre Alvez Lazzarini, levou em consideração esse artigo do Código Civil para negar o requerimento de falência realizado por uma sociedade estrangeira em relação a um credor no Brasil. O magistrado entendeu tratar-se de uma empresa irregular - e, sendo assim, não poderia postular a falência de outra empresa. Lazzarini entende que uma empresa limitada, para ter em seus quadros um sócio estrangeiro, precisa obter a autorização do Executivo para funcionar. Em caso contrário, como afirma, estará sujeita às conseqüências de sua irregularidade. O que, na prática, significa não estar apta a pedir a falência de credores, participar do quadro de credores de uma recuperação judicial ou mesmo pedir a própria recuperação judicial. No entanto, segundo o magistrado, essa mesma empresa poderá figurar como ré em um processo de falência. Para ele, essas circunstâncias poderão ter efeitos também no direito de família, principalmente em relação aos planejamentos sucessórios que costumam utilizar off shores nessas operações.

A juíza do trabalho, Thereza Cristina Nahas, titular da 61ª Vara do Trabalho de São Paulo, defende esse mesmo ponto de vista e o tem aplicado em algumas de suas decisões. Segundo ela, o artigo 1.134 do novo Código Civil é mais um fundamento para aplicar-se a responsabilidade direta do sócio e do administrador pelos débitos trabalhistas da empresa. Nessa situação, eles respondem com seus bens pela dívida.

"Essas decisões judiciais são preocupantes, pois quase toda estrangeira que chega ao país investe em limitadas por ser o procedimento mais simples e baratos", afirma a advogada Tânia Liberman, do escritório Koury, Lopes Advogados (KLA). A advogada entende que o artigo do novo Código Civil não veda essa participação. Para ela, a necessidade de autorização ocorreria apenas para a abertura de uma filial de uma empresa estrangeira no Brasil. Tânia também argumenta que a Constituição Federal proíbe a distinção entre empresas nacionais e estrangeiras. "Uma diferenciação entre empresas brasileiras e com capital estrangeiro seria inconstitucional", afirma a advogada Maria Lúcia de Almeida Prado e Silva, sócia do escritório Demarest e Almeida. A advogada lembra que o próprio Código Civil prevê que no contrato social das empresas deve constar a nacionalidade de seus sócios e o local de sua sede. Os advogados também lembram que o Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC), em 2003, atendendo a uma consulta da Junta Comercial do Estado do Maranhão, entendeu não existir qualquer óbice na participação de um sócio estrangeiro em uma empresa limitada.

Para o professor de direito comercial da graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito do Mackenzie, Fabiano Del Masso, a exigência de aprovação, pelo Executivo, da participação de um sócio estrangeiro em uma limitada seria um procedimento que traria uma série de entraves às empresas. "Não é uma prática do Executivo e não há regras claras sobre isso", afirma. No entanto, o professor entende que as empresas constituídas nessa situação seriam irregulares. Para ele, a saída para essas empresas é buscar a autorização ou fazer a transformação da limitada em sociedade anônima - cujos custos e exigências são muito maiores. A advogada Tânia Liberman afirma que a abertura de uma filial de estrangeira no Brasil, por exemplo - que exige autorização do Executivo - é um procedimento que demora alguns anos. Se for aplicado às limitadas, o mesmo poderá ocorrer.

2 comentários:

Unknown disse...

Meu caro professor. Li essa notícia de Jornal e fiquei curiosa sobre se já havia algum enunciado ou decisão prévia sobre o tema. Acho que não há como se interpretar essa questão na forma como feita nessa decisão e seria bom que houvesse mais doutrina ou posicionamentos em contrário.

Unknown disse...

Mestre Ronald,
Estava eu aqui preparando uma peça quando fui googlado para o seu blog e para este assunto que você já tinha levantado em sala de aula.
Trata-se de um disparate! Um absurdo! Isso realmente só pode sair da cabeça de quem acha bacana inventar teses doutrinárias para, se colar, reivindicar a paternidade. No entanto, crer que a participação de sócia estrangeira em sociedade brasileira torna esta sociedade brasileira irregular é o mesmo que negar a personalidade jurídica da sociedade brasileira desde o momento zero, a despeito de ter sua constituição reconhecida pelo registro do comércio, de ter seus órgão próprios, de se fazer representar de forma própria, de ter seu patrimônio próprio, em suma, de se destacar inteiramente do que é a atividade de seu sócio estrangeiro. Por óbvio, não há qualquer identidade entre ser sócio da empresa brasileira e atuar no Brasil. Vale registrar que o sócio estrangeiro pode deter uma pequena participação e não ter qualquer influência sobre a gestão da sociedade local; que atuação é esta? O sócio majoritário brasileiro estaria atuando também em nome próprio?
O que o artigo não permite é a abertura de estabelecimento sem a autorização prévia do Executivo. O estabelecimento representaria, este sim, atividade local da empresa estrangeira, como sempre foi.
Por fim, considerando que não existe na legislação pátria procedimento para autorização de empresa estrangeira ser sócia de ltda (ao contrário da autorização para funcionar diretamente através de filial ou escritório de representação) e que as Juntas Comerciais são extensão do Poder Executivo e exercem o controle dos sócios estrangeiros mediante conferência dos seus atos constitutivos e de representação estatutária e por procuração devidamente certificados, consularizados e traduzidos, o arquivamento dos atos representaria a própria autorização do Poder Executivo.
Com efeito, entre considerar irregular uma limitada porque o sócio estrangeiro não obteve uma autorização para a qual não existe procedimento e considerá-la regular porque seu arquivamento obedeceu os trâmites legais, inclusive no que se refere à comprovação da existência e representação do sócio estrangeiro, a segunda opção é a única sensata. E, concluindo, embora a crítica ao artigo do Código seja válido por sua omissão, não podemos optar por interpretar as leis de forma insensata sob pena de descrédito das instituições.


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