sexta-feira, 17 de julho de 2009

Os falsários ("Die Fälscher")

Palavra do Gestor:
A lição econômica trazida com o filme "Os Falsários"
Marcelo H. de Brito 17/07/2009

Laureado com o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2008, o filme "Os Falsários" ("Die Fälscher"), de Stefan Ruzowitzky (Áustria e Alemanha, 2007), também tem o mérito de lembrar que a emissão descontrolada de moeda pode prejudicar um país. O filme mostra que durante a Segunda Guerra Mundial os nazistas forçaram prisioneiros selecionados em campos de concentração a falsificarem libras sem, contudo, explicar como aquela falsificação poderia debilitar a economia britânica.
Se não é evidente detectar - e imediatamente evitar - a perda do poder de compra diante de um processo inflacionário, isto é, um aumento generalizado dos preços num período, é ainda mais complexo (quiçá impossível) quantificar mentalmente e lidar com a evolução da inflação. Assim, se houver um crescimento da oferta monetária, que seja imprevisível, avassalador e, sobretudo, não condizente com o aumento das transações que requeiram a moeda, a inflação decorrente acarretará a perda da habilidade para definir e avaliar preços. Isso desestruturará as transações monetárias e, assim, abalará as relações sociopolíticas.
Por isso, a contínua e pujante introdução das libras falsas produzidas pelos falsários do filme acabaria subvertendo a estrutura de preços existente na Inglaterra, ou seja, destruiria um conjunto de informações estabelecido pela circulação da moeda, que é vital para a estabilidade de um país. Adicionalmente, uma inflação britânica descontrolada acirraria a desvalorização da libra, prejudicando as transações internacionais do Reino Unido.
Ao priorizar a falsificação da libra, os nazistas desejavam desestabilizar o notável adversário comercial. Ademais, libras falsas teriam sido usadas para pagar importações e honrar outras obrigações internacionais, favorecendo o balanço de pagamentos da Alemanha sob o jugo dos nazistas. Diante desse êxito, eles ordenaram a falsificação do dólar, possivelmente prevendo que os EUA poderiam ter uma moeda muito poderosa, como acabou ocorrendo na Conferência de Bretton Woods em 1944.
Talvez a história tivesse sido outra, se "Os Falsários" não tivessem postergado e restringido ao máximo a produção de dólares falsos. Coube, entretanto, ao governo dos Estados Unidos emitir dólares de forma excessiva, até para arcar os gastos com a Guerra do Vietnã na década de 1960. Tal procedimento elevou a inflação do país, além de inviabilizar no início da década de 1970 o regime cambial de Bretton Woods, que fora favorável aos EUA e restringira os riscos cambiais no mundo.
Uma notável expansão monetária também ocorreu no Brasil na década de 1980, quando a taxa de inflação tendia a crescer a cada mês. A ameaça da hiperinflação era contornada com pacotes econômicos que, em geral, trocavam o nome da moeda. No início de sua circulação, o cruzado (1986), o cruzado novo (1989) e o cruzeiro (1990) geravam uma ilusória perspectiva de estabilidade, que não se sustentava pela falta de austeridade monetária e fiscal. Era igualmente grave quando os governantes conclamavam o povo para fiscalizar os preços, atiçando na população a ideia de os empresários eram os responsáveis pelo descontrole inflacionário.
A inflação alta e variável beneficiava o governo, pois gastos e investimentos públicos elevados não eram sempre adequadamente corrigidos. Porém, as receitas com tributos eram indexadas por índices de preços estabelecidos pelo governo. Quando havia inflação crescente, o governo arrecadava o que queria e cobrava da sociedade de forma sorrateira o chamado imposto inflacionário.
Esta forma de tributar dificultava a formação de preços de ativos, produtos e serviços até pela expectativa de inflação ser uma profecia autorrealizável. Era uma especulação alheia às iniciativas empresariais a escolha do índice a aplicar nos reajustes, que exigiam um processamento extra. Isso prejudicava a agilidade empresarial que poderia ampliar as transações em quantidade e variedade e até arrefecer os impactos daquela expansão monetária descabida do governo, que agia sem responsabilidade fiscal e monetária.
A história demonstra, portanto, que há governos capazes de abalar o poder de compra da moeda e, assim, prejudicar uma população. Felizmente para o Brasil, os idealizadores e executores do Plano Real miraram o desenvolvimento pacífico com inflação baixa e controlada. Essa conquista não pode sucumbir. Esperemos que o país não venha a ter inimigos que recorrerão às ações de falsários.
Marcelo Henriques de Brito é sócio da Probatus Consultoria, diretor da Associação Comercial do Rio de Janeiro e possui a certificação Certified Financial Planner (CFP)
E-mail: probatus@probatus.com.br
Fonte: Valor Econômico - EU & Investimentos - 17, 18 e 19.07.09 - D2

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