quarta-feira, 24 de julho de 2013

Ética organizacional

Valor Econômico – Legislação & Tributos (Rio) - 24/07/2013 – E2


Ética, organização e trabalho

Por Vinicius da Silva Cerqueira

Recente pesquisa realizada pela consultoria ICTS demonstra um cenário alarmante sobre ética no ambiente de trabalho. Os dados compilados permitem visualizar um problema que ameaça a integridade das empresas e deixam clara a importância de um programa de compliance. A pesquisa entrevistou 3.211 profissionais de 45 empresas, metade ocupantes de cargos de gestão. A outra metade, de técnicos operacionais. Questionados se cumprem as normas éticas da empresa, 11% declararam não cumprir e 69% responderam com um eloquente "depende".

Dos entrevistados, 38% aceitariam receber dinheiro e 40% aceitariam presentes para favorecer um fornecedor. Metade dos profissionais adotaria "atalhos antiéticos" para cumprir metas. Um terço dos gestores usaria dados e informações sigilosos em proveito próprio. No extremo, "apenas" 18% admitiriam furtar quantias consideráveis em caso de necessidade. Omissivamente, 52% não denunciariam condutas eticamente inadequadas de outrem.

Esses números servem de alerta. A ética nas organizações é um tema que adquire centralidade nas últimas décadas. Uma cultura corporativa calcada em valores éticos, preocupada com os impactos das decisões das empresas para além do lucro imediato, é essencial para o sucesso da instituição.

A ética é fim e meio para proteger os trabalhadores em sua individualidade e preservar a empresa em sua integridade

Ética organizacional é o conjunto de valores, princípios e fins que pautam as ações da empresa e balizam sua cultura organizacional. Sintetiza a identidade empresarial e, de certa forma, limita a atuação dos tomadores de decisão e demais trabalhadores, que devem estar em sintonia com os códigos de conduta e ética e demais regimentos internos.

A matéria acima referida transparece algumas decorrências nefastas que a ausência de ética pode acarretar. Os cerca de 40% dos profissionais que receberiam vantagens (dinheiro ou presentes) de fornecedores podem fazer com que a empresa mantenha contratos desvantajosos, desperdiçando dinheiro. A metade que buscaria atingir suas metas com procedimentos antiéticos pode manipular os resultados e levar os gestores a tomar decisões equivocadas. O terço dos gestores que usariam dados confidenciais em seu proveito pode liquidar a empresa perante a concorrência. Os 18% que admitiram até furtar quantias consideráveis dispensam maiores comentários.

Mas até a omissão pode ser um mal grave. O silêncio dos bons, representado por 52% dos entrevistados que não denunciariam desvios de seus colegas, pode significar a perpetuação de condutas antiéticas e o agravamento dos prejuízos para a organização. A denúncia contra ilícitos e malfeitos pode e deve ser utilizada. Tome-se o exemplo do Dodd-Frank Act, a lei americana promulgada em resposta à crise financeira de 2008. Esta estabelece que o whistleblower, a pessoa que denuncia fraudes no sistema financeiro, pode receber um prêmio entre 10% a 30% do valor da multa aplicada à instituição fraudulenta. Porém, há outras decorrências de um ambiente de trabalho sem ética que não aparecem na pesquisa. Dentre outras, o assédio moral se destaca.

Assédio moral é um conjunto de agressões reiteradas que atacam a subjetividade da vítima, por meio da humilhação, do constrangimento. Agressões que atentam contra a honra, a moral, a personalidade, a intimidade, a privacidade da vítima, e desestabilizam o ambiente de trabalho. Inegavelmente, o assediador é uma pessoa sem ética, que ataca motivado por poder, vaidade, sadismo, insegurança. Suas ações destoam, por completo, daquilo que se tem por ético: injúrias, difamações, rudeza, preconceitos por raça, gênero ou origem social.

Um programa de compliance é causa e consequência de um ambiente de trabalho ético. Causa porque oferece métodos e instrumentos para o estabelecimento e aderência da ética na organização; consequência porque a ética é o que sustenta o compliance, que só funciona plenamente em um ambiente fortemente enraizado em valores éticos. Um bom código de conduta e ética é só o início. Declaração expressa e enfática de reprovação de condutas inadequadas e conflitos indesejados, treinamento contínuo sobre os valores da empresa, canais de denúncia diretos ou por meios do sindicato, com preservação da identidade do denunciante, instâncias aptas a apurar com acesso às informações necessárias, dentre outras ações, são os meios necessários a se buscar um equilíbrio no ambiente de trabalho.

A ética é fim e meio para proteger os trabalhadores em sua individualidade e preservar a empresa em sua integridade. A busca incessante pelo equilíbrio organizacional por meio de sólidos valores éticos será, mais e mais, o mote da economia, mormente após a crise de 2008. Esta será a régua que determinará quais empresas atingirão o sucesso e quais perecerão.

Vinicius da Silva Cerqueira é mestre em direito do trabalho pela USP é advogado da área trabalhista e de compliance do escritório Peixoto e Cury

Nenhum comentário:


Registre as histórias, fatos relevantes, curiosidade sobre Paulo Amaral: rasj@rio.com.br. Aproveite para conhecê-lo melhor em http://www2.uol.com.br/bestcars/colunas3/b277b.htm

Eis o veículo (Motorella) que tenho utilizado para andar na ciclovia da Lagoa e ir ao trabalho sem suar