sexta-feira, 22 de maio de 2009

Projeto de penhora administrativo

A penhora administrativa e suas consequências no processo de execução fiscal


José Olympio Corrêa Meyer
Advogado do setor Contencioso do Siqueira Castro - Advogados no Rio de Janeiro; especialista em Contencioso Tributário e Cível e em Direito Processual Tributário

Em uma tentativa de desonerar a Justiça e reduzir o custo com cobranças da dívida ativa, o governo resolveu encaminhar quatro projetos de lei no início do mês de abril ao Congresso. Uma dessas leis, caso seja aprovada e sancionada conforme o projeto original, faz com que algumas etapas do processo de execução fiscal, como a penhora de bens, hoje disciplinadas pela Lei de Execução Fiscal (LEF), passem para a esfera administrativa.

Pelo que se pode entender do projeto, quando alguma empresa for autuada pelo Fisco, poderá ser privada de seus bens sem qualquer oportunidade de defesa em um processo judicial. E mesmo antes de qualquer discussão a respeito da justiça da lavratura do auto de infração.

Em poucas linhas: se uma grande empresa for autuada de maneira indevida pela Fazenda por suposto não recolhimento correto de um tributo federal como o IPI, por exemplo, pode ser privada de seus bens sem nenhuma decisão do Poder Judiciário.

À primeira vista, parece que o projeto de lei trará celeridade aos processos de execução fiscal e maior eficiência administrativa na cobrança de tributos.

Mas não é o que parece. O projeto de lei rasga o dispositivo constitucional que prevê que ninguém poderá ser privado de seus bens sem o devido processo legal. E não é só: tal disposição é um direito fundamental, garantido a todos.

E essa não é, com certeza, a única iniciativa que tem como objetivo privilegiar a Fazenda Pública em relação ao contribuinte, principalmente quando se trata de questões levadas ao Poder Judiciário em sede contenciosa.

A relação Fisco-contribuinte, que deveria se pautar unicamente na paridade quanto ao seu aspecto jurídico, ganha contornos de desigualdade e autoritarismo no processo. Vários são os exemplos que demonstram isso: prazos diferenciados, intimação pessoal para praticar atos no processo, entre outros, são privilégios processuais pertencentes à Fazenda que deveriam cair por terra.

Como já predizia Friedrich Engels, em seu clássico livro "A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado", o Estado não é, pois, de modo algum, um poder que se impôs à sociedade de fora para dentro; tampouco é a "realização da ideia moral" nem a "imagem e a realidade da razão", como afirma Hegel.

É antes um produto da sociedade, quando ela chega a um certo grau de desenvolvimento; é a confissão de que essa sociedade se enredou numa irremediável contradição com ela própria e está dividida por antagonismos irreconciliáveis, que não consegue conjurar.

Assim, um dos principais traços desse Estado que vemos é a instituição de uma força pública. A necessidade dessa força pública especial deriva da divisão da sociedade em classes, que impossibilita qualquer organização armada espontânea da população.

E para sustentar essa força pública, são exigidas contribuições por parte dos cidadãos do Estado: os tributos. A sociedade gentílica, antes do Império Romano, não teve ideia deles, mas nós os conhecemos muito bem.

Assim, o projeto de lei que tenta desobstruir o Judiciário de cerca de 3 milhões de processos de execução pode virar mais uma arma de sujeição do contribuinte aos caprichos da Fazenda Pública no processo.

A relação de sujeição fiscal do particular diante do Estado, antes de tudo, deve ser uma relação jurídica, guiada e norteada pelos princípios constitucionais inerentes a ela.

Apesar disso, muitos ainda entendem a relação de sujeição fiscal como na Idade Antiga, em que o poder de tributar era uma imposição do vencedor sobre o vencido. Uma relação de escravidão, cuja origem espúria, infelizmente, ainda se mostra presente de vez em quando.

Dessa maneira, se projetos de lei com a intenção de excutir bens do contribuinte pelas vias administrativas forem aprovados pelo Congresso, em breve não haverá mais jurisdição e nenhuma garantia de defesa aos contribuintes para a cobrança de tributos pelo Estado.

Caberá aos empresários e às suas empresas, tão somente, a sujeição passiva ao apetite arrecadador estatal, sem qualquer espécie de contraditório e de um devido processo legal.

Obviamente, ainda resta um longo caminho a ser percorrido até que realmente tal lei possa ser sancionada. E o que mais se aguarda é o pronunciamento das Comissões de Constituição e Justiça das duas Casas do Congresso a respeito da constitucionalidade de tal projeto de lei.

Fonte: Jornal do Commercio - Direito & Justiça - B-6

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