quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Palestra do Min. Fux no Instituto ETCO sobre "Segurança Jurídica e Desenvolvimento Econômico"

Jornal do Commercio – Direito & Justiça – 23.10.08 – B-9

Um passo de dança
Luiz Fux
Ministro do Superior Tribunal de Justiça
Rudolf jhering; jus-filósofo de todas as gerações legou-nos uma das mais lúcidas e perene Iição: o fim do direito e a paz; o meio de obtê-la é a luta.O ser humano persegue a paz em todos os campos de sua vivência. A paz jurídica é auferida com a "segurança dos direitos" na percuciente visão de Karl Larenz, numa de suas pérolas Iiterárias encontradiças na memorável obra "Metodologia da Ciência do Direito". A Constituição Cidadã de 1988 preconiza como ideário da nação a "segurança jurídica", cláusula pétrea e fundamento do Estado Democrático de Direito. É que ausente a segurança, a paz e a estabilidade social sofrem severo abalo.A segurança, por seu turno, contrapõe-se ao novo, à mudança, fenômeno que no mundo jurídico denota significativa perplexidade. A escola do direito natural, de essência multidisciplinar e humanizada, assistiu a sua derrocada para o positivismo racionalista, exatamente por ter prometido o impossível; vale dizer: o "direito imutável e eterno".O universo humano justifica a ansiedade quanto à mudança, porquanto o novo significa a perda do passado.Essa contradição se exacerba quando se põe em xeque a "segurança jurídica e o desenvolvimento econômico".Os economistas queixam-se da orgia legiferante e das oscilações jurisprudenciais, cuja crítica encontra eco no próprio número de emendas a uma Constituição tão recente sob o prisma histórico-comparativo, mercê da notória variação dos julgados.A realidade é que as mudanças são conseqüências de um novo mundo líquido a que se referia Bauman, no qual as idéias não se fundam mais na verdade sedimentada pelo tempo, mas antes na velocidade com que surgem e se assentam ao sabor da experimentação.O novel instrumental jurídico é farto no saciar essa expectativa. Unindo o ontem e o hoje, a ciência do direito ostenta, no seu receituário de segurança, a imutabilidade dos julgamentos depois de esgotados todos os recursos cabíveis contra determinada decisão, a irretroatividade das leis, a prescrição e a decadência, as novéis técnicas da homogeneização da jurisprudência para casos iguais e a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade das leis, tornando o direito algo previsível a conjurar o receio de Locke acerca do impacto das modificações legais sobre a propriedade e o desmerecimento da autoridade das leis e das instituições.Os operadores do direito, notadamente os aplicadores nos quais deságuam todas as aberrações e misérias humanas, indagam: e a economia? O que tem de seguro para no oferecer?Guardadas as dificuldades de entendimento do "economês", as alterações fáticas e perceptíveis com a crise atual não encontram uma explicação razoável.Eric Hobsbaum denominou o século XX como breve e extremado, posto englobar duas grandes guerras, assistir a queda do muro de Berlim, o malogro do comunismo e o surgimento de uma nova navegação, que dos mares passou à tela dos computadores interligados à internet.O início do novel século XXI parece rescaldo da era passada; o povo assombrado assiste ressurgir a destruição do que Karl Max denominou de "a segurança do egoísmo burguês".O confronto entre economia e segurança jurídica não revela vencedores. Ambos os segmentos são vencidos em parte, até porque, caminham hodiernamente inseparáveis: a justiça econômica e a economia normativa, na percuciente visão de John Rawls.Essa crise vulcânica nos conduz à percepção metafórica de Fergusson: o fogo aparece no cume dos vulcões, mas nasce no centro da terra. A raiz desse tormentoso momento por que passa todo o mundo reside numa crise de confiança. O mundo jurídico pós-positivista; e portanto atual, proclama que é direito fundamental do cidadão a informação, na qual se funda a confiança e dela decorre a segurança.O princípio da "confiança legítima" oriundo do direito público germânico, protege o cidadão contra manobras abruptas do Estado em quaisquer de suas funções soberanas, conferindo-lhes proteção jurídica no desequilíbrio experimentado em seu patrimônio moral ou econômico, observado o interesse público e o princípio da razoabilidade, equilibrando a balança representativa do valor "justiça".É inegável que faltou informação, rompeu-se a confiança legítima no mundo globalizado. De toda sorte, o "mundo caiu"; o soerguimento sob o pálio da segurança é imperioso. Como fazê-lo?A melhor resposta provém da sensibilidade dos homens das letras, com o foi Fernando Sabino:"É preciso ter a certeza de que se está sempre começando; a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar; o que importa é fazer da interrupção um caminho novo, fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sonho uma ponte e da procura um encontro".
* Trecho da palestra proferida no Instituto ETCO sobre "Segurança Jurídica e Desenvolvimento Econômico"

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