segunda-feira, 8 de maio de 2017

Crédito do sócio na falência

O crédito do sócio na falência somente é classificado como subquirografário quando decorrer da qualidade de sócio, e não se quando tiver por fundamento origem diversa. Assim foi decido abaixo, em linha com o artigo que escrevi com Luiz Henrique Beviláqua em 2006 e publicado no Valor. Vejam mais adiante.

FGC tem vitória em ação do Cruzeiro do Sul

Notícias de agências, jornais e revistas / Empresarial / Jornal Valor Econômico

Jornal Valor Econômico

Por Vinícius Pinheiro
04/05/2017 - 05:00

O Fundo Garantidor de Créditos (FGC) obteve duas importantes vitórias na Justiça, ambas relativas ao processo de falência do banco Cruzeiro do Sul. O fundo conseguiu mudar a situação dos créditos que detém contra a massa falida e assegurou o direito de se manter no rol de credores da instituição.

O Cruzeiro do Sul possui um rombo da ordem de R$ 8 bilhões, incluindo R$ 3 bilhões em passivos potenciais. O FGC é um dos maiores credores da instituição, com R$ 1,8 bilhão a receber. O fundo ainda possui outros R$ 600 milhões em fundos de créditos do banco, que estão fora da massa falida.

O juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho determinou que os créditos do fundo contra a massa falida sejam reclassificados da condição de subordinados para quirografários, o que melhora as chances do FGC de receber parte dos recursos que colocou no banco. O Cruzeiro do Sul conta com pouco mais de R$ 3 bilhões. A distribuição aos credores costuma ocorrer pelo sistema de rateio, de acordo com a prioridade de cada crédito.

Os administradores da massa falida do Cruzeiro do Sul haviam incluído o FGC como credor subordinado no processo de falência, que o colocava como o último da fila a receber os valores devidos. A justificativa foi a atuação do fundo como administrador do banco durante o regime de administração especial temporária (Raet).

A lei de falências prevê que os créditos detidos pelos administradores das empresas sejam considerados subordinados, com o objetivo de evitar fraudes. No caso do Cruzeiro do Sul, porém, o juiz decidiu que o fundo não se beneficiou da função de administrador durante o Raet para obter uma melhor posição para recebimento do crédito.

A Justiça também negou o pedido dos ex-controladores do Cruzeiro do Sul de excluir o fundo garantidor do rol de credores do banco, sob o argumento de que o fundo atua de forma semelhante a um seguro.

Na decisão, o juiz avaliou que o fundo garantidor não exerce atividade lucrativa, como uma seguradora. "Em função do pagamento efetuado aos depositantes e investidores da instituição financeira associada, e não exercendo atividade securitária, o FGC tem o direito de se reembolsar do que pagou", escreve o juiz, na decisão.

O fundo já havia obtido uma decisão favorável do tipo no caso do Banco Morada, mas a nova decisão reforça esse entendimento, segundo Caetano Vasconcellos, ex-diretor jurídico e agora conselheiro do FGC.

Na condição de credor quirografário, o FGC fica na mesma situação dos demais credores que possuem créditos sem garantia contra a instituição. "Além da questão financeira, a decisão tem um caráter pedagógico para o mercado", diz Vasconcellos.


Procurados, os administradores da massa falida do Cruzeiro não comentaram o assunto.

O crédito do sócio na nova Lei de Falências
Por Luiz Henrique Beviláqua e Ronald Sharp Jr.
Valor Econômico - 05/09/2005 – p. E2

A Lei nº 11.101/05 - a nova Lei de Falências -, entre outras inovações, alterou a ordem de classificação dos créditos na falência. Nesse sentido, o crédito amparado por garantia real ocupava, na pretérita legislação falimentar, a terceira posição no concurso dos credores da falida, localizando-se abaixo dos créditos da Fazenda Pública. A seu turno, na nova Lei de Falências essa espécie de crédito passa a ocupar o segundo lugar no quadro de credores concursais e o quarto na ordem de classificação de beneficiários de pagamento na falência. Assim, o crédito com garantia real atualmente situa-se acima dos créditos tributários, revelando a importância que a legislação atribui à facilidade de acesso e recuperação do crédito. 


Sucede que alguns doutrinadores advogam equivocadamente que qualquer crédito titularizado pelo sócio, inclusive o amparado em garantia real, enquadrar-se-ia na classe de crédito concursal subordinado (artigo 83, inciso VIII). Dado que os créditos do falido são precedidos pelas restituições e pelos créditos extraconcursais (artigo 149), por esse entendimento qualquer crédito do sócio, em especial o constituído com garantia real, ocuparia a décima posição na ordem geral de pagamentos. 


O argumento é o de que, em diversas ocasiões, sócios - principalmente controladores - emprestam, de forma simulada, recursos à sociedade da qual participam, no lugar de realizarem aumento do capital social. Cientes da precária situação financeira da sociedade estariam buscando proteger seus recursos mediante a celebração de empréstimos, freqüentemente com garantias reais.

Diversas são as razões para ilidir e elidir tal entendimento: a começar pela natureza objetiva da ordem de classificação dos créditos, perpassando pelo princípio da não-presunção da fraude e ultimando na viabilidade do mecanismo da cessão do crédito para terceiro.

A classificação do crédito na falência obedece unicamente a um critério objetivo, em consonância com a natureza do crédito, não podendo a qualidade subjetiva de sócio implicar no rebaixamento do seu crédito, notadamente com garantia real, na falência da sociedade. Não se pode admitir o absurdo de o crédito com garantia real ocupar objetivamente a segunda posição nos créditos concursais, mas o mesmo crédito, quando titularizado pelo sócio, passe a estar - agora por um critério subjetivo (qualidade de sócio) - incluído entre os subordinados.

A correta hermenêutica do inciso VIII do artigo 83 da nova Lei de Falências deve ser aquela que contempla o crédito especificamente decorrente do direito de sócio enquanto tal. Isto é o que ocorre em relação a dividendos declarados e não pagos, juros sobre capital próprio não recebidos, na forma da Lei n° 9.249/96, e resgate/amortização de ações não pagos, nos termos da Lei das S.A.


Não se pode admitir que o crédito com garantia real ocupe a segunda posição mas, quando titularizado, passe a ser subordinado




Igualmente, o princípio de que a fraude não se presume advém do princípio da boa-fé nas obrigações. Mostra-se imperioso provar a existência de simulação por parte do sócio, visando à fraude ao emprestar seus recursos à sociedade e protegê-los com garantia real, o que na realidade é combatido pela revogação do ato (artigo 130). Segue-se que deve ser demonstrado intuito do sócio de melhor posicionar seu crédito na potencial falência da sociedade.

Ademais, o parágrafo 4º do artigo 83 da legislação, ao dispor que apenas os créditos trabalhistas cedidos a terceiro tornar-se-ão quirografários, propicia ao sócio ceder seu crédito com garantia real para terceiro sem participação societária na empresa falida, de maneira que esse crédito seria inserido na classe própria e priorizada dos créditos com garantia real.

Em prevalecendo a tese do menoscabo do crédito do sócio amparado por garantia real à condição de subordinado na falência da sociedade da qual participe, a própria nova Lei de Falências teria criado uma alternativa para contorná-la, qual seja: a cessão do crédito para terceiro não-sócio, ao passo que tal prática somente é legalmente desestimulada na cessão de créditos trabalhistas. Repare-se ainda que, por ausência de previsão legal, e considerado o critério objetivo, o crédito do sócio decorrente dessa qualidade cedido a terceiro terá de subsistir com idêntica classificação.

Finalmente, destaque-se que investidores institucionais de longo prazo, tais como os fundos de pensão e a BNDESPar - subsidiária integral do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) - compartilham, em alguns casos, do esforço para reestruturar sociedade da qual detêm participação relevante, sobretudo mediante a subscrição de debêntures com garantia real. Assim, a prevalência do entendimento ora refutado desestimularia ou mesmo eliminaria essa forma de acesso a crédito.

O raciocínio ora contrastado inibe a aquisição por sócio, ainda que minoritário, de debêntures da espécie com garantia real, nos mercados primário ou secundário, especialmente quando a situação financeira da sociedade emissora for precária, violando o pilar da nova Lei de Falências: a preservação da empresa.

Luiz Henrique Bevilaqua e Ronald A. Sharp Junior são, respectivamente, advogado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e professor de direito do Ibmec

Nenhum comentário:


Registre as histórias, fatos relevantes, curiosidade sobre Paulo Amaral: rasj@rio.com.br. Aproveite para conhecê-lo melhor em http://www2.uol.com.br/bestcars/colunas3/b277b.htm

Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar