terça-feira, 22 de abril de 2008

Valor Econômico - Empresas - 22.04.08 - B4
Cresce produção de vinhos no Vale do São Francisco
Carolina Mandl

Ao ouvir dizer que em pleno sertão de Pernambuco se fazia vinho, o agrônomo português João Santos duvidou. "Se isto for verdade, eu vou para lá", desafiou. E foi. Em 2003, saiu da Dão Sul, produtora portuguesa de vinhos, para morar em Lagoa Grande (PE). Hoje ele comanda uma fazenda de 200 hectares, de onde saem 1,2 milhão de litros da bebida por ano.
Não foi apenas Santos que torceu - ou ainda torce - o nariz para a vinicultura no Vale do São Francisco. Mas, depois de quase 15 anos da primeira experiência, a controversa produção sertaneja de vinhos está em franca expansão.
Até 2010, a ViniBrasil, vinícola dirigida por Santos, aumentará a fabricação para 3 milhões de litros. Neste momento, a Dão Sul e a Expand, sócias do empreendimento, dão os primeiros passos para ampliar de 200 hectares para 400 hectares a área de plantação. Só neste ano, serão investidos R$ 4 milhões.


Até 2010, a ViniBrasil, vinícola dirigida por Santos, aumentará a fabricação para 3 milhões de litros. Neste momento, a Dão Sul e a Expand, sócias do empreendimento, dão os primeiros passos para ampliar de 200 hectares para 400 hectares a área de plantação. Só neste ano, serão investidos R$ 4 milhões.
Cruzando a fronteira rumo à Bahia, a Fazenda Ouro Verde, das vinícolas gaúchas Miolo e Lovara, investirá cerca de R$ 10 milhões até 2012 na cidade de Casa Nova. Com isso, passará dos atuais 100 hectares para 400 hectares de videiras. Também atingirá 5 milhões de litros de vinhos por ano, volume superior àquele produzido hoje pela maior unidade da Miolo, a de Bento Gançalves (RS), que faz 4 milhões de litros.
Seja em reconhecimento, seja em volume produzido, o Nordeste ainda está longe de se comparar à região Sul. Enquanto saíram do Rio Grande do Sul 43 milhões de vinhos em 2007, o Vale do São Francisco produziu aproximadamente 8 milhões de litros.
Porém, a expansão da produção de vinhos na Bahia e em Pernambuco dá pistas da evolução que a bebida sofreu desde a primeira experiência, em 1984. Principalmente em tempos em que as áreas plantadas no Sul não sofrem significativa expansão, segundo a União Brasileira de Vitivinicultura.
Ao sair das tradicionais zonas produtoras, que ficam na latitude entre 30° e 45°, a grande aposta que os produtores fizeram foi no fato de o paralelo 8° permitir a produção de uvas o ano todo, elevando a produtividade e sempre proporcionando produtos frescos. De um lado pode-se ter uma videira sem frutos, enquanto de outro as uvas já estão prontas para a colheita. Com a escassez da chuva - inimiga das uvas - e a maior incidência do sol, o controle da plantação fica por conta da irrigação, com água do rio São Francisco.
Ao ampliar sua atuação para o Nordeste, a Miolo também foi em busca de algo a mais: produzir uvas diferentes das plantadas no Sul. "Hoje temos syrah e moscatel, que não tínhamos", explica Adriano Miolo, diretor da vinícola. Também foi atrás de um outro mercado em termos de bolso. Um espumante feito na região Sul é vendido a R$ 25, enquanto um baiano sai por R$ 15. "Passamos a atender segmentos que não atendíamos."
Apesar de não serem vinhos populares, aqueles de garrafão feitos com uvas de mesa, os produtos do Vale do São Francisco são, em geral, mais baratos do que os de Bento Gonçalves. O produto mais caro da região é o vinho Paralelo 8, da Rio Sol, que custa R$ 69.
O projeto da Fazenda Ouro Verde atraiu em 2006 uma parceria internacional: a espanhola Osborne, interessada em fazer vinhos para produzir seu brandy. Agora, a empresa já avalia a possibilidade de se tornar sócia do empreendimento como um todo, não apenas para a produção de conhaque de vinho.
Mas fugir das regiões preconizadas pelos manuais de viticultura traz o desafio de descobrir qual é a melhor uva para a nova latitude. "O Vale do São Francisco é uma aposta no futuro. Hoje os vinhos do Sul têm mais qualidade. Mas fazer um bom vinho leva tempo", diz Arthur de Azevedo, consultor e presidente da Associação Brasileira de Sommeliers de São Paulo.
Os sócios da ViniBrasil não têm a menor dúvida que muito há por se descobrir. "Não sabemos no que vai dar. Mas um bom vinho precisa de boas uvas e de tecnologia. E isso nós temos lá", explica Otávio Piva de Albuquerque, um dos donos da Expand.
Em parceria com a Universidade de Lisboa, a vinícola construiu um verdadeiro laboratório a céu aberto em Lagoa Grande. Num enorme parreiral, estão sendo testados diversos tipos de uva, vindos dos mais variados cantos do planeta. Há, por exemplo, syrah americana, francesa e australiana.
Mas já se sabe que duas variedades de uva estão se adaptando melhor no Nordeste do que no resto do país: a syrah e a moscatel, bastante usada nos espumante. "A moscatel do Vale do São Francisco tem uma qualidade é estupenda", avalia Azevedo.
Outra informação que ainda se precisa obter é sobre o tempo que as garrafas da região podem ser guardadas. Experiências preliminares feitas pela Embrapa Uva e Vinho do semi-árido mostraram, por exemplo, que o vinho tinto passa da cor vermelho rubi para a tijolo em apenas um ano. "Isso não é normal. Talvez descobriremos que os vinhos precisam ter data de validade", diz Giuliano Pereira, pesquisador da Embrapa.
Mas, mesmo em meio a tantas descobertas, os vinhos do São Francisco já começam a colher reconhecimento. A revista Wine Spectator incluiu o Rio Sol Paralelo 8, que custa R$ 69, na sua lista dos 100 melhores do ano, com 83 pontos. A crítica de vinhos Jancis Robinson, colunista do "Financial Times", considera o Vale do São Francisco, "uma das mais interessantes regiões a serem desenvolvidas neste século". E recomenda que
se prove o vinho de lá.

Canadenses perceberam potencial da região
Foram os canadenses que deram o empurrão inicial à produção de vinhos no Vale do São Francisco, em 1984. Então dona da marca de vinhos Forestier, a Seagram, uma empresa de bebidas do Canadá que não existe mais, suspeitou que os ensolarados dias do semi-árido poderiam produzir uma bebida parecida com aquela feita na Califórnia. Como o São Francisco já vendia uvas de qualidade naquela época, a Seagram avaliou que esse já era um bom começo para se fazer vinhos. Só era preciso plantar frutas próprias para a produção da bebida. Como não queria investir no negócio, a canadense fechou uma parceria com um produtor de uva da região, José Gualberto de Almeida. Ele criou a vinícola Botticelli, que produzia os vinhos Forestier, mas também podia criar suas próprias marcas. Só oito anos depois dessa experiência pioneira é que um segundo produtor de vinhos apareceu no Vale do São Francisco. Hoje, são oito vinícolas na região.

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