terça-feira, 25 de novembro de 2008

Abuso do direito de reclamar

Jornal do Commercio - Direito & Justiça - 24.11.08 - B-8

Reclamação tem limite
GISELLE SOUZA
DO JORNAL DO COMMERCIO
Consumidores insatisfeitos têm todo o direito de reclamar de um produto que não funciona ou serviço que não lhes foi prestado adequadamente. O que não devem é ofender diretamente a empresa ou seus dirigentes. Com esse entendimento, as companhias têm levado a melhor no Judiciário. Tem-se consolidado cada vez mais nos tribunais do País a tese de que a liberdade de expressão tem limites. Pelo menos para esses casos. Portanto, eventual abuso nas críticas feitas em comunidades do site de relacionamentos Orkut ou no Youtube pode não somente levar o usuário a perder o direito a algum tipo de ressarcimento como também a responder civil e criminalmente pelos danos que tenha causado aos fornecedores. Recentemente, duas mulheres foram condenadas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) a retirar, no prazo de 72 horas, mensagens difamatórias que haviam postado no Orkut contra a empresa Criatório de Avestruzes Signor W. Viglioni, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 100, até o limite de R$ 17.500. O caso teve início quando as rés, na tentativa de cobrar uma dívida, divulgaram mensagem ofensiva em diversas comunidades do site destinadas à criação de avestruzes e ligadas à cidade de domicílio do autor e à região. pedido. Na mensagem, elas diziam: "Caros internautas - não tenho mais como implorar para que o dono da empresa Signor W. Viglioni me pague o que me deve. Fui usada como "laranja" por ele para fazer empréstimos junto ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal para comprar ração e construir uma sala de recepção de ovos para o criatório Signor W. Viglioni, em Candeias, MG. Desde agosto ele não paga uma prestação nos bancos e meu nome está nas listagens do SPC e Serasa como má pagadora, por causa da dívida que fiz para ele. Agradeço desde já se existe, nesta imensa rede, alguém que seja capaz de fazer com que ele pague o que me deve, a fim de que eu possa limpar meu nome e viver em paz novamente". Indignado, o dono da empresa ingressou na Justiça visando à retirada de tais mensagens e a ser indenizado por danos morais. De acordo com ele, as rés prejudicaram seu negócio, levando-o à ruína e denegrindo a boa imagem de seu criatório. O TJ-MG julgou a favor dele. As rés, então, recorreram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Alegaram ilegitimidade ativa do autor, já que os danos teriam sido causados a seu criatório e sustentaram que ele não demonstrou a existência dos prejuízos alegados. Elas afirmaram também que não tinham mais conta no Orkut e que, por esse motivo, não poderiam apagar as mensagens, o que as levaria a descumprir a ordem judicial, e que a multa seria demasiadamente alta, que implicaria enriquecimento ilícito e que lhes causaria prejuízos irreparáveis. A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, não aceitou os argumentos e votou no sentido de não conhecer do recurso especial. A ministra foi incisiva: "Depreende-se, do teor das mensagens e da ampla divulgação, que as mensagens não foram ofensivas tão somente à empresa do autor, mas ao próprio autor, proprietário do criatório, ou na linguagem utilizada nas mensagens, "o dono da empresa Signor W. Viglioni"", disse a Nancy Andrighi, destacando parte do acórdão do tribunal mineiro que diz que, "numa cidade interiorana, com população de não mais de 14 mil habitantes (…), não se pode negar que o empreendimento (…), não sendo uma atividade corriqueira, é conhecido e identificado com a pessoa de seu proprietário". Na avaliação da advogada Alice Andrade, do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados, especializado em Direito Digital e que patrocinou a causa, a decisão do tribunal superior mostra que a manifestação dos consumidores é algo que passou a ser visto pelos tribunais com parcimônia. "Uma coisa é o consumidor fazer a reclamação justificadamente, outra é extrapolar o direito de liberdade de expressão e acabar comprometendo a moral da empresa", disse a advogada, citando outro exemplo em que o consumidor acabou levando a pior. O cidadão havia comprado um celular que, para ele, deveria ter sido vendido com alguns acessórios. Indignado, ele criou um blog contra a empresa. O problema é que a questão não ficou somente na reclamação. Ele ofendeu a pessoa jurídica e os atendentes da loja com palavras de baixo calão. A empresa acionou a Justiça, e o consumidor foi condenado a pagar indenização de R$ 4 mil. "Claro que essa indenização não visa a reparar a empresa, mas apenas punir essa circunstância, que extrapola a razoabilidade. É uma represália. Visa a exercer função educativa", disse Alice Andrade. Para esses casos, de acordo com a advogada, são exaltados os princípios do Código Civil que tratam da responsabilidade civil por ato ilícito e danoso. Assim também como o artigo 187, que fala do excesso do exercício do Direito, aplicável justamente aos casos em que o consumidor extrapola os limites da liberdade de expressão. Primeiro a empresa tem que processar o provedor, para que tire a ofensa do site e forneça os dados de Internet Protocol (IP) dos responsáveis pelas mensagens. Nesse aspecto, a jurisprudência tem sido favorável às empresas. Em outro caso recente, também defendido pelo escritório, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve determinação da primeira instância que condenou o Google a retirar do Orkut as comunidades relacionadas ao nome ou a marca Gates do Brasil Indústria e Comércio Ltda., empresa autora da ação. A decisão obrigou a empresa a fornecer também os dados dos responsáveis pela criação de eventuais modificações do perfil e da comunidade em questão e os registros de IPs, sob pena de multa diária de R$ 10 mil. Passada essa etapa, o momento é de responsabilizar o usuário que fez as ofensas. "Dependendo do conteúdo, os juízes têm reconhecido o direito das empresas. Temos visto ganho de causa para as companhias porque os consumidores estão extrapolando. Não dizemos que eles não têm direito de reclamar. A liberdade de expressão é garantida na Constituição. Só não pode fugir da razoabilidade", afirmou Alice Andrade, destacando que a Internet, cada vez mais, tem ganho prioridade no planejamento estratégico das empresas. "O próprio Orkut, por exemplo, é um meio pelo qual a empresa pode verificar a representação dela no mercado, se há falhas ou defeitos a corrigir. As empresas estão utilizando essas ferramentas para verificar a repercussão que tem. Existem empresas especializadas na área de marketing, inclusive, atuando para isso", afirmou. Para Rony Vainzof, sócio do escritório Opice Blum Advogados Associados, também especializado em Direito Digital, a decisão mostra que a liberdade de expressão tem limites. negociação. De acordo com o advogado, no escritório em que trabalha primeiro tenta-se resolver essas questões na esfera extrajudicial. "Notificamos os provedores, informando a existência dos ilícitos, seja uma violação de marca, direito autoral ou ofensa à imagem. Eles não têm a obrigação de promover censura prévia, mas se, notificados, não retiram o conteúdo passam a responder solidariamente. Normalmente, a grande maioria retira o conteúdo extrajudicialmente", disse o advogado, explicando que somente se o pedido não for atendido recorre à Justiça. "Mas fora isso, a gente tenta notificar o usuário", acrescentou. Dessa medida é cabível até uma ação criminal. Recentemente, a banca conseguiu que a Justiça condenasse uma empresa por concorrência desleal. Ela teria cadastrado o nome de concorrente como palavra-chave nos sites de busca. Assim, quando o usuário fazia uma pesquisa, o link dela aparecia como o primeiro da lista. "Isso aconteceu com uma empresa que trabalhava com toldos. Pedimos para os provedores parassem de fornecer esse serviço de link patrocinado. Identificamos quem estava fazendo isso e entramos com uma ação criminal contra os dirigentes daquela empresa. Essa é uma questão séria. E as decisões têm mostrado que a internet não é um mundo sem lei", afirmou. O advogado Alexandre Multini Mihich, especialista em Direito do Consumidor do Advocacia Celso Botelho de Moraes, explicou que os consumidores tem meios adequados para fazer suas reclamações. "Não dá para resolver ação de consumo denegrindo a empresa. O consumidor pode dizer que comprou na empresa x, e dizer qual o problema. Ele pode dizer o que ocorreu. Isso é lícito. Não pode tentar denegrir a imagem da empresa. Tem que se objetivo e se ater ao problema que ocorreu", afirmou. "Ele não pode passar a ofender a pessoa jurídica porque ela prestou um servido da forma inadequada. O consumidor tem que entrar com uma ação, procurar seus direitos. Não pode denegrir", acrescentou.

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