sexta-feira, 6 de junho de 2008

Homogeneidade no desempenho jurídico da União

Valor Econômico - Brasil - 04.06.08 - A4

União quer que a área jurídica fale a mesma língua
Juliano Basile
Há dez dias, o Banco Central e a Receita Federal resolveram uma disputa judicial milionária que travavam desde 2004. Os dois órgãos públicos se desentenderam quanto à remuneração de profissionais autônomos que prestam serviços ao BC.
A Receita queria tributar o chamado "pagamento de cota patronal previdenciária" aos autônomos que prestavam serviços ao programa de assistência aos servidores do banco. O BC se negou a pagar e, por isso, se viu numa situação surrealista. Responsável pela fiscalização de todos os bancos do Brasil, o BC ficou impossibilitado de obter uma Certidão Negativa de Débitos. Na prática, isso significou que a maior autoridade monetária do País ficou na condição de má pagadora.
Após quatro anos de disputas na Justiça, o caso foi levado ao Palácio do Planalto. A Casa Civil ficou com o seguinte dilema: como arbitrar um conflito entre as autoridades das áreas fiscal e monetária do país? A solução foi encontrada pela Advocacia-Geral da União (AGU), que possui uma Câmara de Conciliação justamente para resolver pendências entre diferentes órgãos do governo. A AGU concluiu que o BC deveria pagar R$ 26 milhões à Receita. O pagamento foi feito e a disputa que poderia se alongar por décadas foi encerrada.
Essas pendências são comuns na Esplanada dos Ministérios e a busca de uma solução fica mais difícil quando os órgãos públicos são defendidos por servidores com sólida formação jurídica. Advogados fazem de tudo para defender o seu cliente, ainda mais quando são concursados e dependem do sucesso do órgão para o qual trabalham para continuar exigindo vantagens salariais. Por causa de disputas como essa, o Planalto decidiu iniciar um novo debate em torno da unificação das carreiras jurídicas de Estado. Com o aval do presidente Lula, 22 carreiras distintas irão rediscutir o seu papel num congresso com a presença dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e José Sarney.
O objetivo é integrar as carreiras e evitar a proliferação de outros acontecimentos incompreensíveis na administração pública, como o exemplo de quatro procuradores de órgãos distintos atuando na mesma causa, com os mesmos objetivos. Ou a abertura, por diferentes ramos do Ministério Público, de várias ações civis públicas (que visam conceder o mesmo direito a todos os cidadãos). Uma ação bastava, mas, por falta de comunicação, procuradores entram com várias, em Estados diferentes, desperdiçando recursos públicos.
Historicamente, as carreiras jurídicas disputam espaço político na Esplanada. Individualmente, elas querem ser pioneiras nas grandes questões de Estado. Todas possuem sindicatos ou associações pelas quais reivindicam o papel de protagonistas em casos de interesse do governo e, com isso, buscam melhores salários. Isso faz com que se transformem em ilhas isoladas, e briguem por ações que, algumas vezes, já estão sendo cumpridas por outras procuradorias ou autarquias.
Somente a AGU possui quatro grandes entidades representativas de seus 9 mil servidores. Hoje, a AGU está dividida em três carreiras: procuradores da Fazenda, procuradores federais e advogados da União. A primeira é responsável por fazer a defesa do governo nas grandes causas tributárias e conta com a atuação pessoal do advogado-geral, ministro José Antonio Dias Toffoli, quando os casos chegam aos tribunais superiores de Brasília.
A segunda envolve 188 órgãos distintos. São os procuradores do INSS, do Cade, das universidades federais, das agências reguladoras e até das escolas técnicas do governo. Por fim, estão os advogados da União, categoria que, neste ano, mobilizou um forte movimento grevista. Sob a alegação de que o governo poderia sofrer um "apagão jurídico", com o abandono da defesa de processos milionários, os advogados da União reivindicaram os mesmos vencimentos dos procuradores da República - o que praticamente dobraria os salários.
Após terem o ponto cortado pelos dias não trabalhados, por força de decisão do presidente do Supremo Tribunal federal (STF), ministro Gilmar Mendes, eles passaram a discutir a viabilidade de receber o mesmo que os delegados da Polícia Federal - o que reduziria os aumentos em aproximadamente 50%.
As greves das diversas categorias são movimentos organizados, com propaganda paga nas principais rádios de Brasília e convocações que envolvem milhares de servidores. Agora, estão limitadas por decisões recentes do STF que, no ano passado, determinou que os funcionários públicos devem seguir as mesmas condições da iniciativa privada em suas paralisações, como manutenção do serviço, aviso prévio e realização de assembléia e de negociações com o governo.
Para Toffoli, todas as carreiras de Estado têm um objetivo em comum: servir ao cidadão-contribuinte. Daí, a necessidade de ampliar o debate para evitar disputas internas e melhor atender este cliente. "Temos que incentivar a maior integração entre as carreiras jurídicas não apenas para fazer diagnósticos de seus problemas, mas para aprimorar a atuação de órgãos distintos de uma maneira geral", afirmou o advogado-geral. "Estamos vivendo um momento em que as várias caixinhas da administração pública devem se comunicar melhor", defende.
O congresso será aberto pelo presidente Lula na próxima terça-feira, dia 10, no Centro de Convenções de Brasília. São esperados 3 mil servidores públicos - todos da área jurídica, como advogados da União, juízes e procuradores. Ao todo, serão quatro dias de debates para evitar que o governo continue acionando o próprio governo na Justiça.

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